sexta-feira, 30 de novembro de 2012

CENTENÁRIO DA INTRODUÇÃO DA LUZ ELÉCTRICA EM TORRES VEDRAS



“Luz, Luz!
“Assim bradava um pobre homem que pelas 11 horas da noite de segunda-feira estava na vila pela rua da Corredora. E tinha razão, porque tropeçando num pedregulho que estava quase a meio da rua, foi bater de encontro a uma carroça, ferindo-se na cara e no braço esquerdo. Como muitos outros, aquele caminho é mal iluminado; mas na referida noite e hora achava—se às escuras, o que é um perigo, sobretudo  estacionando aí veículos ()"(1)

Estava-se em 1887, quando um jornal de Torres Vedras publicou esta notícia, que hoje nos parece caricata.

Contudo, ela revela uma preocupação constante dos homens do século XIX: o aperfeiçoamento do precário esboço de Iluminação Pública então ensaiado um pouco por todo o país.

A primeira notícia de Iluminação Pública em Portugal data de Julho de 1780, quando Pina Manique resolveu introduzi-la em Lisboa, usando-se o azeite como combustível.

Desde 1862 que existia iluminação pública em Torres Vedras, com 35 candeeiros a petróleo espalhados pelas ruas da vila, mas apresentando várias deficiências no seu funcionamento.

Por outro lado, nem todas as noites esse candeeiros eram acesos, pois, razões de poupança, levaram a que, no caso de o calendário prever noite de lua cheia, eles não serem ligados, mesmo que na noite prevista as nuvens cobrissem a Lua.

A ILUMINAÇÃO A GÁS

Mas é no Verão de 1887 que se anuncia um novo progresso na iluminação pública da vila, como se lê nas seguintes notícias:

“0 Sr. Joaquim Pedro Marques, que é realmente empreendedor, entusiasta por todas as inovações que denotam progresso, e o sr. Joaquim José Rodrigues, fizeram no sábado" [16 de Julho de 1887]"a experiência de uma luz muito  superior à do petróleo, colocando na esquina das ruas dos Balcões e do Rosário, um candeeiro gazogeneo, cujo combustível é a nafta refinada" (2)

"Com um resultado deveras satisfatório foi feita a experiência de novo sistema de iluminação, que a Câmara municipal pensa (...) adquirir para as ruas dá vila.

"Os candeeiros gasogénio são muito elegantes, e a sua luz pode reputar-se tão clara como a do gaz carbónico.

"Levado a efeito este melhoramento, cabe à vila de Torres Vedras, a glória de ser a primeira terra do reino que iniciou um sistema de iluminação tão aperfeiçoada" (3).

Não pudemos confirmar se esta primazia atribuída a Torres Vedras, quanto ao tipo de iluminação adoptada,  é verdadeira, mas vemos afirmações idênticos serem repetidas noutras notícias.

Joel Serrão (4) afirma que a luz a gaz foi ensaiada em Lisboa a 30 de Junho de 1848, mas aquela era produzida a partir do carvão de pedra, enquanto o sistema inaugurado em Torres Vedras tinha por combustível a nafta refinada.

Seja como for, esse novo sistema foi inaugurado em Torres Vedras no Sábado 28 de Janeiro de 1888:

"Mais um progresso a registar nos feitos dos melhoramentos locais, e de mais a mais realizado num dia assinalado, no sábado em que houve eclipse, coisa de que os nossos avós tinham muito medo. Pois foi exactamente na ocasião em que a lua se via mais "aflita" que se inaugurou a iluminação a gazolina, por sinal que custou muito a acender os elegantes candeeiros, como ainda hoje custa, e se não fôr adaptado outro meio mais breve, como é de esperar que seja, o último candeeiro será aceso quando forem horas de apagar o primeiro.

“O certo é que a luz é bela e, segundo nos dizem, mais económica (...)" (5).

"Os candeeiros são muito lindos, podendo colocar-se não só em postuletas, nas paredes, como agora se usa na vila, mas também em postes, o que é um belo aformosamento  para as praças e largos.  
            
"As ruas recentemente calçadas como estão e bem iluminados como virão a ser, darão um tom alegre à vila, tornando-a transitável de noite" (3).

De salientar que uma das primeiras artérias da vila totalmente iluminada por este novo processo foi a Avenida Casal Ribeiro, actual Av. 5 de Outubro, que havia sido recentemente inaugurada, tendo sido nela colocados, assim como no largo da estação, um total de 14 candeeiros com colunas de ferro.

A Ribaldeira e Dois Portos foram os dois primeiros lugares do concelho a seguir o exemplo da vila, substituindo parcialmente a iluminação a petróleo pela iluminação a gaz, graças à iniciativa de alguns moradores, isto em Fevereiro de 1888:

Contudo este sistema revelou- se muito dispendioso para a Câmara e terão surgido problemas técnicos que levaram a que se tivesse voltado à iluminação a petróleo em meados de 1891, e até 1912.

 (candeeiro a Petróleo na actual Avenida 5 de Outubro)

                           (Acendendo um candeeiro a petróleo no Largo do Município)


A REVOLUÇÃO DA ELECTRICIDADE

"A lisa verdade, porém, manda que se diga que da fogueira e do archote à luz do gás não houve qualquer revolução essencial no processo de que se lançava mão para obter luz; tratava-se sempre da mesma combustãozinha, cujo descobrimento tem as raízes bem mergulhadas na Pré-História. Vão surgindo novos combustíveis, novos queimadores, maior profusão de candeeiros mais ou menos complicados — e nada mais. Não seria do lado da combustão, mas no da incandescência, que a revolução da iluminação doméstica e pública haveria, um dia, de soprar" (Joel Serrão) — (4).

É em 1876 que o físico russo Jablochkoff inventa a "vela eléctrica" e em 1878 Swan inventa a primeira lâmpada incandescente que iria revolucionar a iluminação, embora o tipo de lâmpada que se usou até há pouco tempo, com filamento de tungsténio, tenha sido inventado em 1913 por Langmuir.

Em Portugal a primeira experiência de iluminação eléctrica teve lugar em Cascais a 28 de Setembro de 1878, usando-se "velas eléctricas” de Jablochkoff, para,  em 31 de Outubro, esses candeeiros, usados em Cascais, serem acesos em Lisboa.

Mas a primeira distribuição pública de electricidade ocorreu em 1889 quando a companhia de gás de Lisboa conseguiu garantir a iluminação da Avenida da Liberdade.

Nesse mesmo ano, a 26 de Outubro, era divulgado em Torres Vedras o uso da luz eléctrica em Lisboa, num artigo publicado na "Voz de Torres Vedras":

“No dia 1 do próximo mez começa a ser iluminada a luz electrica a estação do caminho-de-ferro de Santa Apolónia e suas dependências até Madre de Deus.

"As outras estações, essas continuarão quase às escuras" (6).

OPINIÃO PÚBLICA BATE-SE PELA LUZ ELÉCTRICA

É  em 1895 que surge a primeira proposta para o uso da eletricidade na Iluminação Pública de Torres Vedras.

De facto, na sessão municipal de 5 de Abril de 1895 "foi presente à Camara uma proposta assinada pelo Sr. Eduardo Raposo, de Lisboa, oferecendo-se para tomar a seu cargo a iluminação da vila a luz electrica. O sr. presidente depois de ler a proposta, que é bastante desenvolvida, e de a acompanhar com judiciosas considerações, propôs que se nomeasse uma comissão para estudar o assunto e dar o seu parecer. Assim se resolveu ficando a comissão composta dos srs. vereadores Francisco Avelino,  Xavier Paes e António Fivelim”(7).

Contudo, tal iniciativa não passou das boas intenções e a deficiência da iluminação pública torriense continuou a ser encarada, ainda por muito tempo, quase como uma fatalidade.

É assim que entramos no século XX lendo os protestos frequentes da imprensa local contra as condições da iluminação pública, à misturas com sugestões para resolver esse problema, como se podia ler na seguinte passagem de um desses artigos:

"É agora que em várias terras do país, quer pela sua importância, quer pela sua índole progressiva, se está modificando o seu systema de iluminação, substituindo o petróleo por gaz ou electricidade, agora que o comércio da nossa terra se está emancipando da antiga luz, vendo-se já montados em vários 'Estabelecimentos desta vila custosas instalações de gaz acetyleno, é agora, dizíamos, o momento oportuno de tratarmos a sério da iluminação pública" (8).

Opiniões como esta tiveram, no mínimo, a virtude de agitar os meios políticos de então, tendo levado a que surgisse, ainda nesse ano, uma proposta subscrita por Júlio Vieira e José Fernandez Alvarez para o fornecimento da luz eléctrica ao concelho, tendo a Câmara de Torres Vedras aberto um concurso público para a concessão do fornecimento de luz eléctrica, isto em Julho de 1902.

Mas, mais uma vez, e ao que consta por falta de concorrentes, é adiada a realização desse melhoramento.

E entretanto continuam a chover, cada vez com mais frequência, protestos públicos nas páginas da imprensa de Torres Vedras, como este que, pela sua ironia, não resistimos a transcrever:

"Há certos melhoramentos, bens materiais e necessidades da vida que só se obteem ou satisfazem muito de longe em longe, o que tanto vale dizer que é só quando o rei fez anos.

"Ora acontece que, sendo uso cá da terra, "para poupar o petróleo", não se acenderem os candeeiros nas noites em que a folhinha marca luar, embora a lua se não veja, chova, ou faça trovões, os candeeiros de iluminação publica foram acesos na noite da aclamação do rei [D. Manuel II], noite por sinal de um poético luar como dizia alguém, com certa graça. Tanto equivale dizer que nós só teremos boa iluminação na vila quando o rei é aclamado, isto é, uma vez na vida, e não quando o rei faz anos o que seria, cremos, uma vez em cada ano.

"Ora em tal caso, nós somos apologistas de que sua magestade seja aclamada, pelo menos uma vez em cada noite de trovões que a folhinha anuncie luar, para assim adquirirmos a certeza de que poderemos caminhar pelas ruas da vila, sem lanterna na mão, por falta de iluminação pública que é motivada — repetimos — "para poupar petróleo". (9).

Apesar de ainda nesse ano de 1908 a Câmara voltar a abrir novo concurso público para fornecimento de luz eléctrica, concurso novamente falhado, foi preciso, ao contrário do que ironicamente diz o texto, que se deixasse de uma vez por todas de aclamar os reis, para finalmente se conseguir inaugurar a luz eléctrica em Torres Vedras.

A SOCIEDADE PROGRESSO INDUSTRIAL

A 24 de Dezembro de 1911 o Jornal 'Folha de Torres” anunciava finalmente que tinham sido "aprovados superiormente as bases estabelecidas pela Câmara Municipal deste concelho para o concurso de iluminação de luz eléctrica da vila, com a restrição do prazo ser reduzido a 20 anos, e o mesmo contracto só poder incidir sobre a iluminação publica e particular da vila e portanto como a exclusão da força motriz, tracção ou aquecimento" (10). 

Esse concurso seria ganho por uma companhia de Torres Vedras, a Sociedade Progresso Industrial que se havia constituído por escritura de 1 de Abril de 1911, e tinha como associados João Ferreira Júnior, José Augusto Lopes, António Augusto Cabral, nomeado gerente da sociedade, e João Ferreira Guimarães Júnior, a quem mais tarde se viriam a juntar João Maria Castanho, João Ferreira Pinto, José Joaquim Miranda, Filipe Vilhena e Luiz Francia, este último proprietário da primeira sala de cinema de Torres Vedras, inaugurada em Maio de 1911.
No seu início, a Sociedade Progresso Industrial havia surgido tendo por objectivo a exploração mecânica da debulha do trigo e enfardamento de palha, com um capital de 5 contos.

Mais tarde os seus estatutos foram alterados, não só para aumentar o número dos seus sócios, como já referimos, mas para alargar os seus objectivos à exploração da luz eléctrica em Torres Vedras, aumentando então o seu capital para 24 contos, verba que, segundo uma notícia publicada a 31 de Dezembro de 1911, era "o suficiente para a instalação e montagem de máquinas e rêde, e ainda para desenvolver a exploração da industria agrícola, que já exploraram na época passada"(11).

(a casa que se vê ao fundo, nesta fotografia de 1912, tirada durante o carnaval,, era a sede da Sociedade Progresso Industrial, no local onde hoje fica o Hotel Império).


0 contrato para a concessão da exploração da iluminação eléctrica foi assinado entre a Câmara e a Sociedade Progresso Industrial em 30 de Dezembro de 1911, concessão que seria aprovada superiormente por publicação em "Diário da República” de 20 de Janeiro de 1912.

Iniciaram-se então os trabalhos para a montagem de instalações e sede da Sociedade:

"A construção do edifício, para a estação central produtora da energia eléctrica, que será feita no Bairro das Covas, vai principiar em breve; as máquinas geradoras, dois esplêndidos motores Diesel, são fornecidas pela Casa HAROLD & Cª, e todo o material electrico pela importante casa alemã Siemens"(11)

FINALMENTE...

Finalmente a 19 de Setembro de 1912 são publicadas as condições de fornecimento particular da electricidade, das quais publicamos em anexo alguns dos artigos mais significativos.

À medida que os trabalhos se aproximavam do seu objectivo, começaram a ser preparados os festejos para comemorar este importante melhoramento para Torres Vedras, ficando a data de inauguração marcada para 1 de Dezembro de 1912.

A 16 de Novembro realizaram-se, entretanto, as primeiras experiências da iluminação eléctrica:
"Efectuaram-se ontem à noite na rede pública, experiências da iluminação eléctrica, o que fez com que as ruas se movimentassem de espectadores.

"Foi uma surpresa agradabilíssima pelo belo efeito produzido, sendo todos concordas em afirmar a beleza da mesma luz.

"Os arcos voltaicos, esses então, pelo seu efeito deslumbrante causaram um verdadeiro delírio nos pontos onde foram acesos e que se achavam repletas de "mirones" (12). 

(um dos primeiros candeeiros elécticos nas ruas de Torres Vedras, no actual "Largo da Havaneza")

Na sessão da Câmara de 21 de Novembro António Augusto Cabral participava "ter mandado abrir na sua propriedade — quinta das Covas — uma rua de ligação entre a estrada distrital e a do Cais da estação do caminho-de-ferro, a qual ficará aberta ao público no dia 1°de Dezembro próximo, deixando por Isso de ter sobre o respectivo terreno quaisquer direitos de posse ou serventia exclusiva, ficando entregue à fiscalização municipal e alvitrando que essa rua, pelo facto de ser aberta ao público no dia da luz electrica e ainda por nela ficar a estação geradora de electricidade, se denomine Rua da Electricidade".


(Exterior da Estação Geradora, onde actualmente funcionam os Serviços Municipalizados)

                                                            (interior da estação geradora)

(...)

"Do mesmo senhor, como sócio gerente da "Sociedade Progresso Industrial" comunicando achar-se concluída a montagem da rede para a iluminação pública e particular desta vila, devendo a respectiva inauguração realizar- se no dia 1.° de Dezembro próximo, ficando assim cumprida a parte aplicável do contracto celebrado entre aquela "Sociedade” e esta Câmara, a quem convida para assistir àquela inauguração (...)"(13).

Chegava finalmente o grande dia (ver anexo), com um variado Programa de festejos, dando-se assim início a uma nova era da história de Torres Vedras.



Esta terra não seria mais a mesma a partir dessa data, mesmo quando, a partir da entrada de Portugal na grande guerra e até aos anos 40, se registaram grandes problemas técnicos, económicos e políticos, que levaram a grandes alterações na "Sociedade Progresso Industrial", com reflexos negativos no fornecimento da luz eléctrica; mesmo que só no final dos anos 30 a electricidade viesse revolucionar a indústria torriense; ou mesmo que só nos anos 40 se tivesse iniciado a electrificação das freguesias rurais do Concelho.

Mas tudo isto já é outra história, que um dia esperamos poder contar.

Venerando Aspra de Matos.

NOTAS:
(1) "A Voz de Torres Vedras" -9/4/1887
(2) "A Voz de Tones Vedras" - 23/7/1887
(3)"A Semana" - 21/7/1887
(4) SERRÃO, Joel, "Noite Natural e Noite Técnica" in "Temas oitocentistas II", 1978
(5)"A Voz de Torres Vedras" - 4/2/1888
(6)"A Voz de Torres. Vedras" -  26/10/1889
(7)"A Semana" - 7/4/1895
(8)" Folha de Torres Vedras" -  20/4/1902
(9)"Folha de Torres Vedras" - 10/6/1908
(10)" Folha de Torres Vedras" - 24/12/1911
(11)" Folha de Torres Vedras" - 3/12/1911
(12)"Folha de Torres Vedras" -  17/11/1912
(13) "Folha de Torres Vedras" -  24/11/1912


ANEXO 1 :

"FERVOR REPUBLICANO

"Carta do sr. dr. Tiago Sales
"Meus senhores. — Inaugurais hoje, nessa vila, a iluminação electrica.
"Com magoa minha não posso ter o prazer de vos acompanhar neste dia, justamente festivo para essa povoação.
"Sendo certo que a Torre Vedras sempre fui quando o dever tal me ordenava.
"Sendo certo que junto de vós sempre estive quando era necessário preparar o povo para bem receber um melhor regimen e ensiná-lo a odiar uma monarquia que apenas soube viver arruinando o paiz, que só com grandes sacrifícios de todos se poderá erguer para a civilização.
"Sendo, igualmente, certo que nas longas e torturantes horas de 4 a 5 de Outubro, abandonando casa e familia, para junto de vós fui, desejando correr todos os riscos a que se sujeitaram todos aquêles que, nesses gloriosos momentos, se apresentaram de cabeça erguida a defender a nossa República, com o entusiasmo e calor de quem acima das suas pessoas e familias põe o paiz onde nasceu. Sendo verdade tudo isso a que me referi, de presumir é que, neste dia de alegria para Torres, desejasse estar convosco, partilhando dela e celebrando esse melhoramento, tanto mais digno de apreço, quanto é apenas filho do esforço persistente e honesto e da vontade inteligente de quem dele teve a boa iniciativa.
"Não me sendo, porem, isso possível, desejo, todavia saudar, por este meio, os esforçados iniciadores de tão útil melhoramentos; a briosa comissão dos festejos que por seu lado bem se esforçou por dar o brilho e relevo a essas justificadas festas; e, finalmente essa terra que vae aproveitar o êxito dessa rasgada iniciativa, fazendo ardentes votos por que esse exemplo de tenacidade frutifique.
"As classes e regiões que á sua custa se engrandecem, concorrem, por sua vez, notavelmente, para a riqueza e engrandecimento do paiz a que pertencem, sendo por isso dignos das melhores e calorosas saudações.
"Viva Torres Vedras!"

30 de Novembro de 1912.

Tiago Cesar Moreira Sales.

ANEXO 2:



A Folha de Torres Vedras descrevia assim, peia pena de Júlio Vieira, os festejos da inauguração da luz eléctrica uma semana depois do evento:

“Foram revestidos, como prevíramos, do maior brilhantismo, as festas da inauguração da luz electrica em Torres Vedras realisadas no domingo preterito, sendo digna de elogio, a comissão respectiva, composta dos srs. Joaquim Custódio Rodrigues, João Germano Alves, José Augusto Lopes Júnior, José Augusto Trigueiros e Januário Pinto dos Santos.

“O tempo quiz também contribuir para a pompa dos festejos, oferecendo-nos um belo dia de sol.

“De manhã houve toque de alvorada pelas duas sociedades musicais da vila, e às 10 horas formou-se o cortejo que foi esperar à estação do caminho-de-ferro os convidados e a banda de Infantaria 2 que foi contractada pela comissão para tomar parte nas festas.

“Depois dos cumprimentos na estação, pôz-se novamente o cortejo em mancha até à praça do Município, onde dispersou.

“Ao meio dia foi queimado o anunciado fogo de artifício, numero que constituiu novidade, sendo lançados ao ar foguetes que no espaço desenrolavam bandeiras verdes e encarnadas.

“Durante o dia e a noite houve sucessivos concertos musicais pela Fanfarra União Torreense, Filarmónica Torreense e banda de Infantaria 2.

“Pelas 4 horas da tarde reuniu-se na praça do Município enorme multidão que acompanhou a camara municipal, autoridades judiciais, civis e militares, convidados, representantes da imprensa, etc.. dirigindo-se todos para a nova rua da Electricidade, que ia ser oferecida à câmara pelo sr. António Augusto Cabral, o qual, uma vez ali chegado o cortejo, convidou o sr. presidente da camara a descerrar o letreiro da mesma rua, coberto com uma bandeira nacional.

“Depois desta cerimónia que decorreu com entusiasmo, tocando as musicas o himno, deram os convidados entrada na fábrica geradora que faz esquina para a dita rua e para a estrada distrital de Runa, que passa aos Cucos, no Bairro das Covas.

“(...) Eram horas de se fazer a inauguração da luz, pelo que se puzeram as maquinas em movimento e, o sr. António Augusto Cabral, dirigindo-se oo sr. presidente da camara, fez- lhe a comunicação oficial de estar cumprido o contracto da camara com o acto da inauguração que estava prestes, e convidou o sr. Coelho Graça, como representante do município, a subir ao quadro e fazer a ligação dos fios.

“Repentinamente a sala inundou-se de luz e bem assim toda a vila,sendo indescritível o entusiasmo que nesse momento impulsionou todos os assistentes.

“As musicas tocaram o himno e girandolas de foguetes subiram ao ar.

“Estava concluído o numero oficial e mais expressivo das festas.

“A seguir organisou se a marcha luminosa, com balões venezianos das côres verde e encarnada, a qual percorreu as ruas da vila aos sons do Himno da Restauração.

“No largo da República, iluminado aarcos voltaicos, houve concerto pela banda de Infantaria 2 e às 10 horas da noite deu-se começo ao vistoso e belo fogo de artificio de Viana do Castelo, do habil pirotécnico sr. José de Castro, terminando pela meia-noite as festas que deixaram as mais gratas recordações no espírito dos torreenses e do grande numero de forasteiros que aqui vieram de proposito assistir a elas”.

In Folha de Torres Vedras de 8 de Dezembro de 1912,

ANEXO 3

“O "MENU''

“O JANTAR NA TUNA COMERCIAL TORREENSE

“Decorreu com a maior animação e entusiasmo o jantar de confraternisação realisado na segunda feira ultima na Tuna Comercial, para festejar a inauguração da luz electrica naquela casa e a nova fase economica da mesma colectividade que se libertou de todos os seus compromissos monetários.

“Ao jantar assistiram 50 convivas, servindo-se o seguinte menu:

“Sopa à Republica—Pasteis de carne à José Lisboa — Peixe com molho francez à José Carnide—Arroz hespanhol à José Mendes -  Frango com ervilhas à A. Lafaia—Carne assada com macarron à Francisquinho. -—Doces e frutas à  A. Ferreira — Vinhos ao paladar de todos — Café à Tuna Comercial”.

ANEXO 4
“CONDIÇÕES DE FORNECIMENTO
“Em 19 deste mês, a Camara aprovou as condições de apólice dos contractos a celebrar entre a Sociedade Progresso Industrial, concessionaria da iluminação electrica, e os particulares que queiram fazer instalações proprias, para consumo da mesma luz.

“A Sociedade Progresso Industrial obriga-se a fornecer a energia electrica para Iluminação particular durante as mesmas horas em que durar a iluminação pública.

“O consumidor poderá optar para o consumo da luz, por qualquer das seguintes fórmas:

1.°— Quota fixa, ou avença com aparelho limita-correntes;
2.°— Contador de energia ou wattmetro.

Por avença regulado pela tabela seguinte:

Por hora Por 1/2 noite Por toda a noite
Por cada lampada de 5 velas      4 réis     15 réis   25 réis
Por cada lampada de 10 velas    6 réis     20 réis   30 réis
Por cada lampada de 16 velas    9 réis     25 réis   40 réis
Por cada lampada de 25 velas    12 réis   35 réis   60 réis

“Além do preço de avença, o subscritor de consumo de luz por noite inteira pagará 100 réis mensais pelo aluguer do aparelho limita-correntes; e o que se avençar por meia noite ou às horas, será obrigado a pagar, além do aluguer daquele aparelho, mais 100 réis pelo contador-horário, sendo o consumo minimo mensal, nesta fórma de subscrição, 20 horas.

“No contracto de consumo por contador, toma-se como unidade de medida o hecto-watt-hora (100 watts), cujo preço é de 16 réis.

“A Sociedade fornecerá exclusivamente os contadores por aluguer mensal, e ao preço seguinte:

Contador de energia até 3 ampères - 200 réis
Contador de energia até 5 ampères - 300 réis
Contador de energia até 10 ampères - 400 réis
Contador de energia de maior número de amperes- 800 réis

“Com o intuito de facilitar às classes menos abastadas a comodidade e vantagens da iluminação electrica, a Sociedade presta se a fazer de sua conta a instalação com material, não de luxo, mas decente, até ao maximo de tres lampadas por cada consumidor, mediante aluguer da mesma instalação, pelo preço de 60 réis por mês, a primeira lampada, é de 40 réis cada uma das restantes, além da taxa do aluguer do contador.

“OBSERVAÇÕES

“Para elucidação dos consumidores particulares, devemos dizer que as lampadas de 5 velas, que não se fabricam senão com filamento ordinário, não teem intensidade relativa ao seu consumo, gastando por hora 17,5 watts, no valor de 2,8 réis; devendo, pois, preferir-se as lampadas de 10 velas, ou mais, por serem de filamento metálico, e, como taes, produzirem luz mais intensa.

“Para facilidade no calculo do consumo por contador, observe-se a seguinte tabela:

“Cada lampada de 10 velas consome aproximadamente, por hora, 15 watts, no valor de 2,4 réis.
“Dita de 16 velas, por hora, 38 watts, no valor de 3,84 réis.
“Dita ide 25 velas, por hora, 38 watts, no valor de 6,08 réis.
“Dita de 32 velas, por hora, 48 watts, no valor de 7,68 réis.
“Dita de 50 velas, por hora, 75 watts, no valor de 12 réis.

“Todos os particulares que pretendam fazer uso da luz electrica, poderão desde já fazer a respectiva declaração no escritório da Sociedade, no Largo da República, n.°s 15 a 17, afim de se proceder à instalação, pela ordem por que se inscreverem.     

“Torres Vedras, 19 de Setembro de 1912.

“O socio gerente,

“António Augusto Cabral”.

1 comentário:

Anónimo disse...

Exmos Senhores,

Os CTT Correios de Portugal vão lançar este ano o livro "Uma História da Electricidade em Portugal", da autoria de João Figueira.

Para a iconografia desta obra gostaríamos de reproduzir a imagem disponível neste blogue "Programa de festejos por ocasião da inauguração da luz eléctrica em Torres Vedras, no dia 1 de Dezembro de 1912.",

Se possível, solicitamos a devida autorização para uma eventual reprodução da mesma na obra referida.

Peço por favor que a resposta a esta solicitação seja efetuada para o email vera.macedo@ctt.pt.

Muito obrigada.
Com os meus cumprimentos

Vera Macedo