segunda-feira, 24 de março de 2014

Santa Cruz de outros tempos, na memória (que eu partilho) do meu irmão Mário Luís Aspra de Matos...

"No meio de tantas memórias de lugares que foram ocupando as minhas férias, seria injusto não referir o local onde tantos e tantos anos passei as férias da minha juventude: a Praia de Santa Cruz.

"Desde que me conheço, os meus pais mudavam-se todos os anos para Santa Cruz no período de férias, normalmente em Setembro. Em Santa Cruz também estavam muitos dos meus amigos (alguns, para inveja minha, passavam lá boa parte das infindáveis férias de verão) e tinha amigos que apenas encontrava nesse período.

"A rotina diária era forçosamente diferente. O cheiro da maresia ao levantar, o ir comprar o pão ao centro da aldeia, e depois passar o dia quase todo na praia, na areia, no meio de jogos e brincadeiras, quase só interrompidos pela tão esperada ida ao banho.

"Normalmente almoçava-se em casa, não sem antes tomar um último banho, "in extremis", de forma a que não se regressasse a casa muito molhado, enrolado na toalha.

"De longe em longe, a minha mãe levava o almoço até à praia e então aí, basicamente, não saíamos da praia todo o dia.

"Algumas vezes a tarde contemplava um programa diferente. O aluguer de uma bicicleta no sr. Joaquim "das bicicletas" (primeiro com rodinhas laterais, mais tarde sem elas), ou então e em especial nos dias mais cinzentos, umas horas no "salão de jogos" a jogar "matrecos".

"Mais tarde lembro-me dos serões na praia, quando alguém já tinha um gira-discos ou um gravador portáteis, encostados aos montes de almofadas que por lá havia, a ouvir musica ou a conversar.
Em Julho e Agosto imperam os dias maiores e mais solarengos. Já Setembro é um mês mais incerto. Se há anos em que parece estarmos no inverno e a chuva não pára, há outros em que se tem os melhores dias de todo o verão, com marés muito vazias e calmas.

"Também em Setembro o areal da praia está mais vazio. Há menos veraneantes. E há fins de tarde fabulosos.

"Setembro é também o mês das marés vivas. Como os meus pais gostavam de alugar a barraca mais à frente da fila, na altura das marés vivas o mar chegava até lá muitas das vezes. Era uma festa (pelo menos para nós). Faziamos barreiras de areia à volta da barraca e jogávamos à "apanhada" com o mar. Normalmente conseguiamos sempre saltar para dentro da barreira antes de ficarmos molhados, mas, por vezes, as ondas eram mais fortes e destruiam-nos as barreiras, molhando tudo à passagem.

"E depois, havia ainda os gelados ao fim da tarde e a Ti' Angelina das pevides, tremoços e amendoins. E os livros de 'histórias aos quadradinhos' em segunda mão que se tocavam na papelaria União, por apenas cinco tostões.
Enfim, recordações de tempos felizes e despreocupados em que voltávamos para a escola já fartos de férias.

"Tal como eu fui mudando, Santa Cruz, hoje, também está diferente. Apesar de muitas das casas térreas e baldios terem dado lugar prédios altos e à construção de uma cintura de urbanizações, houve recentemente o bom senso de requalificar e "pedonalizar" o centro da aldeia, estancando alguma da descaracterização que Santa Cruz foi sofrendo ao longo do tempo.

"A frente de mar também foi arranjada e, por força das ondas, a praia está a ficar mais estreita.
Muitos dos locais da minha infância e juventude mudaram ou acabaram, mas isso faz parte da vida (embora não entenda porque é que a nossa querida "praia do norte" foi rebatizada para "praia do centro").

"Hoje vou passar férias para locais mais longínquos mas gosto ainda de passear nas ruas calmas de Santa Cruz, quando já não há a confusão do Agosto. Gosto de olhar o largo horizonte e vislumbrar as Berlengas ou de, à noite, ir tomar um copo ao "Manel".


"E quando os Setembros são bons espero sempre encontrar um final de dia soalheiro, onde uma maré vazia nos faz ficar na praia até quase ao sol se pôr".

Mári Luís Aspra de Matos, in blogue VONTADE DE IR

sexta-feira, 21 de março de 2014

Actividades da Biblioteca Municipal no Dia Mundial da Poesia


Hoje, dia Mundial da Poesia, a data é lembrada com várias actividades na Biblioteca Municipal. A programação pode ser vita AQUI 

quinta-feira, 13 de março de 2014

Um torriense recorda o D. José Policarpo professor em Penafirme:

"Fui aluno e amigo de D. José Policarpo. 

"Foi meu professor de francês no Seminário Liceal de Penafirme e em seguida vice-reitor da mesma escola. Encontrei-o em Lourdes em 1969, quando do regresso duma comitiva de escuteiros a um acampamento à Alemanha. 

"Recordo dessa época como uma pessoa progressista, que apoiou o então pároco de Belém, padre Felicidade Alves, que se atrevia na cara do tenebroso presidente almirante Tomás a tomar a defesa das liberdades. 

"Apoiou o movimento dos estudantes franceses, conhecido como Maio de 68, que obrigou De Gaulle a fugir para a Alemanha. 

"Anos mais tarde recordo algumas atitudes positivas, como por exemplo o pedido de perdão aos judeus pelos horrores da Inquisição, junto à Igreja de S. Domingos em Lisboa, o encontro de clérigos de várias religiões, incluindo os judeus e os muçulmanos e o casamento do ex-padre Felicidade Alves com a senhora com quem já vivia há alguns anos. 

"Em contraste num Encontro de ex-alunos do Seminário de Penafirme, já Patriarca de Lisboa, a que acedeu comparecer por meu convite, demonstrava já nos dizeres dum amigo e ex-colega o artista Paulo Ossião, uma postura "institucional" . 

"Foi de resto um dos fundadores da Universidade Católica e da TVI. Apoiou ultimamente este governo de gatunos e o próprio Cavaco Silva e foi um apoiante da política de empobrecimento das pessoas em Portugal.

"Já nem posso ouvir jornalistas de mais que duvidosa idoneidade, como a Fátima Campos Ferreira, a tecerem-lhe altos elogios e insinuando cumplicidade com ele. Acho que mal o conheceram...

"De qualquer forma não sendo de forma nenhuma um mitómano, e sendo ateu, devo-lhe algo da minha vida e formação cultural e por isso mesmo vou hoje à Sé de Lisboa prestar-lhe a minha última homenagem. Descanse em paz D. José Policarpo".

Alfredo Gomes

terça-feira, 11 de março de 2014

Documentos Para a História da Oposição ao Estado Novo em Torres Vedras - 1 - Apoio à Candidatura de Norton de Matos - 1949

Em 1949 o general Norton de Matos (1867-1955) apresentou-se como candidato da oposição nas "eleições" presidenciais de 1949.
Norton de Matos era um destacado republicano, que tinha ocupado importantes lugares institucionais durante a Primeira República: nomeado  governador de Angola em 1912,fundador da cidade de Huambo, exilado em Inglaterra durante o consulado de Sidónio Pais (1917-1918), delegado português à Conferência de Paz em 1919, era embaixador de Portugal em Londres, desde 1924, quando se deu o Golpe Militar do 28 de Maios de 1926, foi exonerado de todas as suas funções públicas em 1935. Poucos anos antes, em 1929, como maçon de longa data,  tinha sido eleito grão-mestre do grande Oriente Lusitano Unido.
No rescaldo do crescimento à oposição durante o pós-guerra, Norton de Matos apresentou-se assim como o candidato natural da oposição à presidência da republica nesse ano de 1949.
Em Torres Vedras, e como podemos ver no documento que aqui revelamos, algumas figuras históricas do republicanismo torriense arriscaram os seus negócios e as suas carreiras para assumirem publicamente o seu apoio ao candidato democrático.
Contudo, devido ás difíceis condições eleitorais e à impossibilidade de desenvolver uma campanha livre e democrática, Norton de Matos acabaria por desistir de levar a sua candidatura até às urnas, mas teve um papel importante para afirmar a oposição ao Estado Novo, abrindo caminho para o êxito da candidatura, em 1958, de Humberto Delgado, acontecimento ao qual o general Norton de Matos já não viria a assistir, por ter falecido três anos antes.
(ao documento de Torres Vedras, do nosso arquivo pessoal, juntamos outros documentos, relativos a essa candidatura, disponíveis na net):