sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

130 anos de Imprensa Torriense

Há 130 anos, em Janeiro de 1885 editava-se o primeiro jornal torriense.

Intitulava-se “Jornal de Torres Vedras” e iniciou a sua publicação numa quinta-feira, 1 de Janeiro de 1885.

Subintitulava-se “Agrícola, Commercial, Noticioso”, e teve como seus fundadores Agostinho Barbosa Sottomayor, Inácio França e Manuel de Paula Guimarães.  Tinha por objectivos “esforçar-se por tomar conhecidos os nossos vinhos (...) A nossa missão, todavia, estende-se mais além. A vila carece de urgentes melhoramentos que a coloquem a par das terras mais civilizadas. Havemos de, pouco a pouco, com insistência, com independência, com dignidade, sem offensa para ninguém, e com proveito para todos, lembrar esses melhoramentos, indicar a senda do progresso e do aperfeiçoamento, indispensável no último quartel do século XIX (...). Em breve tempo se fará ouvir, o silvo da locomotiva, que há-de servir  prodigiosamente os interesses commerciaes da villa, como temos fé. O nosso jornal advogará calorosamente todos os interesses honestos, toda a iniciativa proveitosa, industrial ou commercial (...)».

A edição desse primeiro título só foi possível graças à introdução em Torres Vedras da primeira tipografia, em 1884, propriedade de  Manuel Celestino Aspra, onde se imprimiu, quer o “Jornal de Torres Vedras” quer o título que lhe sucedeu, “A Voz de Torres Vedras”.

Esta primeira experiência jornalística durou dois anos, dois anos cruciais para o desenvolvimento de Torres Vedras, pois foi nesse período que se ultimaram as obras de construção da linha férrea, que ligaria Torres Vedras a Lisboa, modificando em definitivo e profundamente o rosto da então  vila.

 Embora o grande destaque das páginas desse jornal  fosse dado à temática agrícola, principalmente  a vitivinicultura, actividade que, então, lutava desesperadamente contra o avanço da  filoxera, nelas podemos seguir semanalmente os progressos da construção do caminho de ferro.

Paradoxalmente, o “Jornal de Torres Vedras” encerraria as suas páginas no dia da inauguração da ligação ferroviária ente esta localidade e Lisboa, no dia 30 de Dezembro de 1886, e assim ficámos privado da reportagem histórica desse acontecimento.

Contudo essa, para comemorar esse acontecimento, foi impresso um número único intitulado “Lisboa-Torres Vedras” impresso na tipografia onde se editava aquela jornal.

Tinha-se assim  dado início à heróica história da imprensa torriense que, com  raras interrupções, acompanhou, semana a semana,  a vida de Torres Vedras e das suas gentes ao longo dos último 130 anos.

De periodicidade e duração diversas, acompanhando as grandes mudanças tecnológicas da actividade tipográfica que a suportou, são conhecidos mais de 60 títulos de periódicos locais.
O dr, António da Silva Rosa, no seu trabalho pioneiro no n.° 1220 de  25-05-1979, no jornal “Badaladas”, identificou, até esse ano, 48, aos quais podemos acrescentar mais uns vinte títulos por nós registados, quer anteriores, quer posteriores a 1979, sem contar com um sem número de jornais escolares copiografados, boletins de juntas de freguesia , de associações locais, de empresas,  ou com fins publicitários.

Não durou muito a interrupção provocada pelo desaparecimento daquele primeiro título. Logo em Fevereiro de 1887 surgiam dois novos semanários. “A Voz  de Torra Vedras” (1887-1890), que se intitulava herdeiro do jornal pioneiro, e “A Semana”(1887-1896), dando-se então início a uma “tradição” que se manteve de forma quase interrupta até 1926, a publicação simultânea de, pelo menos, dois títulos semanais em Torres Vedras.

Ainda do século XIX datam dois dos mais importantes títulos da histórica imprensa local torriense: “A Vinha de Torres Vedras”(1894-1920) e o “Folha de Torres Vedras”(1899-1913).

Aqueles dois títulos documentam nas suas páginas a transição da monarquia para a República e do séc. XIX para o séc. XX, relatando nas suas páginas, não só os reflexos a nível local da agitada vida política local, mas também as primeiras notícias da introdução do cinema ou da luz eléctrica em Torres Vedras.

Refira-se ainda a particularidade importante de o jornal “Folha de Torres Vedras”  ter aderido ao ideal republicano ainda antes da implantação desse regime político. Este jornal viria a fundir-se em 1913 com o seu velho rival “A Vinha de Torres Vedras”, mantendo-se este título até 1920.

Só na década de 80 do século XX é que um outro jornal, o “Badaladas”, fundado em 1948, bateria em longevidade “A Vinha de Torres Vedras”.

Com a República, principalmente no após-primeira-guerra-mundial, surgem alguns títulos de vincada ideologia política, ligados a várias tendências e partidos políticos desse período, todos de duração efémera.

Três títulos desse período merecem ser aqui recordados pela forma como se empenharam na defesa das questões locais: o “Ecos de Torres”, publicado entre 1917 e 1921; “O Torrense”, entre 1919 e 1925; e “A Nossa Terra”, de 1924 a 1926.

A partir de 1926, coincidindo com o início da Ditadura Militar que originou o Estado Novo, a imprensa local conheceu uma acentuada decadência. Durante quase um ano, pela primeira vez desde o nascimento da imprensa torriense, entre Setembro de 1926 e Agosto de 1927, não se publica um único título em Torres Vedras.

É então que surge uma das mais importantes apostas jornalísticas da época, o “Gazeta de Torres”, dirigido inicialmente pelo dr. Justino  Freire de Moura Guedes, substituído em finais de 1930 por António Batalha Reis  e, mais tarde, por Edmundo de Oliveira, e onde se destacam como  jornalistas Luís Brandão de Melo  e Victor Cesário da Fonseca. Este título não só se tornou no jornal de maior duração entre os  fundados  na primeira metade do século XX
(obviamente antes do aparecimento do “Badaladas”), coma seria o ponto de confluência de uma nova geração de jornalistas locais, dinâmica e inovadora. Contudo, as suas posições políticas, anti-salazarista e apoiante da Aliança Republicano-Socialista, primeira grande força de oposição legal ao jovem regime ditatorial, forçaram o seu encerramento prematuro, publicando-se pela última vez  em 13 de Agosto de 1933.

A partir dessa data quase toda a imprensa teve duração efémera, e, na maior parte dos casos, mais não era de que a câmara de eco dos ideais do Estado Novo, nalguns casos assumidamente apoiantes da ideologia fascista que se espalhava pela Europa de então.

A crise da imprensa torriense agrava-se a partir de 1936 quando o jornal que então se publicava, o segundo com o título de “O Torreense”, passa a  editar apenas um número anual, não publicando mesmo qualquer exemplar nos anos de 1943 e 1944, devido às dificuldades económicas provocadas pela Segunda Guerra Mundial, situação que só se alterou em 1946,quando esse jornal regressou à sua publicação semanal, que durou até 1954.

Contudo, só com o aparecimento do jornal “Badaladas”, fundado em 1948 pelo Padre Joaquim de Sousa, se registou uma mudança significativa no panorama jornalístico torriense. O Padre Joaquim Maria de Sousa teve o mérito de conseguir transformar um pequeno mensário paroquial no primeiro título moderno de Torres Vedras, com uma visão aberta sobre as realidades locais, e que, apesar das limitações impostas pelo regime político de então através da Censura, soube tornear essa questão com uma grande dose de independência e dignidade, ainda hoje exemplares.

Até 1952 o “Badaladas” publicou-se mensalmente, tornando-se quinzenário neste ano e, finalmente, a partir de 15 de Dezembro de 1960 em semanário, situação que se mantem até aos nossos dias.

Ao longo da sua história o “Badaladas” soube adaptar-se às mais variadas realidades políticas, sociais, culturais e tecnológicas, que marcaram a segunda metade do século XX, tornando-se num dos raros casos de longevidade, não só em termos locais, mas até a nível nacional. Pelas suas páginas têm passado todas as gerações de jornalistas torrienses dos últimos 70 anos.

Com a recuperação da Liberdade e da democracia, após o 25 de Abril de 1974, tomou-se possível o aparecimento de mais projectos inovadores. Assim, aconteceu com o “Oeste Democrático”, o título que foi, as a seguir ao “Badaladas”, o de maior regularidade , publicando-se entre  1975 e 1978. Revelou-se  inovador nas  temáticas abordadas, mas também na forma como as apresentava, com paginação dinâmica, nomeadamente no tratamento dado aos títulos de primeira página. Encerrado devido a dificuldades económicas, grande parte da sua equipa redactorial passou-se  de armas  e bagagens para o jornal “Badaladas”, contribuindo par a  renovação deste título, então sob direcção do Padre José Manuel.

Também pelo espírito  dinâmico que imprimiu no conteúdo e na forma, há que destacar o jornal “Área”, que esteve na origem de uma das mais dinâmicas e inovadoras associações culturais da actualidade, a Cooperativa de Comunicação e Cultura.

O “Área” teve uma vida efémera, publicando-se mensalmente, de forma mais ou menos regular, entre 1979 e 1981,editando-se a, parir de então, de forma irregular e esporádica, como edição anual, com o objectivo de divulgar as actividades daquela associação.

O carácter inovador destes dois títulos influenciou, sem dúvida, outros projectos que marcaram o final do século XX, o  “Frente Oeste” e  a revista  “Zona Oeste”.

O Frente Oeste nasceu num concelho vizinho, na Lourinhã, como mensário, tendo editado o seu nº 1 em Julho de 1985. Mudou depois a sua redacção e edição para Torres Vedras  em passando a  quinzenário até Dezembro de 1990 e semanário a partir de então, durando 22 anos, até 14 de Janeiro de 2010, quando saiu a sua 1027º edição, vítima da crise económica e má gestão que marcou a sua fase final. Caracterizou-se pelo profissionalismo jornalístico da sua equipa e pela modernidade das reportagens que publicou, rivalizando, neste aspecto, com um outro título do oeste, o “Gazeta das Caldas”.

Foi também na última década do século XX que surgiu uma outra publicação periódica de qualidade, uma revista mensal intitulada “Zona Oeste”,  inovadora do ponto de vista gráfico e dos conteúdos e que iniciou a sua publicação em Outubro de 1990.

No primeiro ano do novo século surgiu aquela que foi a primeira tentativa  de edição de um jornal diário local, o “Diário de Torres”, aproveitando as condições e a experiência da revista “Festa”, uma revista mensal, que nasceu para divulgar uma agência de publicidade, a  “Da Rosa”(A revista “Festa” já vai na sua 135ª edição e 18 anos de vida). O “Diário de Torres”, editado por Carlos Rosa, teve a marca de um jornalista torriense, vindo do Frente Oeste e de outras experiências de jornalismo local, antigo correspondente local do jornal “Público”, Victor Alexandre, infelizmente já falecido. Esse diário teve contudo uma existência efémera, publicando-se entre 3 de Julho e 17 de Agosto de 2001.

O conhecimento dos últimos cento e trinta anos da sociedade torriense não pode dispensar o estudo e o conhecimento das milhares de  páginas amarelecidas que guardam milhões de palavras escritas por centenas de torrienses, muitos deles anónimos que deram o melhor de si, para  informar e registar os pequenos e grandes acontecimentos que marcaram mais de cem anos da vida de Torres Vedras.

A eles dedicamos esta breve evocação histórica do jornalismo torriense.

Venerando Aspra de Matos

O “TOP TEN” DA IMPRENSA TORRIENSE:

(Quadro elaborado com base no estudo pioneiro do DR. António da Silva Rosa, “Esboceto Histórico do Jornalismo Torrense”, no jornal Badaladas nº 1220 de 25-5-1979, e actualizado por nós)

1 – “Badaladas” [Maio de 1948 - …] 3080  edições (até ao fim de Janeiro de 2015):
2 – “A Vinha de Torres Vedras [ 25 -1 – 1894 a 25 – 12 – 1920] -  1348 edições;
3 – “Em Frente Oeste” [Julho 1985 a  14-1- 2010] – 1027 edições;
4 – “Folha de Torres Vedras” [ 26-3-1899 a 11-12-1913] – 676 edições;
5 – “A Semana”  [24-2-1887 a 5-1-1896] – 461 edições;
6 – “Gazeta de Torres” [ 14-8-1927 a 13-8-1933] – 308 edições;
7 – “O Torreense” (2º título) [26-10-1919 a 7-6-1929]- 278 edições;
8 – “O Jornal de Torres Vedras” (2ª Título) [4-3-1929 a 31-7-1932] -198 edições;
9 – “A Voz de Torres Vedras” [5-2-1887 a 25-1-1890] – 196 edições;

10 – “Oeste Democrático” [26-6-1975 a 14-7-1978] – 160 edições.

3 comentários:

Joaquim Moedas Duarte disse...

Excelente apontamento!
Obrigado, Venerando de Matos, por mais esta importante achega para o conhecimento da nossa História Local.

Unknown disse...

Seria possivel ter acesso aos arquivos dos jornais?

Venerando António Aspra de Matos disse...

A Maior parte dos jornais torrienses estão disponíveis na Biblioteca Municipal. Os que não existem em Torres Vedras existem na Biblioteca Nacional de Lisboa, na secção de publicações periódicas. A Hemeroteca da Câmara de Lisboa também possui vários títulos.