“Luz, Luz!
“Assim bradava um pobre homem que pelas 11 horas da noite de
segunda-feira estava na vila pela rua da Corredora. E tinha razão, porque
tropeçando num pedregulho que estava quase a meio da rua, foi bater de encontro
a uma carroça, ferindo-se na cara e no braço esquerdo. Como muitos outros,
aquele caminho é mal iluminado; mas na referida noite e hora achava—se às
escuras, o que é um perigo, sobretudo
estacionando aí veículos (…)"(1)
Estava-se em 1887, quando um jornal de Torres Vedras publicou
esta notícia, que hoje nos parece caricata.
Contudo, ela revela uma preocupação constante dos homens do
século XIX: o aperfeiçoamento do precário esboço de Iluminação Pública então
ensaiado um pouco por todo o país.
A primeira notícia de Iluminação Pública em Portugal data de
Julho de 1780, quando Pina Manique resolveu introduzi-la em Lisboa, usando-se o
azeite como combustível.
Desde 1862 que existia iluminação pública em Torres Vedras,
com 35 candeeiros a petróleo espalhados pelas ruas da vila, mas apresentando
várias deficiências no seu funcionamento.
Por outro lado, nem todas as noites esse candeeiros eram
acesos, pois, razões de poupança, levaram a que, no caso de o calendário prever
noite de lua cheia, eles não serem ligados, mesmo que na noite prevista as
nuvens cobrissem a Lua.
A ILUMINAÇÃO A GÁS
Mas é no Verão de 1887 que se anuncia um novo progresso na
iluminação pública da vila, como se lê nas seguintes notícias:
“0 Sr. Joaquim Pedro Marques, que é realmente empreendedor,
entusiasta por todas as inovações que denotam progresso, e o sr. Joaquim José
Rodrigues, fizeram no sábado" [16 de Julho de 1887]"a experiência de
uma luz muito superior à do petróleo,
colocando na esquina das ruas dos Balcões e do Rosário, um candeeiro gazogeneo,
cujo combustível é a nafta refinada" (2)
"Com um resultado deveras satisfatório foi feita a
experiência de novo sistema de iluminação, que a Câmara municipal pensa (...)
adquirir para as ruas dá vila.
"Os candeeiros gasogénio são muito elegantes, e a sua
luz pode reputar-se tão clara como a do gaz carbónico.
"Levado a efeito este melhoramento, cabe à vila de
Torres Vedras, a glória de ser a primeira terra do reino que iniciou um sistema
de iluminação tão aperfeiçoada" (3).
Não pudemos confirmar se esta primazia atribuída a Torres
Vedras, quanto ao tipo de iluminação adoptada,
é verdadeira, mas vemos afirmações idênticos serem repetidas noutras
notícias.
Joel Serrão (4) afirma que a luz a gaz foi ensaiada em
Lisboa a 30 de Junho de 1848, mas aquela era produzida a partir do carvão de
pedra, enquanto o sistema inaugurado em Torres Vedras tinha por combustível a
nafta refinada.
Seja como for, esse novo sistema foi inaugurado em Torres
Vedras no Sábado 28 de Janeiro de 1888:
"Mais um progresso a registar nos feitos dos
melhoramentos locais, e de mais a mais realizado num dia assinalado, no sábado
em que houve eclipse, coisa de que os nossos avós tinham muito medo. Pois foi
exactamente na ocasião em que a lua se via mais "aflita" que se
inaugurou a iluminação a gazolina, por sinal que custou muito a acender os
elegantes candeeiros, como ainda hoje custa, e se não fôr adaptado outro meio
mais breve, como é de esperar que seja, o último candeeiro será aceso quando
forem horas de apagar o primeiro.
“O certo é que a luz é bela e, segundo nos dizem, mais económica
(...)" (5).
"Os candeeiros são muito lindos, podendo colocar-se não
só em postuletas, nas paredes, como agora se usa na vila, mas também em postes,
o que é um belo aformosamento para as praças
e largos.
"As ruas recentemente calçadas como estão e bem
iluminados como virão a ser, darão um tom alegre à vila, tornando-a transitável
de noite" (3).
De salientar que uma das primeiras artérias da vila
totalmente iluminada por este novo processo foi a Avenida Casal Ribeiro, actual
Av. 5 de Outubro, que havia sido recentemente inaugurada, tendo sido nela
colocados, assim como no largo da estação, um total de 14 candeeiros com
colunas de ferro.
A Ribaldeira e Dois Portos foram os dois primeiros lugares
do concelho a seguir o exemplo da vila, substituindo parcialmente a iluminação
a petróleo pela iluminação a gaz, graças à iniciativa de alguns moradores, isto
em Fevereiro de 1888:
Contudo este sistema revelou- se muito dispendioso para a
Câmara e terão surgido problemas técnicos que levaram a que se tivesse voltado à
iluminação a petróleo em meados de 1891, e até 1912.
(candeeiro a Petróleo na actual Avenida 5 de Outubro)
A REVOLUÇÃO DA ELECTRICIDADE
"A lisa verdade, porém, manda que se diga que da
fogueira e do archote à luz do gás não houve qualquer revolução essencial no
processo de que se lançava mão para obter luz; tratava-se sempre da mesma
combustãozinha, cujo descobrimento tem as raízes bem mergulhadas na Pré-História.
Vão surgindo novos combustíveis, novos queimadores, maior profusão de
candeeiros mais ou menos complicados — e nada mais. Não seria do lado da
combustão, mas no da incandescência, que a revolução da iluminação doméstica e
pública haveria, um dia, de soprar" (Joel Serrão) — (4).
É em 1876 que o físico russo Jablochkoff inventa a
"vela eléctrica" e em 1878 Swan inventa a primeira lâmpada
incandescente que iria revolucionar a iluminação, embora o tipo de lâmpada que
se usou até há pouco tempo, com filamento de tungsténio, tenha sido inventado
em 1913 por Langmuir.
Em Portugal a primeira experiência de iluminação eléctrica
teve lugar em Cascais a 28 de Setembro de 1878, usando-se "velas
eléctricas” de Jablochkoff, para, em 31
de Outubro, esses candeeiros, usados em Cascais, serem acesos em Lisboa.
Mas a primeira distribuição pública de electricidade ocorreu
em 1889 quando a companhia de gás de Lisboa conseguiu garantir a iluminação da
Avenida da Liberdade.
Nesse mesmo ano, a 26 de Outubro, era divulgado em Torres
Vedras o uso da luz eléctrica em Lisboa, num artigo
publicado na "Voz de Torres Vedras":
“No dia 1 do próximo mez começa a ser iluminada a luz
electrica a estação do caminho-de-ferro de Santa Apolónia e suas dependências
até Madre de Deus.
"As outras estações, essas continuarão quase às
escuras" (6).
OPINIÃO PÚBLICA BATE-SE PELA LUZ ELÉCTRICA
É em 1895 que surge a
primeira proposta para o uso da eletricidade na Iluminação Pública de Torres
Vedras.
De facto, na sessão municipal de 5 de Abril de 1895
"foi presente à Camara uma proposta assinada
pelo Sr. Eduardo Raposo, de Lisboa, oferecendo-se para tomar a seu cargo a iluminação
da vila a luz electrica. O sr. presidente depois de ler a proposta, que é
bastante desenvolvida, e de a acompanhar com judiciosas considerações, propôs
que se nomeasse uma comissão para estudar o assunto e dar o seu parecer. Assim
se resolveu ficando a comissão composta dos srs. vereadores Francisco Avelino, Xavier Paes e António Fivelim”(7).
Contudo, tal iniciativa não passou das boas intenções e a
deficiência da iluminação pública torriense continuou a ser encarada, ainda por
muito tempo, quase como uma fatalidade.
É assim que entramos no século XX lendo os protestos
frequentes da imprensa local contra as condições da iluminação pública, à misturas
com sugestões para resolver esse problema, como se podia ler na seguinte
passagem de um desses artigos:
"É agora que em várias terras do país, quer pela sua
importância, quer pela sua índole progressiva, se está modificando o seu
systema de iluminação, substituindo o petróleo por gaz ou electricidade, agora
que o comércio da nossa terra se está emancipando da antiga luz, vendo-se já
montados em vários 'Estabelecimentos desta vila custosas instalações de gaz
acetyleno, é agora, dizíamos, o momento oportuno de tratarmos a sério da
iluminação pública" (8).
Opiniões como esta tiveram, no mínimo, a virtude de agitar
os meios políticos de então, tendo levado a que surgisse, ainda nesse ano, uma
proposta subscrita por Júlio Vieira e José Fernandez Alvarez para o
fornecimento da luz eléctrica ao concelho, tendo a Câmara de Torres Vedras
aberto um concurso público para a concessão do fornecimento de luz eléctrica,
isto em Julho de 1902.
Mas, mais uma vez, e ao que consta por falta de
concorrentes, é adiada a realização desse melhoramento.
E entretanto continuam a chover, cada vez com mais
frequência, protestos públicos nas páginas da imprensa de Torres Vedras, como
este que, pela sua ironia, não resistimos a transcrever:
"Há certos melhoramentos, bens materiais e necessidades
da vida que só se obteem ou satisfazem muito de longe em longe, o que tanto
vale dizer que é só quando o rei fez anos.
"Ora acontece que, sendo uso cá da terra, "para
poupar o petróleo", não se acenderem os candeeiros nas noites em que a
folhinha marca luar, embora a lua se não veja, chova, ou faça trovões, os
candeeiros de iluminação publica foram acesos na noite da aclamação do rei [D.
Manuel II], noite por sinal de um poético luar como dizia alguém, com certa
graça. Tanto equivale dizer que nós só teremos boa iluminação na vila quando o
rei é aclamado, isto é, uma vez na vida, e não quando o rei faz anos o que
seria, cremos, uma vez em cada ano.
"Ora em tal caso, nós somos apologistas de que sua
magestade seja aclamada, pelo menos uma vez em cada noite de trovões que a
folhinha anuncie luar, para assim adquirirmos a certeza de que poderemos
caminhar pelas ruas da vila, sem lanterna na mão, por falta de iluminação
pública que é motivada — repetimos — "para poupar petróleo".
(9).
Apesar de ainda nesse ano de 1908 a Câmara voltar a abrir
novo concurso público para fornecimento de luz eléctrica, concurso novamente
falhado, foi preciso, ao contrário do que ironicamente diz o texto, que se
deixasse de uma vez por todas de aclamar os reis, para finalmente se conseguir
inaugurar a luz eléctrica em Torres Vedras.
A SOCIEDADE PROGRESSO INDUSTRIAL
A 24 de Dezembro de 1911 o Jornal 'Folha de Torres”
anunciava finalmente que tinham sido "aprovados superiormente as bases
estabelecidas pela Câmara Municipal deste concelho para o concurso de
iluminação de luz eléctrica da vila, com a restrição do prazo ser reduzido a 20
anos, e o mesmo contracto só poder incidir sobre a iluminação publica e
particular da vila e portanto como a exclusão da força motriz, tracção ou
aquecimento" (10).
Esse concurso seria ganho por uma companhia de Torres Vedras,
a Sociedade Progresso Industrial que se havia constituído por escritura de 1 de
Abril de 1911, e tinha como associados João Ferreira Júnior, José Augusto
Lopes, António Augusto Cabral, nomeado gerente da sociedade, e João Ferreira
Guimarães Júnior, a quem mais tarde se viriam a juntar João Maria Castanho,
João Ferreira Pinto, José Joaquim Miranda, Filipe Vilhena e Luiz Francia, este
último proprietário da primeira sala de cinema de Torres Vedras, inaugurada em
Maio de 1911.
No seu início, a Sociedade Progresso Industrial havia
surgido tendo por objectivo a exploração mecânica da debulha do trigo e
enfardamento de palha, com um capital de 5 contos.
Mais tarde os seus estatutos foram alterados, não só para aumentar
o número dos seus sócios, como já referimos, mas para alargar os seus
objectivos à exploração da luz eléctrica em Torres Vedras, aumentando então o
seu capital para 24 contos, verba que, segundo uma notícia publicada a 31 de
Dezembro de 1911, era "o suficiente para a instalação e montagem de
máquinas e rêde, e ainda para desenvolver a exploração da industria agrícola,
que já exploraram na época passada"(11).
0 contrato para a concessão da exploração da iluminação
eléctrica foi assinado entre a Câmara e a Sociedade Progresso Industrial em 30
de Dezembro de 1911, concessão que seria aprovada superiormente por publicação em
"Diário da República” de 20 de Janeiro de 1912.
Iniciaram-se então os trabalhos para a montagem de
instalações e sede da Sociedade:
"A construção do edifício, para a estação central
produtora da energia eléctrica, que será feita no Bairro das Covas, vai
principiar em breve; as máquinas geradoras, dois esplêndidos motores Diesel,
são fornecidas pela Casa HAROLD & Cª, e todo o material electrico pela
importante casa alemã Siemens"(11)
FINALMENTE...
Finalmente a 19 de Setembro de 1912 são publicadas as condições
de fornecimento particular da electricidade, das quais publicamos em anexo
alguns dos artigos mais significativos.
À medida que os trabalhos se aproximavam do seu objectivo,
começaram a ser preparados os festejos para comemorar este importante
melhoramento para Torres Vedras, ficando a data de inauguração marcada para 1
de Dezembro de 1912.
A 16 de Novembro realizaram-se, entretanto, as primeiras
experiências da iluminação eléctrica:
"Efectuaram-se ontem à noite na rede pública,
experiências da iluminação eléctrica, o que fez com que as ruas se movimentassem
de espectadores.
"Foi uma surpresa agradabilíssima pelo belo efeito
produzido, sendo todos concordas em afirmar a beleza da mesma luz.
"Os arcos voltaicos, esses então, pelo seu efeito
deslumbrante causaram um verdadeiro delírio nos pontos onde foram acesos e que
se achavam repletas de "mirones" (12).
Na sessão da Câmara de 21 de Novembro António Augusto Cabral
participava "ter mandado abrir na sua propriedade — quinta das Covas — uma
rua de ligação entre a estrada distrital e a do Cais da estação do caminho-de-ferro,
a qual ficará aberta ao público no dia 1°de Dezembro próximo, deixando por Isso
de ter sobre o respectivo terreno quaisquer direitos de posse ou serventia
exclusiva, ficando entregue à fiscalização municipal e alvitrando que essa rua,
pelo facto de ser aberta ao público no dia da luz electrica e ainda por nela
ficar a estação geradora de electricidade, se denomine Rua da
Electricidade".
(Exterior da Estação Geradora, onde actualmente funcionam os Serviços Municipalizados)
(...)
"Do mesmo senhor, como sócio gerente da "Sociedade
Progresso Industrial" comunicando achar-se concluída a montagem da rede
para a iluminação pública e particular desta vila, devendo a respectiva
inauguração realizar- se no dia 1.° de Dezembro próximo, ficando assim cumprida
a parte aplicável do contracto celebrado entre aquela "Sociedade” e esta
Câmara, a quem convida para assistir àquela inauguração (...)"(13).
Chegava finalmente o grande dia (ver anexo), com um variado Programa
de festejos, dando-se assim início a uma nova era da história de Torres Vedras.
Esta terra não seria mais a mesma a partir dessa data, mesmo
quando, a partir da entrada de Portugal na grande guerra e até aos anos 40, se
registaram grandes problemas técnicos, económicos e políticos, que levaram a
grandes alterações na "Sociedade Progresso Industrial", com reflexos negativos
no fornecimento da luz eléctrica; mesmo que só no final dos anos 30 a electricidade
viesse revolucionar a indústria torriense; ou mesmo que só nos anos 40 se
tivesse iniciado a electrificação das freguesias rurais do Concelho.
Mas tudo isto já é outra história, que um dia esperamos
poder contar.
Venerando Aspra de Matos.
NOTAS:
(1) "A Voz de Torres Vedras" -9/4/1887
(2) "A Voz de Tones Vedras" - 23/7/1887
(3)"A Semana" - 21/7/1887
(4) SERRÃO, Joel, "Noite Natural e Noite Técnica"
in "Temas oitocentistas II", 1978
(5)"A Voz de Torres Vedras" - 4/2/1888
(6)"A Voz de Torres. Vedras" - 26/10/1889
(7)"A Semana" - 7/4/1895
(8)" Folha de Torres Vedras" - 20/4/1902
(9)"Folha de Torres Vedras" - 10/6/1908
(10)" Folha de Torres Vedras" - 24/12/1911
(11)" Folha de Torres Vedras" - 3/12/1911
(12)"Folha de Torres Vedras" - 17/11/1912
(13) "Folha de Torres Vedras" - 24/11/1912
ANEXO 1 :
"FERVOR REPUBLICANO
"Carta do sr. dr. Tiago Sales
"Meus senhores. — Inaugurais hoje, nessa vila, a iluminação
electrica.
"Com magoa minha não posso ter o prazer de vos acompanhar neste
dia, justamente festivo para essa povoação.
"Sendo certo que a Torre Vedras sempre fui quando o dever tal
me ordenava.
"Sendo certo que junto de vós sempre estive quando era
necessário preparar o povo para bem receber um melhor regimen e ensiná-lo a
odiar uma monarquia que apenas soube viver arruinando o paiz, que só com
grandes sacrifícios de todos se poderá erguer para a civilização.
"Sendo, igualmente, certo que nas longas e torturantes horas
de 4 a 5 de Outubro, abandonando casa e familia, para junto de vós fui,
desejando correr todos os riscos a que se sujeitaram todos aquêles que, nesses
gloriosos momentos, se apresentaram de cabeça erguida a defender a nossa
República, com o entusiasmo e calor de quem acima das suas pessoas e familias
põe o paiz onde nasceu. Sendo verdade tudo isso a que me referi, de presumir é
que, neste dia de alegria para Torres, desejasse estar convosco, partilhando dela
e celebrando esse melhoramento, tanto mais digno de apreço, quanto é apenas
filho do esforço persistente e honesto e da vontade inteligente de quem dele
teve a boa iniciativa.
"Não me sendo, porem, isso possível, desejo, todavia saudar,
por este meio, os esforçados iniciadores de tão útil melhoramentos; a briosa
comissão dos festejos que por seu lado bem se esforçou por dar o brilho e
relevo a essas justificadas festas; e, finalmente essa terra que vae aproveitar
o êxito dessa rasgada iniciativa, fazendo ardentes votos por que esse exemplo
de tenacidade frutifique.
"As classes e regiões que á sua custa se engrandecem,
concorrem, por sua vez, notavelmente, para a riqueza e engrandecimento do paiz
a que pertencem, sendo por isso dignos das melhores e calorosas saudações.
"Viva Torres Vedras!"
30 de Novembro de 1912.
Tiago Cesar Moreira Sales.
ANEXO 2:
A Folha de Torres Vedras descrevia assim, peia pena de Júlio
Vieira, os festejos da inauguração da luz eléctrica uma semana depois do
evento:
“Foram revestidos, como prevíramos, do maior brilhantismo,
as festas da inauguração da luz electrica em Torres Vedras realisadas no
domingo preterito, sendo digna de elogio, a comissão respectiva, composta dos
srs. Joaquim Custódio Rodrigues, João Germano Alves, José Augusto Lopes Júnior,
José Augusto Trigueiros e Januário Pinto dos Santos.
“O tempo quiz também contribuir para a pompa dos festejos,
oferecendo-nos um belo dia de sol.
“De manhã houve toque de alvorada pelas duas sociedades
musicais da vila, e às 10 horas formou-se o cortejo que foi esperar à estação
do caminho-de-ferro os convidados e a banda de Infantaria 2 que foi contractada
pela comissão para tomar parte nas festas.
“Depois dos cumprimentos na estação, pôz-se novamente o
cortejo em mancha até à praça do Município, onde dispersou.
“Ao meio dia foi queimado o anunciado fogo de artifício,
numero que constituiu novidade, sendo lançados ao ar foguetes que no espaço
desenrolavam bandeiras verdes e encarnadas.
“Durante o dia e a noite houve sucessivos concertos musicais
pela Fanfarra União Torreense, Filarmónica Torreense e banda de Infantaria 2.
“Pelas 4 horas da tarde reuniu-se na praça do Município
enorme multidão que acompanhou a camara municipal, autoridades judiciais, civis
e militares, convidados, representantes da imprensa, etc.. dirigindo-se todos
para a nova rua da Electricidade, que ia ser oferecida à câmara pelo sr.
António Augusto Cabral, o qual, uma vez ali chegado o cortejo, convidou o sr.
presidente da camara a descerrar o letreiro da mesma rua, coberto com uma
bandeira nacional.
“Depois desta cerimónia que decorreu com entusiasmo, tocando
as musicas o himno, deram os convidados entrada na fábrica geradora que faz
esquina para a dita rua e para a estrada distrital de Runa, que passa aos
Cucos, no Bairro das Covas.
“(...) Eram horas de se fazer a inauguração da luz, pelo que
se puzeram as maquinas em movimento e, o sr. António Augusto Cabral,
dirigindo-se oo sr. presidente da camara, fez- lhe a comunicação oficial de estar
cumprido o contracto da camara com o acto da inauguração que estava prestes, e
convidou o sr. Coelho Graça, como representante do município, a subir ao quadro
e fazer a ligação dos fios.
“Repentinamente a sala inundou-se de luz e bem assim toda a
vila,sendo indescritível o entusiasmo que nesse momento impulsionou todos os
assistentes.
“As musicas tocaram o himno e girandolas de foguetes subiram
ao ar.
“Estava concluído o numero oficial e mais expressivo das
festas.
“A seguir organisou se a marcha luminosa, com balões
venezianos das côres verde e encarnada, a qual percorreu as ruas da vila aos
sons do Himno da Restauração.
“No largo da República, iluminado aarcos voltaicos, houve concerto
pela banda de Infantaria 2 e às 10 horas da noite deu-se começo ao vistoso e belo
fogo de artificio de Viana do Castelo, do habil pirotécnico sr. José de Castro,
terminando pela meia-noite as festas que deixaram as mais gratas recordações no
espírito dos torreenses e do grande numero de forasteiros que aqui vieram de
proposito assistir a elas”.
In Folha de Torres Vedras de 8 de Dezembro de 1912,
ANEXO 3
“O "MENU''
“O JANTAR NA TUNA COMERCIAL TORREENSE
“Decorreu com a maior animação e entusiasmo o jantar de
confraternisação realisado na segunda feira ultima na Tuna Comercial, para
festejar a inauguração da luz electrica naquela casa e a nova fase economica da
mesma colectividade que se libertou de todos os seus compromissos monetários.
“Ao jantar assistiram 50 convivas, servindo-se o seguinte
menu:
“Sopa à Republica—Pasteis de carne à José Lisboa — Peixe com
molho francez à José Carnide—Arroz hespanhol à José Mendes - Frango com ervilhas à A. Lafaia—Carne assada
com macarron à Francisquinho. -—Doces e frutas à A. Ferreira — Vinhos ao paladar de todos —
Café à Tuna Comercial”.
ANEXO 4
“CONDIÇÕES DE FORNECIMENTO
“Em 19 deste mês, a Camara aprovou as condições de apólice
dos contractos a celebrar entre a Sociedade Progresso Industrial, concessionaria
da iluminação electrica, e os particulares que queiram fazer instalações proprias,
para consumo da mesma luz.
“A Sociedade Progresso Industrial obriga-se a fornecer a
energia electrica para Iluminação particular durante as mesmas horas em que
durar a iluminação pública.
“O consumidor poderá optar para o consumo da luz, por
qualquer das seguintes fórmas:
1.°— Quota fixa, ou avença com aparelho limita-correntes;
2.°— Contador de energia ou wattmetro.
Por avença regulado pela tabela seguinte:
Por hora Por 1/2 noite Por toda a noite
Por cada lampada de 5 velas 4
réis 15 réis 25 réis
Por cada lampada de 10 velas 6
réis 20 réis 30 réis
Por cada lampada de 16 velas 9
réis 25 réis 40 réis
Por cada lampada de 25 velas 12
réis 35 réis 60 réis
“Além do preço de avença, o subscritor de consumo de luz por
noite inteira pagará 100 réis mensais pelo aluguer do aparelho
limita-correntes; e o que se avençar por meia noite ou às horas, será obrigado
a pagar, além do aluguer daquele aparelho, mais 100 réis pelo contador-horário,
sendo o consumo minimo mensal, nesta fórma de subscrição, 20 horas.
“No contracto de consumo por contador, toma-se como unidade
de medida o hecto-watt-hora (100 watts), cujo preço é de 16 réis.
“A Sociedade fornecerá exclusivamente os contadores por
aluguer mensal, e ao preço seguinte:
Contador de energia até 3 ampères - 200 réis
Contador de energia até 5 ampères - 300 réis
Contador de energia até 10 ampères - 400 réis
Contador de energia de maior número de amperes- 800 réis
“Com o intuito de facilitar às classes menos abastadas a
comodidade e vantagens da iluminação electrica, a Sociedade presta se a fazer de
sua conta a instalação com material, não de luxo, mas decente, até ao maximo de
tres lampadas por cada consumidor, mediante aluguer da mesma instalação, pelo
preço de 60 réis por mês, a primeira lampada, é de 40 réis cada uma das
restantes, além da taxa do aluguer do contador.
“OBSERVAÇÕES
“Para elucidação dos consumidores particulares, devemos
dizer que as lampadas de 5 velas, que não se fabricam senão com filamento
ordinário, não teem intensidade relativa ao seu consumo, gastando por hora 17,5
watts, no valor de 2,8 réis; devendo, pois, preferir-se as lampadas de 10
velas, ou mais, por serem de filamento metálico, e, como taes, produzirem luz
mais intensa.
“Para facilidade no calculo do consumo por contador,
observe-se a seguinte tabela:
“Cada lampada de 10 velas consome aproximadamente, por hora,
15 watts, no valor de 2,4 réis.
“Dita de 16 velas, por hora, 38 watts, no valor de 3,84
réis.
“Dita ide 25 velas, por hora, 38 watts, no valor de 6,08
réis.
“Dita de 32 velas, por hora, 48 watts, no valor de 7,68
réis.
“Dita de 50 velas, por hora, 75 watts, no valor de 12 réis.
“Todos os particulares que pretendam fazer uso da luz
electrica, poderão desde já fazer a respectiva declaração no escritório da
Sociedade, no Largo da República, n.°s 15 a 17, afim de se proceder à
instalação, pela ordem por que se inscreverem.
“Torres Vedras, 19 de Setembro de 1912.
“O socio gerente,
“António Augusto Cabral”.
Exmos Senhores,
ResponderEliminarOs CTT Correios de Portugal vão lançar este ano o livro "Uma História da Electricidade em Portugal", da autoria de João Figueira.
Para a iconografia desta obra gostaríamos de reproduzir a imagem disponível neste blogue "Programa de festejos por ocasião da inauguração da luz eléctrica em Torres Vedras, no dia 1 de Dezembro de 1912.",
Se possível, solicitamos a devida autorização para uma eventual reprodução da mesma na obra referida.
Peço por favor que a resposta a esta solicitação seja efetuada para o email vera.macedo@ctt.pt.
Muito obrigada.
Com os meus cumprimentos
Vera Macedo