A Questão das
“Subsistências” em Torres Vedras (1916 – 1918)
por Venerando Aspra de Matos
0 – Uma Breve Introdução
Apontar pistas que esclareçam o impacto que a
participação de Portugal na Primeira Grande Guerra teve nas condições de vida e
subsistência da população torriense, é o principal objectivo desta nossa
comunicação, nomeadamente em relação:
- à forma como se organizou o poder local para planificar e prevenir a
distribuição dos produtos essenciais à subsistência dos habitantes do concelho;
-
ao impacto da crise na evolução dos preços;
- ao modo como o agravamento das dificuldades enfrentadas quotidianamente pelas populações potenciou
uma crescente agitação social;
- à situação alimentar da população do concelho, quer quanto ao consumo
de produtos essenciais para a sua alimentação, quer quanto à produção dos
mesmos;
- ao reflexo da crise das subsistências na situação sanitária da
população, dramaticamente evidenciada quando da “pneumónica”.
1 - Algumas características
sociais da população torriense (1916 – 1918)
Entre os dois limites censitários que incluem o período
estudado, a população do concelho, que era de 38.926 habitantes em 1911,
cresceu até aos 41.917 habitantes em 1920.
A sua estrutura manteve-se
estável durante essa década: o número médio de pessoas por família situava-se
nos 4,5 , mais de 50% da população estava incluída no escalão etário dos
activos (dos 15 aos 64 anos), 57% em 1911 e 59,1% em 1920.Contudo, quer no topo
quer na base da estrutura etária da população registou-se um decréscimo percentual
acentuado face ao total da população: os que tinham 65 anos ou mais viram o seu
peso reduzir-se de 6% em 1911 para 5,9% em 1920; os que tinham menos de 15 anos
registaram uma quebra percentual ainda mais acentuada, descendo dos 37% em 1911
para os 35% em 1920.
A esmagadora maioria da
população, 92,8% em 1911 e 92,6% em 1920, era natural do próprio concelho,
situação que denota uma mobilidade fraca.
Passemos agora a observar (Quadro
I) as características sócio – profissionais da população deste concelho:
-
em 1911, a percentagem de população activa no concelho de T. Vedras
(37,9%) era inferior à média nacional (46,6%);
- a principal actividade da população activa do concelho era a
agricultura, 74,4%, uma percentagem muito superior à média do país (56,5%);
- em muitas freguesia do concelho a actividade agrícola ocupava a quase
totalidade dos activos, ultrapassando a percentagem concelhia de activos na
agricultura: 85,7% em Dois Portos, 82,9% em A Dos Cunhados, 82,3% no Ramalhal,
78,3% na Freiria e 78% na Carvoeira;
- pelo contrário, nas freguesias urbanas, S. Pedro e Stª Maria, a
percentagem de activos ligados à agricultura era inferior a 50%, percentagem
que se reduz para 11% se tivermos em conta apenas os activos vivendo na sede do
concelho.
QUADRO I
Distribuição
profissional da população activa do
concelho de T. Vedras
(1900-1911-1930)
ANO
|
1900
|
1911
|
1930
|
|||
ACTIVIDADE
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
I - Trabalhos
Agrícolas
|
10312
|
74,6
|
10981
|
74,4
|
17051
|
64,2
|
II - Caça e Pesca
|
8
|
0,1
|
0
|
0
|
8
|
0,03
|
III - Extracção de
materiais minerais
|
0
|
0
|
1
|
0,01
|
33
|
0,1
|
IV - Industria
|
1619
|
11,7
|
1635
|
11,0
|
2182
|
8,2
|
V - Transportes
|
219
|
1,6
|
276
|
1,9
|
329
|
1,2
|
VI - Comércio
|
682
|
4,9
|
638
|
4,3
|
877
|
3,2
|
VII - Forças Públicas
|
45
|
0,3
|
85
|
0,6
|
88
|
0,3
|
VIII - Administração
Pública
|
23
|
0,2
|
35
|
0,3
|
115
|
0,4
|
IX - Profissões
Liberais
|
158
|
1,1
|
123
|
0,8
|
154
|
0,6
|
X - Pessoas Vivendo
Rendimentos Próprios
|
77
|
0,8
|
294
|
2,0
|
2862
|
10,8
|
XI - Domésticos
|
267
|
1,9
|
207
|
1,4
|
2097
|
7,9
|
XI - Outros
|
407
|
2,9
|
484
|
3,3
|
793
|
3,0
|
TOTAL
|
13817
|
100
|
14759
|
100
|
26589
|
99,9
|
FONTE: Censos
da População
Com base nos recenseamentos
eleitorais de 1911 e 1918 é possível observar mais em pormenor, não só a
evolução, mas também as características da estrutura sócio-profissional do
concelho, podendo analisar-se igualmente as diferenças entre a média concelhia e a situação no centro urbano, sede do
concelho (Quadro II):
QUADRO II
Comparação entre a
Estrutura Sócio-Profissional do concelho e da vila de T. Vedras (1911 e
1918)
1911
|
1918
|
No Concelho
|
Na vila
|
No Concelho
|
Na vila
|
|||||
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
|
Proprietários
|
731
|
16,3
|
32
|
6,1
|
1794
|
24,6
|
50
|
8,1
|
Agricultores por conta própria
|
559
|
12,5
|
5
|
0,95
|
639
|
8,8
|
2
|
0,3
|
Assalariados Rurais
|
1882
|
42,0
|
22
|
4,2
|
3163
|
43,3
|
30
|
4,9
|
Industria
|
714
|
16,0
|
185
|
35,2
|
996
|
13,7
|
216
|
35
|
Actividade Técnico - cientifica
|
41
|
0,9
|
22
|
4,2
|
38
|
0,5
|
17
|
2,8
|
Administração
|
82
|
1,8
|
61
|
11,6
|
88
|
1,2
|
64
|
10,4
|
Forças Armadas e Militarizadas
|
36
|
0,8
|
5
|
0,95
|
19
|
0,3
|
7
|
1,1
|
Comércio e Serviços
|
329
|
7,4
|
146
|
27,8
|
433
|
5,9
|
191
|
30,9
|
Transportes
|
94
|
2,1
|
46
|
8,8
|
103
|
1,4
|
37
|
5,9
|
Outros
|
9
|
0,2
|
1
|
0,2
|
24
|
0,3
|
4
|
0,6
|
TOTAL
|
4477
|
100
|
525
|
100
|
7297
|
100
|
618
|
100
|
FONTE: Cadernos Eleitorais do Concelho de T. Vedras,
1911 e 1918 , Arquivo Histórico da Assembleia da República.
Podemos observar que, entre
os que se dedicavam à actividade agrícola, a maioria era composta por assalariados
(mais de 40% de toda a população activa).
É igualmente significativo o
número de “proprietários”, revelando a existência de uma propriedade
agrícola muito repartida, maioritariamente de pequena ou média dimensão.
A industria concentrava-se
principalmente na vila de T. Vedras, tal como acontecia com a administração e o
comércio.
2 - A Participação de
Portugal na Grande Guerra e o problema das subsistências em Torres Vedras.
A Primeira a Grande Guerra iniciou-se em 28 de Julho de
1914, mas Portugal só entrou no conflito no primeiro trimestre de 1916, depois
de a Alemanha ter declarado guerra ao nosso país em 9 de Março desse ano, como
consequência do acto de provocação do governo português que, em 23 de
Fevereiro, havia mandado apressar os navios alemães fundeados no Tejo.
As razões que levaram Portugal a participar nesse
conflito, que durou até 11 de Novembro de 1918, são conhecidas, embora os
historiadores interpretem de forma diferente
o peso de cada uma delas na decisão:
-
a importância da tradicional aliança anglo-lusa;
-
a defesa dos nossos direitos coloniais;
- a necessidade de afirmação na cena política
internacional do então jovem regime republicano;
-
questões políticas internas.
Não é nossa pretensão participar nesse debate, mas apenas
analisar o modo como aquela decisão afectou a situação económico – social do concelho de Torres Vedras.[1]
Embora Portugal só tenha entrado em guerra em 1916, os
efeitos deste conflito já se faziam sentir muito antes.
Um dos principais efeitos da guerra fez-se já sentir a
nível das subsistências, pelo que, logo em 1915, o governo de então tomou
medidas tendentes a atenuar os efeitos negativos da guerra no preço e na falta
de géneros de primeira necessidade.
2.1 - Medidas institucionais
para controlar o preço e o comércio dos géneros de primeira necessidade (das
“comissões de subsistência” aos “celeiros municipais”).
O primeiro decreto com impacto regional foi publicado
ainda durante a vigência do governo de Pimenta de Castro, o decreto nº 1483 de
6 de Abril de 1915, criando uma “Comissão Reguladora dos Preços Alimentícios”
em cada concelho do país, composta pelo
administrador do concelho, pelo presidente da comissão administrativa
municipal, pelo delegado do Sindicato Agrícola e pelo delegado da Associação
Comercial.
Competia a essa comissão elaborar tabelas, mensalmente
actualizadas, do preço de venda a público dos géneros alimentícios de primeira
necessidade e registar a saída de cereais do concelho para o abastecimento das
fábricas de moagem.
Esse documento
estabelecia ainda um preço máximo nacional para a venda de milho, de
centeio, de farinha de milho peneirada e do “pão de família de uso comum” em
Lisboa e no Porto.
Um novo decreto, o nº 1900, publicado em 18 de Setembro desse ano,
substituía aquelas “Comissões Reguladoras” por “Comissões de Subsistência”,
justificando a criação destas pela “necessidade de atenuar, tanto quanto
possível, os inevitáveis efeitos da guerra europeia e tomar medidas a fim de
obstar a que a elevação dos preços dos géneros de primeira necessidade” fosse
“devido a causas menos lícitas”.
Tais Comissões de Subsistência tinham com principais
funções tabelar o preço dos géneros de primeira necessidade e obrigar os
“produtores, comerciantes ou detentores de quaisquer géneros de primeira necessidade,
que possuindo-os para venda se recusem vendê-los, ou os tiverem em quantidade
superior às necessidades da família e da sua exploração agrícola, industrial ou
comercial” a “expo-los à venda, sempre que haja procura, sob pena de
desobediência qualificada”.
Em cada concelho foi criada uma Comissão de Subsistências
composta pelo administrador do concelho,
pelo presidente da comissão executiva municipal e por um representante da
agricultura, outro do comércio e outro da indústria.
Comentando a extinção da comissão reguladora dos preços
dos géneros alimentares do concelho e a sua substituição por uma comissão de
subsistências, à luz desse novo decreto, ironizava o periódico local “A Vinha
de Torres Vedras” : “(...) deixou de existir a comissão reguladora dos preços
dos géneros, cuja acção se tornou nula neste concelho.
“Em sua substituição criar-se-há uma outra comissão
idêntica que trará crtamente os mesmos benefícios.
“A constituição é igual, com a diferença de que os membros
da antiga comissão eram eleitos delegados das respectivas classes produtoras e
agora são de nomeação exclusiva das autoridades administrativas.
“È mais político e menos democrático”.[2]
Em 20 de Outubro o Administrador do concelho propunha ao
Governador Civil a nomeação para a Comissão de Subsistências de Torres Vedras
dos cidadãos “Francisco Avelino Nunes de Carvalho, representante da
agricultura, José Anjos da Fonseca, representante do comércio, e António
Augusto Cabral, representante da indústria”.[3]
Poucas são as referências à acção desta comissão, mas, a
partir de 1916, com a entrada de Portugal na guerra, revela-se uma crescente
preocupação por parte do executivo municipal com o abastecimento do concelho.
Em 24 de Maio de 1916 a Câmara solicita ao comandante
local da GNR “que se faça com maior rigor a fiscalização (...) do peso dos
géneros alimentícios” e em 26 de Setembro desse mesmo ano tem lugar uma sessão
extraordinária do executivo para resolver os problemas da carestia dos bens de
primeira necessidade.
Ao longo destes anos as sucessivas comissões de
subsistências, também designadas, a partir da publicação do decreto nº 3216 de
28 de Junho de 1917 por “comissão de abastecimento local”, desenvolvem várias
acções tendentes a combater a saída de produtos para fora do concelho.
Foi o que sucedeu em Abril de 1916 quando o administrador
do concelho “mandou apreender no Casal da Serra da Murteira, freguesia de S.
Mamede, 3 800 litros de trigo” que não tinham sido manifestados no prazo
devido, pelo que esse trigo foi “distribuído por pessoas que provaram
necessitar deste cereal com mais urgência”.
O mesmo aconteceu em 24 de Maio de 1917 quando foram
apreendidos “dois carros de trigo” que pretendiam sair da vila para o vender
fora do concelho, sendo o conteúdo apreendido depositado na Câmara Municipal.
Ainda em Abril de 1918 foi efectuada uma apreensão de 1
800 quilos de farinha em Dois Portos, sendo vendida a “várias pessoas, segundo
uma lista fornecida pela junta de paróquia (...) sendo metade do produto [da
venda] entregue ao seu possuidor e a outra metade ao Hospital da Misericórdia”.[4]
Aquela comissão desenvolveu também a tarefa fundamental de
importar, armazenar e distribuir os bens necessários, quer ao abastecimento da
população, quer à industria alimentar.
Numa reunião que teve lugar no dia 10 de Outubro de 1917,
a Comissão de abastecimento resolveu “adquirir 2 vagons de milho, de Benavente”
e oficiar e negociar com vários comerciantes o fornecimento de cereais, azeite
e arroz à comissão, decidindo ainda adquirir batata “para a panificação neste
concelho”.
Na mesma ocasião manifestou preocupação pelo facto de
“lavrar grande descontentamento nesta vila” devido às autoridades terem
consentido “na constante saída de feijão para fora do concelho”, temendo
“qualquer grave alteração da ordem pública”.[5]
Os poderes atribuídos às comissões de subsistência e a
constante intervenção dos poderes locais geraram conflitos envolvendo
principalmente os comerciantes e os produtores.
Num caso foram acusadas de abuso de autoridade, como
aconteceu com a acção do administrador do concelho António de Sá Pavillon:
afastado das suas funções após a instauração do governo sidonista, ele foi
acusado pela imprensa local afecta ao novo poder de “ficar com dinheiros do trigo pertencentes a diversos
agricultores, dinheiros que recebeu dos padeiros, não os entregando aos seus
legítimos donos”.[6]
Noutro caso os comerciantes queixavam-se às autoridades
locais dos abusos dos “fiscais das subsistencias”. O caso mais grave ocorreu em
Agosto de 1918, levando a Câmara a reunir extraordinariamente ameaçando-se
demitir.
Tendo reunido em assembleia geral no dia 22 de Agosto, os
comerciantes apresentaram queixa às autoridades locais contra a “forma
vexatória como foram feitos os varejos às existentes dos géneros de
subsistencias nos estabelecimentos desta
vila” e “à maneira tumultuosa das apreensões e ao modo ganancioso como se
pretende auferir avultosas multas, que em parte aproveita aos fiscais que
procedem a estas deligencias”, tendo decidido encerrar os seus estabelecimentos
em sinal de protesto, esperando uma solução das autoridades locais.
A Câmara decidiu enviar o protesto dos comerciantes à
Inspecção Geral de Subsistências do Ministério do Interior e solicitar “dos
poderes públicos uma sindicância aos actos fiscais que aqui procederam ao
varejo e impuseram as multas a que aquela representação alude”[7].
Os Celeiros Municipais
Com o objectivo de “auxiliarem a Repartição de
Cereais Panificação da Direcção Geral de
Subsistências, do Ministério das Subsistências e transportes, na aquisição,
armazenagem distribuição pelo país de
todo o centeio, milho e trigo das futuras colheitas e das farinhas desses
cereais, bem como de todo o centeio, milho, trigo e farinha exóticas que o Estado
venha a importar” foram criados pelo Decreto nº 4125 de 22 de Abril de 1918, os
chamado Celeiros Municipais.
Esses Celeiros eram
“organismos das câmaras municipais, um por cada concelho”. Para a sua
instalação as Câmaras foram autorizadas a “mobilizar os armazéns
particulares que” julgassem “necessários,
mediante o pagamento da renda”.
Os municípios compravam
directamente aos produtores e efectuavam imediatamente os pagamentos,
depositando os géneros nos ditos Celeiros, sendo igualmente responsáveis pelos
arrolamentos das futuras colheitas de centeio, milho e trigo.
No regulamento dos Celeiros
Municipais atribui-se às Câmaras a obrigação de enviar “até 31 de Maio, à
Repartição de Cereais e Panificação, uma nota do trigo, centeio e milho
necessário para a manutenção dos seus munícipes”.
Deviam igualmente
entender-se “directamente com a indústria da moagem” que existisse no concelho
“para que esta” recolhesse e pagasse “de pronto o centeio, milho ou trigo
destinados ao fabrico de pão para consumo” da população do concelho, procedendo
à “distribuição das farinhas pela indústria de panificação”.
Competia ainda às Câmaras
fixar o preço do pão e proibir o trânsito de pão entre concelhos diferentes,
não incluindo nesta proibição o pão que os trabalhadores levassem para as suas
refeições quando tivessem “serviço fora do concelho em que habitam”.
Na sequência de vários
protestos contra esse regulamento, enviados ao governo por diversas câmaras
municipais, é publicado o decreto nº4637 de 14 de Julho de 1918 que entrega a
direcção administrativa de cada celeiro municipal ao “presidente da Câmara, que
será o presidente”, a um “vereador eleito pela câmara” e ao “tesoureiro da
Fazenda Pública, que será o tesoureiro do celeiro”, alargando, ao mesmo tempo,
os poderes das câmaras e dos celeiros municipais sobre o abastecimento, fabrico, venda e preço
do pão.
Os celeiros municipais
complementavam a acção das comissões de subsistência ou abastecimento com vista
à resolução da grave crise de subsistências provocada pela guerra, dando às
câmaras um poder substancial sobre a
vida económica local.
Em Torres Vedras, na reunião
camarária de 10 de Julho de 1918 que se realizou para organizar o funcionamento
do respectivo celeiro municipal, decidiu-se a mobilização dos “celeiros dos
snr.s João Ferreira Junior e Ângelo Custódio Rodrigues, ambos situados na Rua
Dias Neiva”.[8]
. O tabelamentos dos preços e suas
consequências.
Segundo António José Telo,
“o défice alimentar português e a falta de produtos importados deviam
contribuir para um substancial aumento dos preços agrícolas que favorecesse um
acréscimo de produção, mas o Estado intervem, A política geral do Governo
consiste em conter os preços agrícolas, inicialmente através de tabelação e
mais tarde por manifestos obrigatórios, arrolamentos e requisições”. Esta intervenção
não permitiu que os preços aumentassem “tanto quanto as condições de mercado
ditavam”.[9]
Observando o Quadro III,
elaborado com base na média dos preços tabelados anualmente pela câmara
municipal, referentes à venda da produção do concelho, fazendo corresponder os
preços de 1914 ao índice 100, nota-se que é só a partir de 1918 e, de forma
mais acentuada, nos anos seguintes, até 1925, que se regista o aumento mais
significativo dos preços.
Para essa
situação muito terá contribuído o forte controle exercido sobre os preços
durante os anos da guerra.
Em Fevereiro de 1915 foi
publicada a primeira tabela dos preços dos géneros alimentícios e combustíveis
para o concelho de T. Vedras, alargando o controle dos preços aos produtos
importados, avisando-se que aqueles só podiam ser alterados com a autorização
do administrador do concelho.
Este controle das
autoridades sobre o preço dos produtos de primeira necessidade, se agradava aos
consumidores, prejudicava os interesses dos produtores agrícolas e dos
comerciantes locais.
A nível nacional os
“agricultores queixavam-se dos grandes aumentos dos adubos, alfaias, sementes e
salários”, reclamando “contra os baixos preços dos seus produtos e os mais
ousados lançaram-se no açambarcamento, mercado negro e contrabando”.[10]
Em Torres Vedras, a publicação oficial pelo administrador do
concelho da tabela que fixava o preço dos géneros de primeira necessidade foi
saudada, pela imprensa local, por considerar que tal decisão punha cobro ao
facto de “alguns comerciantes menos escrupulosos” abusarem “da situação já
precária em que se” encontrava “a vida nacional com gravame para o público que
se via lesado”, aproveitando a ocasião para alertar e apelar às mesmas
autoridades a porem “cobro aos açambarcadores que aos domingos vêm fazer o seu
jogo para a praça”.[11]
Contudo, ainda no mesmo ano,
começam a surgir queixas contra a “falta de cumprimento da tabela dos preços
dos géneros”.[12]
A maior parte das queixas contra a falta do cumprimento na aplicação da tabela referia-se ao preço do pão. Em Maio de 1916 um articulista denunciava o aumento do preço do pão na vila n’ “um centavo em quilo, sem prévio aviso para os consumidores.
A maior parte das queixas contra a falta do cumprimento na aplicação da tabela referia-se ao preço do pão. Em Maio de 1916 um articulista denunciava o aumento do preço do pão na vila n’ “um centavo em quilo, sem prévio aviso para os consumidores.
Perante os crescentes
protestos o administrador do concelho acabou por providenciar “de maneira que
nesse mesmo dia o pão voltasse a vender-se nesta vila ao preço de 9 centavos”.
Aquele mesmo articulista a
“que, sempre que se torne necessário fazer qualquer aumento de preço de géneros
de primeira necessidade, como estes que têm preço estabelecido e certo, deve
presidir o critério de se avisar antecipadamente o público, para se não
repetiram os casos desagradáveis que têm acontecido de, inesperadamente, numa
manhã, a carne custar mais cara ou o pão subir de preço, com desconhecimento do
público que não via isso com bons olhos”.[13]
Um outro tipo de queixa muito frequente referia-se á falta de peso do pão ou ao facto de ser mal cozido.
Um outro tipo de queixa muito frequente referia-se á falta de peso do pão ou ao facto de ser mal cozido.
Em Novembro de 1916 um
leitor da “Vinha...” queixava-se da Câmara ter autorizado o aumento do preço do
pão a pedido dos “poderosos”, “permitindo ainda (...) que o pão seja cozido e... cerceado (...) no
peso, porque os padeiros não sabem que um quilo tem mil gramas”.[14]
Em Maio de 1917 queixava-se
mais uma vez a imprensa local de “há tempos para cá” o preço do pão e o de
outros géneros subir “assustadoramente” e de, apesar das promessas das
autoridades em punir severamente quem não pesasse correctamente o pão, este ter
rapidamente voltado a aparecer “mal cozido e com falta de peso”.[15]
Ao longo desses anos
continuam a surgir queixas contra o
encarecimento do pão “algum de má qualidade”, ironizando um articulista que “a
diminuir assim de peso, temos que daqui a pouco os padeiros receberão o
dinheiro do pão e acabam por não entregar nenhum”.[16]
Alguns comerciantes
resistiam a vender o seu produto pelo preço tabelado, como aconteceu em
Fevereiro de 1918 com um que, por se recusar a vender na praça a batata ao
preço tabelado, viu o seu produto ser apreendido pelas autoridades que o
prenderam e venderam a batata ao preço legal, entregando-lhe depois o produto
da venda.[17]
Apesar de todas as medidas
tomadas pelas autoridades tendentes a controlar os preços, a imprensa local, a
poucos dias do fim da guerra, referia o agravamento, “dia a dia”, das
“condições de vida económica”, devido à constante subida dos preços,
considerando que “o mais modesto chefe de família tem de ter um ordenado de
príncipe e uma correia para apertar a barriga”, denunciando ainda que “os ovos
vendem-se descaradamente a tostão cada um. Quem deles tiver necessidade por
motivo de doença ou seja pobre, sem eles terá de passar, assim como de muitas mais
coisas necessárias em caso de doença”.
“Os outros géneros seguem a
mesma marcha ascensional de preço (...). Dos géneros sujeitos a tabela, quase
não há notícia”, faltando o açúcar e “nalguns dias” o próprio pão.[18]
Protestos contra a carestia e a falta de
géneros.
Embora sem a gravidade que se registou noutros
pontos do país, nomeadamente em Lisboa, a crise das subsistências provocou em
Torres Vedras alguma agitação social.
Foram várias as causas que
motivaram essa agitação: a qualidade do fabrico do pão; a sua falta ou o seu
preço; a falta de outros produtos essenciais, como o açucar ou o arroz; o
açambarcamento; menos frequente, a questão salarial.
Já nos referimos
anteriormente aos protestos referidos na imprensa local contra a má qualidade
do pão fabricado.
Um dos momentos de maior
tensão vivido em Torres Vedras por causa dessa situação ocorreu entre os finais
de Maio e início de Junho de 1916, quando “apareceu à venda um novo tipo de pão
de trigo e milho misturado e pelo preço idêntico ao do pão de trigo só”.
Numa tentativa para acalmar os ânimos realizou-se uma
concorrida reunião no Centro Republicano Alexandre Braga, na qual se nomeou uma
comissão para estudar “o assunto e se entender com os industriais de padaria e
com a câmara municipal, afim de se solucionar o conflito”.
Após várias reuniões de
trabalho, assa comissão reuniu-se pela última vez no dia 6 de Junho “sob a
presidência do sr. Administrador do concelho” e com a presença dos “industriais
de padaria”, chegando-se “ao seguinte acordo e compromisso” com estes, “até aos
novos trigos” : “fabricar, além do pão fino, sem limite de preço, um tipo de
pão de farinha de trigo por 180 réis o quilo e um tipo de pão de milho, com uma
margem de rolão grosso”, por “120 réis o quilo”.[19]
Durante o dia em que
decorreu essa reunião “correram nesta vila vários boatos de que se dariam (...)
acontecimentos de vulto, a propósito da questão do pão.
Aquele acordo acabou por ser
sancionado pela Câmara cerca de uma semana depois, acalmando os ânimos da
população.
A falta de farinha e pão,
bem como a instabilidade do seu preço, foi igualmente geradora de alguma
agitação social durante o período estudado.
Em Fevereiro de 1916, ainda
antes da entrada de Portugal na guerra, a imprensa local destacava as
“dificuldades da vida, pela enorme carestia dos géneros de primeira necessidade
que, se para os remediados se tornaram de difícil acesso, para os pobres vão
sendo uma coisa raríssima” e que agora “a agravar a vida aflitissima das populações rurais, até a falta de pão
veio acentuar, nalguns lugares deste concelho, as dificuldades da hora
presente, e sem que ao que parece, as autoridades tenham dado um passo para
atenuar essa falta de uma gravidade tão extrema”.[20]
Ao longo do ano de 1916
são frequentes os pedidos por parte do administrador do concelho para o
Governador Civil de Lisboa, solicitando o envio urgente para o concelho de
milho e outros cereais, com se pode confirmar folheando a correspondência
daquele administrador para este orgão de poder existente no Arquivo Municipal
de T. Vedras.
Em 28 de Fevereiro de 1917 o
administrador do Concelho enviava um telegrama para Ministério do Trabalho,
solicitando providências para resolver a falta de farinha no concelho, pois
receava que se registasse a alteração da ordem pública.[21]
Em 28 de Maio desse mesmo ano a câmara municipal de
Torres Vedras fazia publicar um edital onde proibia a saída de cereais, de
farinha e de pão para fora do concelho devido “à reclamação do povo desta vila”
que nesse mesmo dia tinha afluído em grande número à Câmara a exigir que essa
decisão fosse tomada.
Com tal medida tentava-se
contribuir “para que se não sinta a falta de pão que se apresentava para breves
dias, com o espectro negro da fome, se tal medida não houvesse sido tomada”.
Na reunião camarária onde
foi tomada essa decisão, deliberou-se ainda que “todos os cereais existentes
neste concelho e cujas quantidades se reconheça excederem as necessidades dos
respectivos possuidores, só possam, sob pena de apreensão, ser única e
exclusivamente vendidas a esta câmara”. Decidiu-se ainda que os padeiros
“passassem a fabricar o pão de dia, em lugar da noite, para ser consumido
passadas essas horas e assim restringir-se o consumo do mesmo pão” [22]
Em Agosto de 1917 a situação
da falta de pão continuava a agitar a opinião pública local, levando os
proprietários das padarias a expor ao administrador do concelho “a situação que se encontravam por falta de
trigos, visto que as pessoas indicadas pela mesma administração para venderem o
trigo manifestado, se recusavam a entregá-lo”.[23]
Se a falta de pão, por ser o
principal alimento das populações, foi a que provocou mais agitação social, a
falta de outros produtos motivou igualmente vários protestos.
Foi o que aconteceu em
determinadas ocasiões com a falta do açúcar ou do arroz.
No dia 26 de Setembro de
1916 os proprietários das mercearias reuniram-se para protestar “contra as
delongas do fornecimento do açúcar” e as dificuldades opostas ao comércio
local”, resolvendo enviar uma representação ao administrador do concelho.
Nessa representação,
considerando que “a actual escassez de açúcar nos inibe de fornecer
regularmente os nossos clientes”, colocando-os “mal perante os consumidores” e
sendo a sua distribuição “feita de forma injusta e morosa”, para além de outras
queixas, resolveram dar a sua adesão à Associação dos Vendedores de Víveres a
Retalho de Lisboa “que se propõe solicitar aos Poderes Públicos a abolição da
tabela de preços de açúcar em vigor, deixando livre o seu comércio, que será
regulado pela imutável lei da oferta e da procura”. [24]
Houve contudo uma situação
que gerou protestos de sentido contrário, relacionada com a proibição de se
exportar batata do concelho, decisão que tinha sido tomada pelo executivo
camarário em Setembro de 1917 com o objectivo de assegurar o fabrico de pão de
trigo misturado com batata.
Os protestos baseavam-se no
facto do concelho produzir batata “em quantidade muito superior às suas
necessidades”, nunca se tendo registado falta desse tubérculo pelo que, ao não
ser escoada devido àquela medida, esta apodrecia rapidamente, com evidente
prejuízo para os seus produtores.
Tinha acontecido também, num
dos mercados dominicais da vila, que a batata posta à venda teve de voltar “aos
pontos de origem, dando em resultado grande parte dela ir parar aos estrumes,
por não se aguentar nestes embates de viagens e contra viagens”. No domingo
seguinte a este acontecimento “quase nenhuma batata apareceu á venda nesta
vila”, ficando armazenada pelos produtores á espera de “obter melhores preços”
e evitar os riscos de apodrecimento, situação que levou vários lavradores a queixarem-se à imprensa
local contra aquela medida camarária “que prejudica a agricultura do concelho,
ao mesmo tempo que não” resolvia “por forma alguma a crise das subsistências”.[25]
Igualmente alvo dos
protestos populares foram as situações de açambarcamento, muito comuns em
conjunturas como aquela.
Já em 1915 registou-se em
Torres Vedras “grande indignação (...) pelo facto (...) de os açambarcadores de
géneros não serem incomodados pelas autoridades”.[26]
Em Maio de 1916 um
articulista local denunciava “os grandes açambarcadores” que “vivem à tripa
forra” e “engordam com o suor dos campos”, enquanto nos campos se vivia “outra
vez a vida miserável das graves dificuldades aumentadas pela carestia e
raridade das subsistências”.[27]
Em meados de 1918 a mesma
imprensa local chamava a atenção das autoridades administrativas para os abusos
cometidos “na praça desta vila com os géneros que são açambarcados2 e vendidos
depois a “preços exorbitantes”, pelo que “o público fala exasperado, e com
razão e a autoridade administrativa, a quem compete evitar estes abusos, não
deve fechar os olhos perante eles, para não dar lugar a continuas e justas
reclamações”.[28]
Duas das situações mais
graves ocorreram em 1916, a primeira no dia 8 de Abril, tendo os padeiros
liderado uma reclamação junto do administrador do concelho por não existir
“trigo suficiente para o consumo e saberem haver quantidades desse cereal nos
armazéns dos srs. João Ferreira Júnior e jacinto Lopes Baeta” que, em face dos
protestos, foram intimados pelo administrador do concelho a vender o trigo ao
preço tabelado.
Deslocando-se os padeiros a
um desses armazéns foram recebidos pelo encarregado que se negou “a vender
qualquer porção desse cereal por menos de 1$20 os 14 litros, preferindo antes
largar-lhe o fogo”.
Perante tal situação, as
autoridades tiveram de intervir confiscando “452 sacos de trigo de 100 litros
cada”, levados para uma “dependência no edifício da Graça” onde o produto foi
vendido ao preço tabelado.[29]
Outra situação idêntica
ocorreu quando foram apreendidos pela autoridade administrativa, na estação de
caminho-de-ferro da vila, “25 sacas de açúcar trazidas para serem vendidas aos
comerciantes desta vila2 acima do preço tabelado.[30]
A “questão salarial”.
A questão salarial foi outro
dos motivos da agitação social que se registou durante os anos da guerra.
Contudo o efeito do aumento
do custo de vida nos salários não se fez sentir não se fez sentir da mesma
maneira em todos os sectores de actividade.
Sendo à época a agricultura
a actividade dominante entre a população activa do concelho, ao longo do
período estudado os salários agrícolas acompanharam, pelo menos nos primeiros
tempos, a subida do custo de vida. Apesar disso, e citando mais uma vez a
imprensa local, não se podendo “dizer que no nosso concelho (...) as jornas
agrícolas se têm conservado por preços um tanto elevados, não haja em larga
escala esse mal estar que tanto aflige a sociedade portuguesa”.[31]
Valia a uma parte considerável
da população rural a existência de uma economia auto-subsistência.
As principais queixas vindas
do mundo rural referiam-se à subida do preço dos meios necessários à actividade
agrícola, ao tabelamento dos preços ou à proibição de importações de uns
produtos e da exportação de outros: “Enquanto que poderosos magnatas exploram
livremente a vida dos campos com ganancioso aumento de preços dos produtos
necessários ao solo, era imposta uma tabela de preços para os produtos
agrícolas; enquanto se deixavam exportar produtos necessários à agricultura,
que tinha por isso mesmo de os pagar mais caro, não se acudia às necessidades
fortemente e antecipadamente apontadas da importação de cereais, para se acudir
à fome; ao par e passo que se aumentavam as dificuldades da vida presente,
paralisava-se, proibindo-se quase, a saída dos nossos vinhos para o
estrangeiro(...)”.[32]
Já em relação ao mundo
operário, embora este tivesse ainda pouco peso na sociedade torriense, a
situação salarial era mais importante, já que os trabalhadores deste sector
dependiam exclusivamente do seu salário para sobreviverem ao constante aumento
do custo de vida, para além de se concentrarem maioritariamente na vila, onde a
pressão dos preços era maior.
A indústria torriense era
ainda maioritariamente artesanal, pelo que as primeiras medidas conhecidas para
enfrentar a subida dos preços se resolveu aumentado o preço da sua “obra”:
Em Janeiro de 1916
reuniram-se os “operários” da “arte de marceneiro” para apreciarem a sua
“difícil situação”. Devido à “enorme elevação” dos géneros de primeira
necessidade, resoveram, para minorar a sua situação, elevar “os preços das
obras durante a actual crise, de comum acordo com os patrões”, referindo a
notícia que “outras classes vão fazer o mesmo”.[33]
Um movimento pelo aumento
salarial na indústria deste concelho teve lugar em Fevereiro de 1917, quando
“alguns operários da oficina de tanoaria da viúva de António da Silva, na rua
Mousinho d’Albuquerque, exigiram aumento salarial”.
Tendo-lhes sido negado o aumento,
resolveram entrar em greve no dia 27 de Fevereiro, uma terça-feira.
A pedido do gerente da
oficina, o administrador do concelho mandou “à hora dos operários tomarem o
trabalho, um guarda para a oficina, a fim de que não fosse impedida a entrada
aos operários que desejassem trabalhar, tendo todos, depois de vários
entendimentos com o proprietário e gerente, retomado o trabalho, à excepção
d’um que por isso foi despedido”.[34]
3 – A Situação Alimentar da
População Torriense (1916- 1918)
. A Produção agrícola do concelho de Torres Vedras.
. A Produção agrícola do concelho de Torres Vedras.
Sendo a agricultura a
principal actividade do concelho de Torres Vedras este era, no período
estudado, um dos principais centros de produção agrícola do distrito de Lisboa
(que então se estendia pelo actual distrito de Setúbal), num total de 26
concelhos, como se pode comprovar no Quadro IV.
Nesse quadro podemos ver também a evolução de algumas
produções do concelho e o tipo de agricultura era produzida durante a primeira
metade do século XX:
QUADRO IV
Produção agrícola do concelho de Torres Vedras (1904;
1916;)
Produto
|
medida
|
1904
|
1916
|
Posição
de T. Vedras no distrito de Lisboa (1916)
|
T.
Vedras
%
da produção distrital
(1916)
|
Concelho com maior produção no distrito de Lisboa
(1916)
|
Mosto
|
litros
|
S/d
|
29.933.718
|
1º
|
25,4
|
T. Vedras
|
Vinho
|
litros
|
35.950.000
|
21.833.640
|
1º
|
24,0
|
T. Vedras
|
Batata
|
quilos
|
6.200.000
|
3.902.921
|
2º
|
17,6
|
Cadaval
|
Trigo
|
litros
|
856.000
|
2.295.040
|
6º
|
5,8
|
Vª Frª de Xira
|
Milho
|
litros
|
945.900
|
1.533.320
|
3º
|
10,5
|
Alenquer
|
Feijão
|
litros
|
124.700
|
347.403
|
1º
|
29,9
|
T. Vedras
|
Fava
|
litros
|
89.500
|
588.300
|
4º
|
6,2
|
Vª Frª de Xira
|
Azeite
|
litros
|
51.250
|
19.124
|
8º
|
4,2
|
Alcácer do Sal
|
Aveia
|
litros
|
15.400
|
163.056
|
8º
|
2,7
|
Santiago do Cacém
|
Cevada
|
litros
|
59.100
|
212.280
|
10º
|
4,6
|
Alcácer do Sal
|
Grão
|
litros
|
59.700
|
48.748
|
5º
|
5,7
|
Vª Frª de Xira
|
Arroz
|
litros
|
s/d
|
s/d
|
-
|
-
|
Alcácer do Sal
|
Centeio
|
litros
|
7.600
|
773
|
19º
|
0,04
|
Grândola
|
Xíxaro
|
litros
|
18.200
|
s/d
|
-
|
-
|
-
|
Cortiça
|
quilos
|
s/d
|
1.350
|
16º
|
0,02
|
Alcácer do Sal
|
Lã
|
quilos
|
s/d
|
8.719
|
6º
|
2,4
|
Lisboa
|
Fontes:
1904 – Mapa de Produção do concelho de
Torres Vedras, da Administração do Concelho (Arquivo Histórico de Torres
Vedras - AHTV); 1916 – Estatística
Agrícola de 1916, Lx. Imprensa Nacional, 1917
Embora os dados acima
registados correspondam a fontes diversas, com critérios distintos, é possível
confirmar a importância do vinho como primeira produção agrícola do concelho. A
batata, uma produção recente no concelho, cuja importância data do início da
segunda metade do século XIX, revela-se a segunda produção mais significativa.
Produções tradicionais, como o trigo e o milho, vão perdendo peso face àquelas
duas produções. Contudo, em 1916, o conjunto dos cereais parece conhecer
uma razoável evolução produtiva,
contrastando com a quebra da produção
vinícola e de batata. Nesse mesmo ano a produção de leguminosas parece
ter conhecido igualmente um acentuado crescimento. De registar ainda o facto
de, pela primeira vez, se fazer referência à produção de cortiça e lã.
Segundo dados publicados na
referida Estatística Agrícola de 1916,
apesar da importância do vinho, o número de produtores de batata, trigo, milho
e fava era superior ao número de produtores de vinho. Contudo, enquanto a
produção de milho e trigo se destinava preferencialmente ao auto-consumo ou a
fornecer a produção local de pão, já a batata era, conjuntamente com o vinho,
destinada à exportação.
Em termos distritais (na
área do actual conjunto dos distritos de Lisboa e Setúbal), Torres Vedras
ocupava, em 1916, num total de 26 concelhos, o primeiro lugar como produtor de
vinho e feijão, o segundo na produção de batata, o terceiro na produção de
milho e lã preta e o quarto na produção de fava.
Para a produção vinícola, principal em volume de produção
e o principal produto comercializado pelo concelho, possuímos alguns dados mais
detalhados, sendo possível acompanhar o seu valor entre 1915 e 1924:
QUADRO V
Produção vinícola do concelho de Torres Vedras
(1915-1925)
ANO
|
LITROS
|
1915
|
21.833.640
|
1916
|
20.171.905
|
1917
|
18.739.099
|
1918
|
19.000.000
|
1919
|
19.128.180
|
1920
|
19.102.967
|
1921
|
23.201.230
|
1922
|
28.269.000
|
1923
|
49.105.100
|
1924
|
34.752.600
|
1925
|
37.912.100
|
Fonte: José Manuel
Carvajal Telles da Sylva, O Concelho de
Torres Vedras, a crise vinícola e a solução cooperativa – alguns subsidios para
o seu estudo, Instituto Superior de Agronomia, Lisboa, Junho de 1936,
quadro da página 36, baseado em dados dos Boletins de Estatística Agrícola .
Os dados acima registados sobre a produção vinícola do
concelho, parecem confirmar alguma crise produtiva na década de 10 do século
XX, principalmente durante a sua segunda metade, talvez como consequência da
crise comercial provocada pela 1º Guerra Mundial. Só a partir de 1921 se inicia
uma tímida recuperação dessa produção, que dispara a partir de 1923.
Podemos observar a produção agrícola usando um outro
critério, tomando agora como referência a área agrícola ocupada neste concelho
por várias culturas:
QUADRO VI
Áreas ocupadas pelas principais culturas no concelho
de T. Vedras (em hectares)- (1904 e1941-1945)
1904 (1)
|
1941-1945 (2)
|
|
VINHO
|
5760
|
11069
|
BATATA
|
1505
|
688
|
TRIGO
|
1168
|
4054
|
MILHO
|
1200
|
1440
|
FEIJÃO
|
204
|
2723
|
FAVA
|
159
|
300
|
AZEITE
|
300
|
442
|
AVEIA
|
39
|
326
|
CEVADA
|
164
|
228
|
GRÃO
|
110
|
139
|
ARROZ
|
s/d
|
16
|
CENTEIO
|
25
|
27
|
CHÍCHARO
|
74
|
s/d
|
TOTAL
|
10708
|
21452
|
FONTES: (1) Administração do Concelho - Mapa de Produção do Concelho de Torres
Vedras, 1904, AHTV.; (2) OLIVEIRA, Rogério(1951),p.202 (dados relativos à
média de produção entre 1941 e 1945)
Embora só tenha sido possível obter dados completos
sobre a ocupação das áreas agrícolas do concelho para dois períodos,
confirma-se o peso da vinha, que, no final da primeira metade do século XX,
ocupava quase metade da superfície agrícola do concelho, seguindo-se o cultivo
de batata, trigo e milho, que apesar de tudo, no seu conjunto, ocupavam menos
área que a do vinho.
José de Campos Pereira, na
sua obra publicada em 1915, baseada em dados de 1911, intitulada “A Propriedade
Rústica em Portugal”, revela dados que colocam o concelho de Torres Vedras em
primeiro lugar no distrito de Lisboa, que então incluía a área do actual
distrito de Setúbal, quer quanto à área de cultivo da vinha (21 000 hectares,
cerca de ¼ do total distrital), quer quanto ao rendimento (15 mil contos, pouco
menos de 1/3 do total distrital ) quer quanto à produção (808 500 hectolitros,
cerca de 1/3 do total distrital).
A área ocupada nem sempre
era proporcional à rentabilidade de cada produto.
Por exemplo, e consultando
as mesmas fontes, o vinho era uma das produções mais rentáveis, em relação à
superfície cultivada.
Sendo provável que parte
dessa produção agrícola fosse consumida
no concelho, o quadro seguinte
pode-nos elucidar sobre a sua
importância comercial, bem como a de outras actividade agro-pecuárias do
concelho .
QUADRO VII
Expedição da Produção agro-pecuária pelas estações de
caminho de ferro do concelho de T. Vedras (1910).
Cereais e farinhas
(Kg)
|
Legumes Verdes e Secos (Kg)
|
Vinhos e Derivados (Kg)
|
Produtos Florestais (Kg)
|
Gado (Cabeças)
|
|
Dois Portos
|
9263870 (7ª)
|
||||
Runa
|
7318516 (13ª)
|
||||
Torres Vedras
|
1130184 (29ª)
|
1538317 (10ª)
|
9946890 (6ª)
|
1131 (27ª)
|
|
Ramalhal
|
1311516 (30ª)
|
3406720 (7ª)
|
|||
Outeiro
|
915194 (16ª)
|
FONTE: Estatísticas Agrícolas - Resumo Estatístico,
Lx. Imprensa Nacional, 1914
A informação de onde retirámos estes dados é
referente à evolução dessa situação em
todas as estações ferroviárias do país, entre os anos de 1904 e 1911. Não
conhecendo, infelizmente, outras informações do género para um período
posterior, escolhemos como referência os dados do ano de 1910, o último com
dados completos sobre todos os produtos
mencionados.
À frente da quantidade
expedida, entre parênteses, colocámos a posição ocupada a nível nacional por
cada estação. Naquelas onde nada consta, não quer dizer que não tivesse havido expedição de produtos,
apenas que a sua quantidade era insignificante.
Mais uma vez o vinho surge
como um importante produto comercializado por este concelho. É igualmente
significativo o peso dos produtos florestais. Mesmo em produções menos
importantes, este concelho tinha um peso de destaque a nível nacional na sua
exportação como acontecia, e por ordem de importância, com os "legumes
verdes e secos", o “gado” e os "cereais e farinhas".
. Alimentação e recursos alimentares da
população torriense.
Uma primeira abordagem à situação alimentar do concelho no
perincípio do século XX pode ser
analisada tendo por base um inquérito elaborado pelos sub-delegados de saúde e
a outras entidades de todos os concelhos do país, em 1903, a pedido de Pedro
Dória Nazareth, para a realização de um “estudo sobre a alimentação das classes
trabalhadoras do continente de Portugal”, cujos resultados foram publicados ao
longo de vários números da revista Tuberculose durante o ano de 1909.
Em anexos publicamos os dados referentes ao concelho de
Torres Vedras e aos concelhos vizinhos.
Essas informações dariam só por si para um estudo sobre a
situação alimentar na região. Deixamos contudo a outros mais competentes do que
nós esa análise, registando apenas o facto de o valor médio das calorias
consumidas pelos trabalhadores rurais do concelho, Calorias, 4644,998, ser assinalavelmente superior às “necessidades
alimentares do homem adulto executando trabalho muscular”, que são de 4000
calorias diárias.[35]
Um outro inquérito
mais pormenorizado sobre o concelho de Torres Vedras e temporalmente
contemporâneo da época que estamos a analisar, permitiu-nos elaborar o Quadro
VIII.
Este inquérito
tinha como objectivo “reunir elementos para a coordenação dos estudos sobre os
recursos do país que, em tempo de guerra, possam ser utilizados para
subsistência e fardamento do exército, não tendo qualquer intuito tributário”.
Nos exemplares existentes no arquivo Municipal está riscada o resto da frase,
onde se lia “nem supondo tão pouco a probalidade próxima de qualquer conflito
armado”, provavelmente porque terá sido enviado em 1916 ou num dos anos
seguinte, quando Portugal já se tinha entrado na guerra.
QUADRO VIII
Inquérito aos Recursos
Alimentares do Concelho de Torres Vedras (S/D [1916 a 1918?])
S. Pedro
|
Stª Maria
|
Freiria
|
S. Pedro da Cadeira
|
|
População indicada
|
4732
|
3699
|
1954
|
4730
|
Alimentação usual dos habitantes
|
Pão, batata, peixe,
legumes e arroz
|
Pão de trigo, batata,
arroz, peixe, carne e legumes.
|
Batata, feijão, hortaliça,
couve e peixe
|
Legumes, hortaliças e carne de porco
|
Preço aproximado de uma ração cozinhada(1)
|
$ 50
|
$40
|
$160
|
$60
|
Culturas principais
|
Vinho e Batata (também Trigo, Milho, Feijão, Grão
e Fava)
|
Vinho e Batata
(também Trigo e Milho “pouco”)
|
Vinho, Batatas e alguns Cereais
(também Trigo, Milho, Cevada, Feijão, Grão, Favas,
Ervilhas)
|
Vinho, Trigo, Milho, Batatas, Legumes (Feijão e
Favas) e Hortaliças.
(Também Cevada, Aveia e Ervilhas.).
|
Importação
(produtos alimentares)
|
Arroz, Peixe e Carne
|
Arroz, Peixe e Carne
|
“Tudo à excepção do
indicado”
|
Azeite, Arroz, Centeio,
Milho e Carne de Vaca.
|
Exportação
(produtos alimentares)
|
Vinho e Batata.
|
Vinho e Batata.
|
Vinho, Batata e alguns Legumes.
|
Vinho, Trigo, Batata, Legumes e Hortaliças.
|
Espécies de farinhas fabricadas
|
Trigo e Milho
|
Trigo e Milho
|
Trigo e Milho
|
Trigo e Milho
|
Espécies de pão fabricado.
|
Trigo e Milho
|
Trigo e Milho
|
Trigo e Milho
|
Milho e “algum trigo”
|
Fonte: Inquérito do Estado
Maior do Exército, 2ª direcção, 7ª repartição, sem data (data provável : entre
1916 e 1918), dados existentes para 4 freguesias no AHMTV.
(1) – “O preço da ração
cozinhada é o da alimentação de um soldado durante um dia, quando aboletado em
casa d’um habitante medianamente remediado, e comendo as refeições usuais do
mesmo habitante”, in documento referido na fonte.
Apesar
dos dados recolhidos não incluírem todas as freguesia do concelho, abrangem
contudo um universo razoável para traçar um retracto da situação alimentar do
concelho.
Inclui
as duas freguesias sediada na vila e duas das freguesias rurais mais
importantes, Freiria e S. Pedro da Cadeira.
De
acordo com aquele inquérito podemos referir como alimentos habituais da
população deste concelho:
- o pão, embora apenas referido na alimentação
das freguesia urbanas, mas fabricado em todas;
-
a batata, referida na alimentação de todas as
freguesias, menos em S. Pedro da Cadeira;
-
os legumes e hortaliças em todas as
freguesias;
-
o arroz, apenas referido nas freguesias
urbanas;
- o peixe, sendo igualmente comum á maior parte
da alimentação na região observada, não sendo contudo referida na única das
quatro freguesias do litoral e onde existia a única comunidade piscatória do
concelho (Aseenta);
- a carne de porco é o único tipo de carne
referido e apenas na freguesia de S. Pedro da Cadeira.
Ao
que parece, a carne e o peixe seriam importados de fora do concelho, enquanto
abundava o vinho e a batata.
O
pão era fabricado do trigo e do milho, embora o pão de trigo fosse mais raro em S. Pedro da Cadeira.
A
importância do milho e do trigo na alimentação da população é evidenciada nos
dados referidos no relatório dos regedores sobre o “consumo anual das
freguesias”, datado de 1916:
QUADRO IX
CONSUMO
E PRODUÇÃO ANUAL DAS FREGUESIAS DO CONCELHO DE T. VEDRAS - 1916
Freguesia
|
Produtos
|
Para
sementeira agrícola
(em
litros)
|
Gastos
da Família (total da freguesia, em litros)
|
Para
venda para padeiros e industria local
(em
litros)
|
Total de
litros (para consumo anual da freguesia)
|
Produção
manifestada em 1916
|
Nº de
Fogos em 1916
|
Média de
gastos por fogo (anual, em litros)
|
Carmões
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
400
400
6200
|
66300
331500
|
“não gasta trigo, só farinha das fábricas”
|
400
66700
337700
|
47112
46714
86640
1956290
|
255
|
260
1300
|
Carvoeira
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
200
4000
1600
|
197000
646000
|
13000
|
200
201000
660600
|
23510
84134
77540
998500
|
540
|
364
1196
|
Cunhados
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
2000
20000
4000
|
882000
94500
|
44000
|
2000
902000
142500
|
416
116156
55402
12300
263260
|
606
|
1455
155
|
Dois Portos
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
2000
33000
65000
|
324000
648000
|
50000
100000
|
2000
407000
813000
|
145496
215630
367900
5614520
|
908
|
357
713
|
Freiria
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
900
900
1500
|
375000
66300
|
22000
|
900
375900
89800
|
98660
125228
377965
448500
|
446
|
840
1487
|
Matacães
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
42000
51000
|
429000
510000
|
10000
25000
|
481000
586000
|
39300
168658
54350
1028960
|
344
|
1247
1482
|
Maxial
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
600
4500
4500
|
450000
450000
|
44000
|
600
454500
498000
|
14
145120
202287
213350
1018200
|
618
|
728
728
|
Monte Redondo
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
300
6000
9000
|
275000
55100
|
36000
|
300
281000
100000
|
20150
15080
57480
562900
|
212
|
1297
260
|
Ponte do Rol
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
1600
3300
3400
|
468000
156000
|
36500
|
1600
471000
195900
|
100
44316
53339
27800
375600
|
274
|
1708
569
|
Ramalhal
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
800
11000
2500
|
531500
119500
|
3000
1000
|
800
545500
123000
|
200
114710
48488
65855
1180400
|
400
|
1329
299
|
Runa
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
7500
8400
|
36500
219000
|
39100
50400
|
83100
277800
|
11
41102
50265
79420
782237
|
237
|
154
924
|
Stª Maria
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
600
3400
54400
|
270000
540000
|
6000
1000
100000
|
6600
274400
694000
|
30
129830
56496
23620
1267900
|
780
|
346
692
|
S. Mamede
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
300
20000
51000
|
530000
725000
|
86000
|
300
550000
862000
|
84040
275756
661930
1172670
|
728
|
728
995
|
S. Pedro
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
500
4000
64000
|
375000
750000
|
5000
2000
200000
|
5500
381000
1014000
|
84870
320964
104430
1614708
|
1083
|
346
692
|
S. Pedro da Cadeira
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
3300
124200
71700
|
1226000
306500
|
91200
|
3300
1350000
469400
|
180963
439969
124350
353000
|
954
|
1285
321
|
Turcifal
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
500
4000
10000
|
360000
730000
|
36000
|
500
364000
776000
|
78836
145800
263470
1452960
|
720
|
500
1013
|
TOTAL
|
Centeio
Milho
Trigo
Batata
Vinho
|
6795300
6347400
|
171
1394121
2304708
2624700
20189905
|
9105
|
746
697
|
Fontes:
“Consumo anual das freguesias” – 1916, relatório dos regedores, AHMTV;
Manifestos de produção – 1916, dos regedores, AHMTV;
A fazer fé nesse dados, a produção de trigo e de milho era
manifestamente insuficiente para as necessidades médias das famílias do
concelho, mesmo nas freguesias onde aquela produção era importante.
Só em duas freguesias,
Freiria e Matacães, a produção de trigo era superior a essas necessidades.
Na maior parte dos casos o
vinho e a batata confirmam-se como as produções mais importantes, embora mais
importantes do ponto de vista comercial do que ao nível do consumo.
É ainda interessante
observar o consumo médio por família do trigo e do milho:
-
em 10 freguesias o consumo de trigo era superior ao consumo de milho;
-
o consumo de milho era superior nas restantes 6 freguesias;
-
as freguesias que consumiam mais trigo eram A Dos Cunhados, Monte
Redondo, Ramalhal e S.pedro da Cadeira;
- em todas elas a produção de trigo era pouco significativa, com a
excepção de S. Pedro da Cadeira, onde o trigo ocupava o primeiro lugar em
termos de produção;
-
em média, somando o consumo de milho com o consumo de trigo, quase
todas as freguesias ultrapassam os 1400 litros de consumo anual por família;
- onde o consumo de trigo é inferior, esse facto era compensado pelo
aumento médio do consumo de milho.
Existem quatro freguesias
onde o consumo de cereais é inferior àquela média referida em cima: Dois
Portos, Runa e as duas freguesias urbanas (S. Pedro e Stª Maria).
A razão não deverá estar
numa alimentação mais pobre, mas do facto de todas essas freguesias poderem,
pelo contrário, garantir uma alimentação mais variada, recorrendo a outros
consumos alimentares que não apenas, ou principalmente o do pão. Todas estas
freguesias tinham fácil acesso a outros consumos, já que nelas se situavam três da estações de caminho-de-ferro,
das comercialmente mais importantes do concelho.
. Da crise de subsistências à “pneumónica”.
Com os dados que temos é evidente que a situação alimentar
do concelho, sendo preocupante, não era dramática.
A grande produtividade do
concelho permitia enfrentar a crise que nesta região era fundamentalmente
comercial, através de uma economia de auto-subsistência alimentar.
Contudo, nem todos os seus
habitantes sentiram da mesma maneira os efeitos dessa situação.
Um bom barómetro para
perceber o efeito da escassez alimentar sobre a população foi a maior ou
menor imunidade biológica revelada pelo efeito da “pneumónica” entre os
habitantes desta região.
Segundo Oliveira Marques[36] um dos motivos para a
eclosão das grande epidemias de 1918-1919, com destaque para a pneumónica, foi
o “estado débil dos organismos entre as classes pobres”, as “mais afligidas
pela escassez e penúrias dos géneros de primeira necessidade”.
A primeira vaga de epidemias
registou-se entre Junho e Julho de 1918, entrando rapidamente em declínio e
tendo um impacto pequeno. Mas uma segunda vaga iniciou-se nos arredores do
Porto em Agosto, disseminando-se lentamente durante os meses seguintes,
atingindo o sul e o seu clímax em Outubro, continuando a fazer sentir o seu
efeito até Dezembro de 1919.
Em Torres Vedras a doença
“começou a fazer-se sentir nos lugares situados ao norte do concelho”,
propagando-se “assustadoramente” a todo o concelho, provocando “grande miséria”
nos lugares “onde a epidemia tem feito mais estragos”, pelo que se aguardava “a
vinda de algum açúcar, cuja falta é enorme”, ao que parece por ser necessário
para o fabrico de remédios farmacêuticos. Foi igualmente criado um hospital
provisório “para os doentes atacados de epidemia”.[37]
Neste concelho o período
mais crítico decorreu entre 27 de Setembro e 31 de Outubro de 1918, obrigando
ao encerramento de estabelecimentos e paralisando momentaneamente a vida
política, social e económica de Torres Vedras.
Durante esse período
morreram no país 31785 pessoas, sendo a região de Lisboa uma das mais
atingidas. Em Torres Vedras morreram 861 pessoas, numa percentagem de 2,2% da
sua população, tomando como referência os censos de 1911, percentagem
ligeiramente inferior, 2,1%, se a base de referência for a população do
concelho em 1916 segundo dados não oficiais.
Em termos nacionais e apenas
em relação àquele período, a epidemia matou cerca de 0,6% da população
nacional.
Torres Vedras registou assim
uma mortalidade quase quatro vezes superior à média nacional.
QUADRO X.
População
por Freguesias (1911-1916-1920)- e mortalidade
na “Pneumónica”(Set.-Out.1918)
Freguesia
|
1911
|
1916
|
1920
|
Mortos 1918
(pneumónica)
|
% vítimas
(em relação à pop. de
1916)
|
A Dos Cunhados
|
2866
|
2998
|
3386
|
82
|
2,74
|
Carmões
|
1094
|
1145
|
1157
|
22
|
1,92
|
Carvoeira
|
2112
|
2185
|
2137
|
19
|
0,87
|
Dois Portos
|
3964
|
3943
|
4186
|
82
|
2,08
|
Freiria
|
1861
|
2004
|
2018
|
29
|
1,45
|
Matacães
|
1389
|
1919
|
1346
|
18
|
0,94
|
Maxial
|
2731
|
2632
|
2660
|
69
|
2,62
|
Monte Redondo
|
854
|
896
|
864
|
17
|
1,90
|
Ponte do Rol
|
1258
|
1303
|
1318
|
26
|
2,00
|
Ramalhal
|
1737
|
1802
|
1923
|
67
|
3,71
|
Runa
|
1091
|
1120
|
992
|
22
|
1,96
|
S. Pedro da Cadeira
|
4509
|
4736
|
4968
|
91
|
1,92
|
Turcifal
|
2919
|
3021
|
2829
|
56
|
1,85
|
Ventosa
|
3332
|
3463
|
3762
|
35
|
1,01
|
S. Pedro e Santiago
|
4425
|
4622
|
4699
|
||
Stª Maria e S. Miguel
|
3504
|
3668
|
3714
|
||
“Vila” (S. Pedro + Stª Maria)
|
226
|
2,73
|
|||
TOTAL
|
39646
|
41457
|
41959
|
861
|
2,08
|
Fontes: 1911 e 1920 –
Censos; 1916 – informação prestada pelos regedores; dados da “pneumónica” – “Vinha
de Torres Vedras” de 21 de Novembro de 1918.
Como podemos ver no Quadro X
o impacto da pneumónica não foi o mesmo em todas as freguesias do concelho.
Como é óbvio, a vila foi das
mais afectadas pela propagação da doença e pelo seu efeito, situação que se
ficou a dever, não só à facilidade de propagação num meio urbano, servido de
transportes, com uma actividade comercial assinalável, mas também porque nele
estavam centralizados os principais serviços de saúde (hospital, lares, etc.).
Outras três freguesias
destacaram-se pela elevada mortalidade, quer em termos numéricos quer em termos
percentuais:
-
Ramalhal, com 67 mortos, 3,71%
da sua população;
-
Maxial, com 69 mortos, 2,62% da sua população;
-
Dois Portos, com 82 mortos, 2,08% da sua população.
A freguesia de Ponte do Rol,
embora tivesse contado com um reduzido número de óbitos, 26, mercê da sua
reduzida base demográfica, obteve uma percentagem elevada, 2%.
Pelo contrário, a freguesia
de S. Pedro da Cadeira, apesar de ter registado o maior número de falecimentos
a seguir à vila, 91 mortos, registou uma percentagem baixa, devido á sua enorme
base demográfica.
As freguesias que no
concelho registaram a mais baixa percentagem de mortalidade foram as freguesias
da Carvoeira (0,87%), Matacães (0,94%) e Ventosa (1,01%).
Não deixa de ser
significativo o facto de três das quatro freguesias rurais onde existiam
estações ferroviárias terem sido das mais atingidas (Ramalhal, Maxial – estação
do Outeiro da cabeça - e Dois Portos).
A situação nestas três
freguesias mereceu mesmo a atenção da imprensa nacional. Para o Ramalhal e o
Maxial(designado “Ameixial”) a “Obra de Assistência 5 de Dezembro” enviou, em
finais de Outubro, açúcar, arroz e medicamentos “para as famílias atacadas pela
gripe pneumónica”.[38]
Referindo-se à situação em
Dois Portos, podia ler-se que aí grassava a epidemia com “terrível
intensidade”, morrendo muitos dos seus habitantes “sem assistência médica e à
míngua de recursos de toda a natureza, pois que tudo falta, pão, arroz, açúcar,
petróleo, medicamentos”.[39]
Quanto àquelas que registaram uma mortalidade mais baixa
tinham em comum o facto de o consumo médio de trigo, por parte dos seus
habitantes, ser sempre superior ao consumo de milho, rondando o consumo daquele
cereal mais de 900 litros por habitante (995 litros na Ventosa, 1196 na
Carvoeira e 1482 em Matacães).
Curiosamente e por
contraste, as freguesias onde se registou uma maior percentagem de óbitos em
relação à sua população eram as que apresentavam os níveis mais baixos de
consumo de trigo por família, abaixo dos 800 litros (Ramalhal, 299 litros; Dois
Portos, 713; Maxial, 728).
Os outros dois casos que
referimos, Ponte do Rol e S. Pedro da Cadeira, estavam igualmente entre as
freguesias que registavam menores níveis de consumo de trigo (S. Pedro da
Cadeira com 321 litros e Ponte do Rol com 569 litros).
Conclusão
Em Torres Vedras a crise das subsistências provocada pela
Primeira Guerra fez-se sentir de forma diferente entre a sua população.
A população rural, que vivia
principalmente da produção agrícola, queixava-se principalmente do preço dos
meios de produção e das limitações á exportação e comercialização dos seus
produtos.
A população urbana, constituída
maioritariamente por assalariados ligados às actividades não agrícolas,
queixava-se principalmente da subida dos preços dos géneros de primeira
necessidade, do açambarcamento dos comerciantes e da má qualidade do pão
fabricado.
Por sua vez os comerciantes queixavam-se do tabelamento dos preços e, no
caso dos padeiros, da falta de matéria prima.
Em relação á situação
alimentar da população torriense, não se terão registado situações de fome
extrema, já que funcionava uma economia de auto-subsistência, pelo menos no
meio rural.
De qualquer modo, a
instabilidade alimentar provocada pela falta pontual ou continuada de
determinados géneros alimentares facilitou a rápida disseminação da pneumónica
em 1918, com as consequências trágicas que se conhecem, tendo sido este
concelho um dos mais atingidos.
Esperamos com esta
comunicação ter contribuído para ajudar a esclarecer como se viveu em Torres
Vedras a grande crise de subsistências dos anos finais da década de 10 do
século XX.
Venerando António Aspra de
Matos
(texto apresentado nos encontros de História Local TURRES VETERAS X de 2006 e editado nas actas, publicadas em 2007)
(texto apresentado nos encontros de História Local TURRES VETERAS X de 2006 e editado nas actas, publicadas em 2007)
ANEXO
Inquérito à alimentação das Classes Trabalhadoras do
Continente de Portugal – dados referentes a Torres Vedras e aos concelhos
Vizinhos
CONCELHO:
|
Ração Alimentar diária de um adulto
-média-
|
Salários médios cobrados por um dia útil
de trabalho
(em réis)
|
Duração média do trabalho útil diário
(em horas)
|
Observações
|
Alenquer
(“resumo de três questionários”)
|
Em géneros: Pão de milho
ou trigo, 1:000 gr. – Legumes secos, 125 gr. – Legumes verdes, 250 gr. –
Batatas, 500 gr. – Peixe salgado, 100 gr. – Carne de porco (toucinho), 150
gr. – Azeite, 50 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
168,40 gr. – Hydratos de carbono, 681,40 gr. – Gorduras, 83,88 gr. – Sais,
37,63 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 3821,386.
Valor da ração em moeda:
160 réis
|
Homem: 340
Mulher: 180
Criança: 100
|
9
|
“A população agrícola do concelho é, na sua
generalidade, robusta e muito resistente, apesar de não serem raros os abusos
do álcool sob a forma de vinho, que nesta região é muito barato.
“Habitualmente tomam três refeições por
dia; o almoço, às 9 horas da manhã, composto de pão e toucinho ou pão e
sardinha; o jantar, à 1 hora da tarde, igual ao almoço, e a ceia, que comem
ao recolher a casa, composta de sopa de legumes e toucinho ou pão.
“No verão há ainda, às 4 horas da tarde a merenda
de pão e fruta ou só de fruta”.
|
Arruda dos Vinhos (“resumo de um
questionário”)
|
Em géneros: Pão de milho
– Sardinha, sarda ou cavala – Carne de porco – Hortaliça – Batata – Azeitonas
– Queijo de ovelha (1)
Valor da ração em moeda:
160 réis
|
Homem: 200 a 700 réis
Mulher: 160 a 300 réis
Criança: 100 réis
|
9
|
(1) “Sobre a quantidade de alimentos, apenas informa como se segue o
questionário : “Um adulto come habitualmente por dia 4 ou 5 sardinhas, ou 1
queijo de preço de 30 réis e uma tigela de sopas ou migas. Uma criança
contenta-se com duas sardinhas e a mesma tigela de sopas””.
###
“Os habitantes d’este concelho são, na sua
grande maioria, robustos e resistentes, não abusando em geral do álcool.
“Geralmente comem: ao almoço pão e
sardinhas, queijo ou azeitonas; ao jantar, sopas ou migas com toucinho ou
sardinha, e à ceia o mesmo do jantar.
“de verão têm ainda a merenda,
composta de pão e fruta”.
|
Cadaval
(“resumo de um questionário”)
|
Em géneros: Pão de milho,
1:000 gr. – Legumes secos, 125 gr. – Legumes verdes, 500 gr. –Peixe salgado,
100 gr. – Toucinho, 100 gr., ou azeite, 50 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
165,11 gr. – Hydratos de carbono, 597,40 gr. – Gorduras, 92,83 gr. – Sais,
44,38 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 3718,3863.
Valor da ração em moeda:
140 réis
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Homem: 240 (1)
Mulher: 120
Criança: 120
(1) “Nas épocas de
grandes actividades agrícolas, o salário elava-se até 500 réis diários”
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9
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“Os habitantes
do concelho são regularmente robustos e resistentes, não abusando do álcool.
“Geralmente tomam três refeições por dia;
duas são constituídas por pão e peixe e uma por sopa de legumes, temperada
com azeite ou toucinho”.
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Caldas da Rainha
(“resumo de um questionário”)
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Em géneros: Legumes secos
e verdes – Batatas - Pão de milho - Peixe salgado e Carne de porco (1)
Valor da ração em moeda:
120 réis
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Homem:360
Mulher: 180
Criança:100
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10
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(1)“o único questionário, que consegui obter neste concelho, refere apenas
a quantidade de pão que entra na ração diária (1:000 gr.) e de peixe salgado
(4 sardinhas); com relação ao uso de carne diz: “Os que podem criam e matam
um porco, que governam para todo o ano, seja qual for o número de indivíduos
da família. De ordinário, comem carne apenas nos dias festivos, observando
sempre regras de parcimónia””.
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“São robustos e sobretudo resistentes os
habitantes d’este concelho, entre os quais só muito excepcionalmente se
encontram casos de alcoolismo, posto que usem bastante vinho.
“Em geral tomam três refeições diárias,
sendo a primeira e a segunda compostas de pão de milho e peixe salgado, e a
terceira de caldo de legumes e batatas”
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Lourinhã
(“resumo de um questionário”)
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Em géneros: Pão de milho,
1:000gr. – Legumes secos, 125 gr. – Legumes verdes, 250 gr. – Batatas,
1500gr. – Peixe salgado, 200 gr. – Toucinho, 60 gr. – Azeite, 50 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
230,39 gr. – Hydratos de carbono, 886,05 gr. – Gorduras, 120,37 gr. – Sais,
67,59 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 5326,309.
Valor da ração em moeda:
160 réis
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Homem: 300
Mulher: 150
Criança: 160 “dos 14 anos
em diante”
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9
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“São em geral
robustos e resistentes os habitantes d’este concelho, apesar de se darem
bastante a bebidas, sobretudo àgua-pé,
de que em média ingerem por dia mais de quatro litros.
“Usualmente tomam três refeições por dia,
comendo ao almoço batata cozida com peixe salgado e pão de milho; ao jantar,
feijão cozido com hortaliça ou batata, toucinho e pão de milho, e à ceia
batatas cozidas com peixe salgado e pão de milho”.
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Mafra
(um questionário)
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Em géneros: Pão de Trigo
ou milho – Feijão, Hortaliça – Bacalhau, Atum, Sardinha – Toucinho – Queijo
Branco (1)
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Homem: 300
Mulher: 200
Criança: 100
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9
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(1) “Este questionário, que me foi enviado pela câmara municipal, responde
aos dois quesitos sobre quantidades de substâncias alimentares e sobre os
seus preços, com a palavra “Ignoro”, acrescentando, pelo que se refere ao
primeiro, “estou certo que se alimentam sufficientemente”.
###
“Os habitantes
do concelho são regularmente robustos
resistentes, não sendo no geral dados a abusos de álcool sob qualquer
fórma.
“Habitualmente comem: ao almoço pão e
queijo branco, ou pão e sardinha; ao jantar sopas de pão com hortaliça e toucinho
e à ceia sopa de hortaliça e pão”.
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Óbidos
(“resumo de um questionário”)
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Em géneros: Pão de milho,
1:000 gr. – Legumes secos, 125 gr. – Legumes verdes, 500 gr. – Batatas,
500gr. – Peixe salgado, 100 gr. – Azeite, 50 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
163,30 gr. – Hydratos de carbono, 699,25 gr. – Gorduras, 82,24 gr. – Sais,
42,80 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 4008,770.
Valor da ração em moeda:
180 réis
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Homem: 350
Mulher:
160
Criança:
120
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9
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“ A maioria da população é robusta e
resistente, não sendo numerosos os indivíduos que abusam do álcool, comquanto
seja frequente o hábito de, em jejum, matarem o bicho, com meio
decilitro de aguardente”.
###
“De inverno tomam três refeições: o almoço,
composto de pão, batatas e sardinha; o jantar, de sopa de legumes, pão e
peixe salgado; e a ceia de pão e peixe. No verão comem em geral mais uma vez,
à merenda, pão e peixe”.
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Peniche
(“resumo de seis questionários”)
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Em géneros: Pão de trigo,
250 gr. – Pão de milho, 800 gr. – Legumes secos, 200 gr. – Legumes verdes,
250 gr. – Batatas, 300 gr. –Peixe fresco, 750 gr. – Carnes verdes (uma vez
por semana), 100 gr. – Azeite, 150 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
248,36 gr. – Hydratos de carbono, 711,93 gr. – Gorduras, 107,40 gr. – Sais,
38,13 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 4597,812.
Valor da ração em moeda:
200 réis
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Homem:
300
Mulher:
200
Criança: “não são
utilizadas”
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9
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“Os
trabalhadores rurais, neste concelho, são em geral bastante resistentes,
embora a sua robustez não seja grande”.
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“Habitualmente, tomam três refeições
diárias: o almoço, composto de pão, peixe e batatas; o jantar, de pão e sopa
de legumes e hortaliças e a ceia de pão, peixe e batatas. Usam bastante de
vinho, muito alcoolicos, e da aguardente, não sendo raros os que não só usam,
mas abusam do álcool”.
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Sobral de Monte Agraço
(um questionário)
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Em géneros: Pão de milho
– Legumes secos e verdes – Batatas – Peixe salgado – Azeite – Carne de porco
salgado (1)
Valor da ração em moeda:
150 réis
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Homem: 300
Mulher: 160
Criança: 80
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9
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(1) “Sobre quantidades se substâncias alimentares, limita-se o informador
a dizer : “Pão devem comer um kilo a kilo e meio e tudo o mais em muita
pquena quantidade, com como conducto”.
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“São na sua grande maioria, robustos e
resistentes os habitantes d’este concelho, embora não sejam raros os que
abusam de álcool, sobretudo aos domingos e dias santificados. É também
frequente o costume de em jejum matarem o bicho com aguardente.
“De inverno, é costume almoçarem açorda ou
pão e peixe, jantarem sopas de legumes, temperadas de azeite ou toucinho, e
pão com peixe e cearem sopas iguais às do jantar. No verão, além d’estas três
refeições, costumam ainda tomar a merenda, que se compõe de pão e
conducto”
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Torres Vedras
(um questionário)
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Em géneros: Pão de milho,
1:000 gr. – Legumes secos, 125 gr. – Legumes verdes, 250 gr. – Batatas, 1:000
gr. – Peixe salgado, 60 gr. – Azeite, 50 gr.- Toucinho, 50 gr.
Em composição elementar: Albuminoides,
154,51 gr. – Hydratos de carbono, 784,25 gr. – Gorduras, 119,48 gr. – Sais,
46,69 gr.
Em energia potencial :
Calorias, 4644,998.
Valor da ração em moeda: 200
réis
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Homem: 320
Mulher: 170
Criança: 130
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9
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“A grande
maioria dos habitantes d’este concelho são robustos e resistentes, embora
sejam frequentes os abusos do álcool, sob a forma de água-pé, vinho e
aguardente.
“Em geral os trabalhadores tomam, antes de
começar o trabalho, pão e meio decilitro de aguardente a que chamam o beberete;
depois, ás 8 horas da manhã, almoçam pão e peixe salgado com batatas; ao meio
dia jantam uma tigela, de litro, cheia de sopa, feita de hortaliça, as mais
das vezes com feijão, outras com grão de bico, massas ou abóbora, um pedaço
de toucinho ou linguiça, pão e fruta; à noite ceiam feijão, temperada no
prato com azeite e vinagre, substituído às vezes por arroz ou massa com
feijão ou grão de bico e pão. No verão há ainda a merenda a que comem
pão e azeitona ou queijo fresco.
“ A todas as refeições tomam vinho ou
água-pé, de que ainda usam nos intervalos das refeições”
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Fonte: Pedro Dória Nazareth, “Estudo Sobre a
Alimentação das classes trabalhadoras do continente de Portugal”, in Tuberculose, Nº 19, 4º ano, 1909 e seguintes (com base em
inquéritos enviados a todos os sub-delegados de saúde dos concelhos em 1903,
que voltou a enviar para os presidentes de Câmara, recorrendo ainda à opinião
de pessoas conhecidas – médicos, lavradores e industriais, obtendo um total de
540 respostas sobre 256 concelhos do país).
[1] Ler, a propósito deste
tema, TEIXEIRA, Nuno Severiano, O Poder e a Guerra . 1914-1918,
ed. Estampa, Lisboa 1996.
[2] A Vinha de Torres
Vedras, 30 de Setembro de 1915.
[3] Arquivo Municipal de
Torres Vedras, Correspondência expedida pelo Administrador do Concelho
para o Governador Civil (1914- 1916), 20 de Novembro de 1915.
[4] A Vinha de Torres
Vedras, 11 de Abril de 1918.
[5] A Vinha de Torres
Vedras, 11 de Outubro de 1917.
[6] A Vinha de Torres
Vedras, 14 de Fevereiro de 1918. Ainda sobre este caso, consulte-se,
igualmente, as edições deste periódico de 27 de Dezembro de 1917 e 24 de
Janeiro de 1918.
[7] Arquivo Municipal de
Torres Vedras, Livro nº39 das Actas da Câmara( 1916-1920), sessão
extraordinária de 24 de Agosto de 1918.
[8] Arquivo Municipal de
Torres Vedras, Livro nº39 das Actas da Câmara( 1916-1920), sessão
10 de Julho de 1918.
[9] TELO, António José, .... ,
pp. 123 a 170, in António REIS (dir.), Portugal Contemporâneo,
vol. pp. 145 e 146.
[10] TELO, António José, ,
.... , pp. 123 a 170, in António REIS (dir.), Portugal Contemporâneo,
vol. p. 145 .
[11] A Vinha de Torres
Vedras, 25 de Fevereiro de 1915.
[12] A Vinha de Torres
Vedras, 24 de Junho de 1915.
[13] A Vinha de Torres
Vedras, 4 de Maio de 1916.
[14] A Vinha de Torres
Vedras, 30 de Novembro de 1916.
[15] A Vinha de Torres
Vedras, 10 de Maio de 1917.
[16] A Vinha de Torres
Vedras, 2 de Maio de 1918.
[17] A Vinha de Torres
Vedras, 21 de Fevereiro de 1918.
[18] A Vinha de Torres
Vedras, 7 de Novembro de 1911.
[19] A Vinha de Torres
Vedras, 7 de Junho de 1917.
[20] A Vinha de Torres
Vedras, 2 de fevereiro de 1916.
[21] Arquivo Municipal de
Torres Vedras, Correspondência expedida pelo Administrador do Concelho
para o Governador Civil (1917), 28 de Fevereiro de 1917.
[22] Arquivo Municipal de
Torres Vedras, Livro nº39 das Actas da Câmara( 1916-1920), sessão
28 de Maio de 1917 .
[23] A Vinha de Torres
Vedras, 23 de Agosto de 1917.
[24] A Vinha de Torres
Vedras, 28 de Setembro d 1916.
[25] A Vinha de Torres
Vedras, 20 de Setembro de 1917.
[26] A Vinha de Torres
Vedras, 23 de setembro de 1915.
[27] A Vinha de Torres
Vedras, 11 de Maio de 1916.
[28] A Vinha de Torres
Vedras, 25 de Abril de 1918.
[29] A Vinha de Torres
Vedras, 13 de Abril de 1916.
[30] A Vinha de Torres
Vedras, 28 de Setembro de 1916.
[31] A Vinha de Torres
Vedras, 3 de Fevereiro de 1916.
[32] A Vinha de Torres
Vedras, 11 de Maio de 1916.
[33] A Vinha de Torres
Vedras, 6 de Janeiro de 1916.
[34] A Vinha de Torres
Vedras, 2 de Março de 1917.
[35] LALANNE, Raymond, A
Alimentação Humana, edição ITAU, Lisboa 1970, (4ª edição de 1974),
nomeadamente, pág.56
[36] MARQUES, A . H. de
Oliveira Marques, História da 1ª República Portuguesa – As Estruturas de
Base, Iniciativas Editoriais, [1978], Capítulo I – “A População”, pp. 1 a 48.
[37] O Século,
10 de Outubro de 1918.
[38] O Século,
de 23 de Outubro de 1918.
[39] O Século,
30 de Outubro de 1918.
Mais um estudo importante para a realidade torriense! Obrigada pela partilha, Venerando!
ResponderEliminarMC
Muito bom!
ResponderEliminarBela base de trabalho.
Obrigado.