1 - Breve história da primeira Escola do Ensino Secundário em Torres
Vedras.
Local onde funcionou a primeira Escola Secundária de T.Vedras (1890 a 1903)
Foi em 1880 que se publicou uma reforma de ensino, da autoria de José
Luciano de Castro, na qual era referida a criação de “escolas municipais
secundárias”. Até então o ensino secundário era ministrado apenas nas capitais
de distrito.
A partir de então passaram a existir três tipos de escolas desse tipo,
“liceus nacionais centrais”, “liceus nacionais” e “escolas municipais secundárias”.
Os “Liceus nacionais centrais” estavam sediados em Lisboa, Porto e
Coimbra e eram os únicos onde se leccionava
o curso complementar de seis anos ( quatro de curso geral, com oito
disciplinas, duas por ano, e dois anos de curso complementar, com cinco
disciplinas anuais). Os “liceus nacionais” estavam sedeados nas restantes
capitais de distrito. Apenas leccionando
os quatro anos do curso geral. As “escolas municipais secundárias”
leccionavam apenas os dois primeiros anos do Curso Geral (1).
Na sequência dessa reforma, a Câmara Municipal de Torres Vedras pediu
autorização para criara um escola de ensino secundário, requerimento concedido
por portaria de 6 de Fevereiro de 1890, nos seguintes termos:
“Attendendo ao que me representou a Câmara Municipal da villa de Torres
Vedras, pedindo a creação de uma escola municipal secundária na sede do
conselho, na qual se ensinem as línguas portuguesa, franceza e inglesa,
geographia e desenho, regidas por dois professores, cada um como ordenado
annual de 400$000 réis.
“Considerando que a câmara requerente se obriga a contribuir com
600$000 réis para os ordenados dos professores, além de 300$000 réis para
acquisição de mobília e objectos de ensino, 50$000 réis para gratificação do
professor que exercer as funções de director, e mais 90$000 réis para
vencimento do porteiro da escola, perfazendo a quantia de 1.040$000 réis em
cada ano.
“Considerando que a mesma Câmara offerece, para estabelecimento e
exercício da mesma escola um edifício adequado ao fim que se destina e a
mobília e utensílios necessários;
“(…) Hei por bem decretar o seguinte:
“1ª É creada na villa de Torres Vedras uma escola municipal secundária,
nos termos requeridos pela câmara municipal da mesma villa.
“2ª O provimento dos lugares de professor será feito pelo Governo.
“3º As alunos que pretendem frequentar a escola pagarão, em cada anno,
de propina de matricula e exame, a quantia de 2$500 réis.
“O presidente do conselho de ministros, ministro e secretário de estado
de negócios do reino, assim o tenha entendido e faça executar. Paço de Belém,
em 6 de Fevereiro de 1890 – Rei – António de Serpa Pimentel” (2).
Criada a escola, os preparativos para o lançamento do primeiro ano
lectivo levaram ainda vários meses, quer pela necessidade de contactar professores,
quer para preparar as instalações.
A escola ficou instalada nos paços do concelho “na sala onde estava o
tribunal, no andar nobre dos paços do concelho, passando as sessões judiciaes a
celebrar-se no seu novo aposento do edifício da Graça (…)” (3).
Por portaria de 30 de Junho de 1890 eram finalmente nomeados os dois
professores para leccionar na escola: João José Esteves, nomeado director e
professor nas disciplinas de língua portuguesa, geografia e desenho, e Jerónymo
Martins Pamplona Corte Real, professor de língua francesa e inglesa.
As matriculas estiveram abertas aos jovens torrienses entre 20 de
Setembro e 4 de Outubro de 1890.
Ainda segundo os dados do jornal “A Semana”, os alunos matriculados
distribuíram-se do seguinte modo:
Português – 14 alunos;
Francês – 13 alunos;
Desenho – 10 alunos;
Geografia – 1 aluno;
Inglês – nenhum.
A sessão de abertura decorreu em 9 de Outubro de 1890 e as aulas
começaram no dia seguinte.
Em finais de Janeiro de 1891 a Câmara Municipal aprovou por unanimidade
um pedido ao governo para transformar a escola secundária em liceu. Contudo, o
pedido não foi atendido, pois, quando do seu encerramento em 1903, continuavam
a leccionar apenas dois professores, o doutor Silvino Simões, sacerdote formado
em letras que tinha substituído o primeiro director, e o professor Pamplona
Corte Real que se mantinha no seu posto desde a fundação da escola.
À data do encerramento desta primeira tentativa de estabelecer uma
Escola Secundária em Torres Vedras, a escola era frequentada pelos seguintes
alunos: Carlos Manuel das Neves Barateiro, Francisco Teixeira, Henrique Maria
Pedreira Vilela, José Maria Fialho de Carvalho, Leandro Teófilo da Cunha,
Afonso Avelino Pedreira Vilela, Alberto Gomes Pedreira, António Casimiro Roque,
Asdrúbal José Rodrigues da Silva, César António Maximino de Sant’Ana, António
do Patrocínio Martins, João Rodrigues, Joaquim Ferreira da Encarnação, Joaquim
Augusto Santos, Virgílio da Conceição Costa, António Manuel Freira Nunes,
Absinto Ramires Ferreira Nobre, António dos Santos Vaquinhas, Francisco José
Cláudio júnior, Francisco Maria Fialho de Carvalho, Joaquim José Paiva, José
Augusto Guimarães Pinheiro, José Augusto de Almeida Trigueiros, José Henriques
dos Santos, Joaquim António Rodrigues, Raúl Avelino Cardoso, Sabino Galrão,
Victor Cesário da Fonseca, José Manuel da Fonseca, Guilherme Elias das Chagas,
José Joaquim Pinto Monteiro, José Tito dos Santos (4).
Quais as razões que levaram os vereadores da câmara de Torres Vedras a
pedir, em 1903, a extinção desta primeira escola secundária do concelho? A
mesma pergunta foi feita pelo professor José Carvalho Mesquita, numa palestra
proferida na sessão solene comemorativa da abertura das aulas da escola
comercial António Augusto Cabral em 13 de Novembro de 1944:
“Alegava-se que a escola tinha fraca frequência. Não era bastante o
argumento. O que a câmara devia fazer era procurar aumentar o número dos seus
alunos. Sempre o mesmo critério estreito da pretensa economia. É preciso
atender, sempre, a que a seara do ensino é, de todas, a mais ingrata. Atira-se
a semente à terra e só anos volvidos, consumidas as energias dos semeadores é
que a semente germina e acaba por frutificar” (5).
Mais incisiva foi a explicação dada por Victor Cesário da Fonseca, uma
das vítimas daquela polémica decisão. Para ele, tal atitude ficou a dever-se à
“influência Vesga e retrograda dos políticos de então”, e recordava mesmo “um
diálogo conversado entre dois “luminares” torreenses que, na vida política da
terra, desempenhavam então lugares importantes (um era o presidente da câmara,
outro o chefe político progressista).
“Conversavam os dois à porta da Farmácia Cézar Simões, e este diálogo
foi ouvido por quem no-lo contou. Dizia um
: “NADA, NADA! É PRECISO ACABAR COM A ESCOLA ( a que fecharam em 1903)
SE NÃO ELES DAQUI A POUCO SABEM MAIS DO QUE NÓS” . A que o outro respondeu: “E
NÓS PARA GANHAR ALGUM VINTÉM NÃO PRECISAMOS DA ESCOLA”. Pudera, eram burros,
egoístas e ignorantes (…)” (6).
E foi assim a curta história da primeira escola secundária de Torres
Vedras.
Apesar de todas as contrariedade desses primeiros tempos, a semente
ficou e, após o advento da República, voltou-se a relançar o ensino secundário
no concelho, inaugurando-se em definitivo uma escola municipal secundária em
1919, há cem anos.
Esta foi oficialmente inaugurada em 3 de Novembro de 1919, funcionando
na Travessa da Olaria, da qual é herdeira a actual Escola Secundária Madeira
Torres.
Mas esta é outra história que ainda está por contar.
Deixamos aqui alguns apontamentos para a construção desta história:
2 - A segunda Fundação da Escola Secundária Municipal – Breves apontamentos.
(ao fundo à esquerda, edifício onde funcionou, entre 1921 e 1984, a 2ª Escola Secundária de T.Vedras, inaugurada em 1919)
Em 1918 Victor Cesário da Fonseca, que tinha frequentado a escola
encerrada em 1903, republicano activo, e que sempre responsabilizou os
monárquicos locais pela decisão daquele encerramento, iniciou uma campanha, nas
páginas do jornal “Ecos de Torres” em defesa de se retomar o funcionamento de
uma Escola Secundária.
Em sessão camarária de Abril de
1919 o vereador José Anjos da Fonseca propôs o lançamento de um imposto de 5% sobre
as contribuições pagas pelas freguesias do concelho, proposta aprovada apenas pela
diferença de um voto (7) , constituindo-se uma comissão instaladora que levou o
projecto a bom termo.
Dessa comissão fizeram parte Afonso Pedreira Vilela, João Fernandes
Caldeira, Victor Cesário da Fonseca, Joaquim Rodrigues Cardoso e António
Germano Marques de Carvalho.
A nova Escola Secundária foi inaugurada em 3 de Novembro de 1919,
provisoriamente num edifico da Travessa da Olaria, mudando-se em definitivo
para o edifício localizado na Avenida 5 de Outubro, onde funcionam actualmente
os serviços camarários, em 1921, edifício que então tinha apenas um andar.
Foi nomeado como seu primeiro director o professor Augusto do
Nascimento Gonçalves, até então director do Instituto Politécnico de Torres
Vedras.
Até 1923 os alunos não pagavam propinas.
No primeiro ano lectivo, o de 1919/1920, inscreveram-se 56 alunos, 26
no 1º ano, 12 no 2º ano, 6 no terceiro, 4 no 4º ano e 8 no 5º ano, entre eles
algumas alunas, 15 no 1º ano, 2 no 3º ano e uma no 5º ano.
Entre os inscritos encontramos nomes que vieram a ser figuras
proeminentes na vida cultural, social, económica e política de Torres Vedras :
Alberto Vieira Jerónimo ou Galileu Silva, inscritos no 1º ano; Amílcar
Guerreiro, Hélder dos Santos Torres, Inácio do Nascimento Clemente, José
Hipólito e Manuel Duarte Capote, no 2º ano ou Leonel Trindade no 5º ano (9).
Em 1970, por ocasião do cinquentenário, e após intensa campanha iniciada
no ano anterior nas páginas do jornal “Badaladas”, a Escola Secundária, tornou-se
secção do Liceu Nacional D. Pedro V, deixando de ser o município a suportar financeiramente
essa escola, o que permitiu uma redução das propinas pagas pelos alunos.
Contava nessa data com 19 professores e cerca de 400 alunos.
Em 12 de Outubro de 1971 o Conselho de Ministros aprovou um decreto que
criou 21 liceus nacionais, entre os quais o de Torres Vedras, passando a escola
secundária a denominar-se desde 1972 Liceu Nacional de Torres Vedras, abrindo
uma secção na Lourinhã (8).
Foi assim, no início da década
de 70 do século passado, que o “liceu” deixou
de ser a escola elitista que tinha sido, para se “democratizar” e abrir à
população que até aí tinha como única saída para os seus filhos o ensino
técnico ou comercial, muito também devido à chamada reforma Veiga Simão,
situação que levou a um grande aumento do número de alunos a frequentá-la.
No ano lectivo de 1971/1972 era frequentada por cerca de 54º alunos. No
ano lectivo de 1973/1974 já a frequentavam mais de 800 alunos, ultrapassando o
número de mil alunos nos anos seguintes.
Depois do 25 de Abril de 1974, passou a designar-se Escola Secundária
nº2 e , em 2 de Abril de 1987, passou a designar-se Escola Secundária Madeira
Torres, três anos depois de ter mudado para novas instalações, aquelas onde
ainda hoje funciona, a sul do Hospital.
(NOTA: A primeira parte deste texto teve origem num conjunto de trabalhos da minha
autoria, editados nas páginas do
Badaladas em 1990, com o objectivo de historiar a origem da Escola
Secundária Henriques Nogueira. Neste caso baseá-mo-nos no texto “O Nascimento do
Ensino Secundário em Torres Vedras”, publicado por nós neste semanário em 30 de
Março de 1990. Em 1997 foi publicado um estudo mais elaborado, melhor
documentado e mais completo da autoria
da Drª Cecília Travanca, nas páginas do nº 6 da revista “Torres
Cultural” (pp.48 a 55), intitulado “Primórdios do Ensino Secundário em Torres
Vedras”).
(1)
–
CARVALHO, Rómulo de, História do Ensino em Portugal, Fundação Calouste
Gulbenkian, 1986;
(2)
– A
Semana, nº 155, 13 de Fevereiro de 1890;
(3)
– A
Semana, nº 164, 17 de Abril de 1890;
(4)
– [CUNHA, Dr. João Carlos],“Cinquentenário da
Escola Secundária Municipal – Recordar é viver”, in Badaladas nº 706 de 5 de
Julho de 1969;
(5)
–
MESQUITA, José Carvalho, História do Ensino Secundário em Torres Vedras, 1969;
(6)
–
FONSECA, Victor Cesário da . Retalhos Para a História de Torres Vedras, ed.
Associação da Defesa do Património de Torres Vedras, 1979;
(7)
– PEREIRA,
Dr. Paulino, “Porque se espera para planear a comemoração do cinquentenário da
Escola Secundária ?”, in Badaladas, de 26 de Abril de 1969;
(8)
– in “Badaladas”
de 16 de Outubro de 1971;
(9)
–
Livros de Matriculas da Escola Secundária existentes no Arquivo Municipal de
Torres Vedras.
3 comentários:
Pesquisa muito profunda e de interesse cultural a todos os cidadãos de Torres Vedras !
Parabéns Venerando de Matos .
Não fazia ideia. Obrigada. Foi e continua a ser o melhor professor
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