No mês em que se comemora o 40º aniversário da fundação oficial da
Cooperativa de Comunicação e Cultura (CCC), aqui recordamos os primórdios desse
projecto, iniciado quase um ano antes, em finais de 1978.
Com base num conjunto de apontamentos manuscritos, que recentemente
descobri no meio dos meus papéis, um pequeno caderno onde registei as primeiras
reuniões que culminaram na criação da Cooperativa de Comunicação e Cultura,
onde registei datas, locais, presenças e
decisões das primeiras 12 reuniões, aqui apresentamos um contributo para
recordar os primórdios da CCC.
Para perceber esse início há que recuar um pouco no tempo, aos
efervescentes tempos entre 1973 e 1976, onde muitos dos que se reuniram para
lançar o projecto forjaram conhecimentos e cumplicidades.
Foi nessa época que muitos dos que participaram na fundação da
“Cooperativa” se conheceram e cimentaram amizades, cruzando-se no fanzine de BD
da Escola secundária, “o Impulso”, no Cine-clube de Torres Vedras, na oposição
ao Estado Novo, na Associação de Estudantes do Liceu e nos anos “iniciais e
limpos” do PREC ou nos simples encontros de Verão em Santa Cruz.
(registo da data das primeiras reuniões para lançar o projecto que levou à CCC)
Foi no rescaldo dessa época, após a “normalização” democrática de 1976,
que um grupo de amigos, no desejo de darem solidez à sua “experiência”
cultural, à sua amizade e ao desejo de
fazer coisas novas em comum, resolveu reunir informalmente em casa de uns ou de
outros para encontrar um espaço para concretizarem as suas ideias e projectos.
Pensou-se então que o melhor espaço para concretizar essas ideias era a
criação de uma publicação periódica, revista ou jornal.
Pusemo-nos a caminho elaborando uma lista de gente a contactar e
iniciando as reuniões para debater e preparar o projecto.
De uma lista inicial de mais de 60 nomes, conseguimos contactar 43,
comparecendo às primeiras reuniões 28, nem todos ao mesmo tempo, alguns
comparecendo no início e abandonando o projecto em pouco tempo.
A primeira reunião teve lugar em Santa Cruz, em casa do Fernando Mouro
e da Manuela Ribeiro, no dia 22 de Setembro de 1978. A ela compareceram 18
pessoas.
(rascunho da acta da 1ª reunião que lançou o futuro projecto CCC)
Nenhuma das restantes reuniões preparatórias voltou a registar aquele
número de presenças, embora se tivessem juntado, posteriormente, alguns que não
estiveram nessa primeira reunião.
O núcleo forte do projecto envolveu, nos primeiros tempos, umas 12
pessoas.
Presentes nessa primeira reunião estiveram o Fernando Mouro, a Manuela
Ribeiro, o Carlos Ferreira, os irmãos Jorge e “Chico” Vareda, os irmãos Rui Luís
e Sílvia Coelho, as irmãs Constância e Dulce Bataglia, o Jaime Ceia, o José Travanca,
a Guilhermina Pacheco, o Jorge Barata, o meu irmão Mário Luís e eu próprio,
para além de uma “Ana” (será a Ana Mourão?) e de um “Jaime” que não consigo
identificar.
Desse grupo inicial nem todos tiveram a mesma dedicação e importância,
alguns deixaram o projecto ao fim de algumas reuniões.
O objectivo dessas primeiras reuniões, realizadas no final de 1978, foi
o de planificar a edição de um jornal ou revista, definindo secções, conteúdos
e colaboração.
Da primeira reunião saiu a decisão de uma “excursão” a Lisboa para
contactar vários organismos e instituições com o objectivo de nos inteirarmos
de modos de distribuição de uma publicação, do levantamento de preços em
tipografias, da angariação de publicidade e das obrigações legais.
Essa deslocação teve lugar em 27 de Setembro de 1978, e o grupo era
composto por mim, pelo Fernando Mouro, pela Manuela Ribeiro, pelo Ceia e pelo
Rui Luís, colmatando alguns contactos que entretanto já tinham sido feitos pelo
Jorge Barata e pela Guilhermina Pacheco. Estes já tinham contactado uma
tipografia que estava ligada a um amigo comum, professor em Torres Vedras, o
“Xico” Carreira.
Nessa ocasião contactou-se com o Sindicato dos Jornalistas, para nos
informarmos das formalidades legais, tendo-nos sido aconselhado contactar
o Ministério da Comunicação Social, o
que foi feito, de onde viemos com todas as informações necessárias para
efectuar o registo de propriedade de um jornal.
Com base nessa deslocação, realizou-se um segunda reunião, deste vez em
já em Torres Vedras, em casa do Jorge Barata e da Guilhermina Pacheco, para
organizar a informação obtida e começar a aprofundar o projecto inicial.
Esta reunião teve lugar em 29 de Setembro e contou com 14 presenças e
nela estiveram presentes, pela primeira vez, o Mário Rui Hipólito, o Fernando
Meireles e o Antero Valério.
O tema mais discutido e aprofundado nesta reunião foi a definição do
âmbito da “revista”, concluindo-se que devia abranger o Distrito de Lisboa,
“mais especificamente a região Oeste”.
Em 3 de Outubro realizou-se nova reunião, da âmbito mais restrito,
deste vez em minha casa, com o objectivo de preparar uma reunião mais alargada
e mais definitiva, onde se começasse a avançar com tarefas mais detalhadas. Com
a presença de 6 elementos, eu, o Carlos Ferreira, o Fernando Mouro, a Manuela
Ribeiro, o Rui Jorge e a Cecília Travanca (estes dois presentes pela primeira
vez), prepararam-se dois documentos a debater na reunião alargada, um da
autoria do Fernando Mouro, outro elaborado por mim e pelo Jorge Barata,
definindo a filosofia e a estruturação da “revista”, bem como a Ordem de
Trabalhos da próxima reunião.
Esta realizou-se em 6 de Outubro, na sede do Cine-Clube, local que
passou a funcionar como “sede” provisória e onde se efectuaram mais 3 reuniões,
antes de passarmos a reunir em “sede” própria”.
Contou com 14 presenças, três delas pela primeira vez, o Emanuel
Carvalho, o Armando Jorge e o Joaquim Esteves. Estes dois últimos passaram a
ter, a partir de então, um papel importante na construção do projecto.
Nesta e nas reuniões seguintes o tema principal foi estruturar a
publicação do jornal, organizando-se secções, tarefas administrativas e
distribuindo responsabilidades.
Na 5ª reunião, que teve lugar em 10 de Outubro de 1978, naquele mesmo
lugar, abordou-se pela primeira vez a necessidade de avançar com a forma de
suporte administrativo e legal do jornal, abordando-se a criação de uma
“Cooperativa”.
Registe-se a entrada para o colectivo, neste período, de alguns nomes
fundamentais para se avançar, quer com o projecto de jornal, quer com o
projecto da Cooperativa: o Luís Filipe Rodrigues, que esteve presente pela
primeira vez naquela 5ª reunião, e o Victor Luís Grilo, na reunião seguinte, a
6ª, em 26 de Outubro. Outros nomes fundamentais só terão integrado o projecto a
partir de Janeiro ou Fevereiro de 1979, período que não cabe no âmbito deste
texto, como foi o caso, entre outros, do José Eduardo Miranda Santos (“Zico”), do José
Manuel Pinto Gouveia, da “Cinhas” Sousa Dias, do Joaquim Moedas Duarte, do Luís
Cunha e da Maria de Jesus Cunha, do Acácio Lopes, da Maria Lucília Rocha e do
José Paulo Rocha, da Conceição Carichas ou da Ana Mourão.
A 8ª reunião, realizada em 2 de Novembro, foi uma das mais importantes,
já que, pela primeira vez, se reuniu no lugar que veio a ser, durante anos, a
sede da “Cooperativa”, umas instalações cedidas pela Câmara, no Convento da
Graça, um andar “falso” por cima da sala actual do Museu Leonel Trindade, onde
está a exposição permanente do Castro do Zambujal, andar que hoje já não
existe, deitado abaixo quando da remodelação dessa sala.
Nesse local funcionavam outras associações locais.
Nessa mesma reunião começou a tentar escolher-se um título para o
jornal. Curiosamente, tanto no registo dessas reuniões como numa folha
manuscrita em anexo, onde registei todos os títulos propostos, não vem qualquer
menção àquele que veio a ser o título definitivo, “Área”, um nome que foi mais
tarde proposto pelo Aurelindo Ceia.
(rascunhos com ideias para o título do que veio a ser o "Área")
Foi ainda nessa reunião que se abordou a necessidade de realizar
iniciativas de âmbito cultural, em paralelo com a edição do jornal, que
servissem para “angariar fundos”, criando assim uma dinâmica própria que
tornaria a “Cooperativa” independente do jornal.
Importante foi igualmente a 9ª reunião, realizada em 8 de Novembro,
onde, de forma definitiva, se fala na
Cooperativa, no âmbito da sua legalização e da elaboração dos seus
estatutos, como suporte legal para o jornal. Foi o Armando Jorge que ficou,
nesta reunião, encarregue de elaborar uma proposta de Estatutos, penso que com
o apoio do Carlos Ferreira.
Nessa mesma reunião elaborou-se uma lista dos nomes que deviam ser
considerados sócios fundadores: Fernando Mouro, Manuela Ribeiro, Victor Luís
Grilo, Armando Jorge, Joaquim Esteves, Carlos Ferreira, Luís Filipe,
Guilhermina Pacheco, José Travanca, Jaime Ceia, Constância Bataglia, Jorge
Barata e eu próprio.
Foi na reunião de 1 de Dezembro, a 10ª, que se iniciou a preparação de
uma proposta de actividades a desenvolver pela Cooperativa, tendo-se também
registado a data de legalização oficial da Cooperativa, no dia 15 de Dezembro
de 1978, no notário de Torres Vedras.
Nem todos aqueles nomes acima mencionados compareceram para esse acto
de legalização. Apenas compareceram 9 (não tenho neste momento os seus nomes).
Contou-me o Armando Jorge que, nesse acto formal, como a legalização só era
possível com dez nomes, e faltou um dos 10, teve de se pedir a um senhor que
estava naquele notário para dar o seu nome, em troca de pagamento, como era
norma então (existiam pessoas que estavam presentes nos notários e tribunais
apenas com essa tarefa, em troca de um pagamento). Existe assim, como sócio
fundador, um ilustre desconhecido.
Legalmente, a partir de então, estava criada a “Cooperativa de
Comunicação e Cultura”.
O seu próprio nome correspondia ao espírito dos fundadores:
- “Cooperativa”, porque todas as decisões se pretendiam colegiais,
mesmo quando, por razões legais, a cada um dos intervenientes era dado um
cargo. Foi assim com o jornal “Área” onde “títulos” com o de “director”,
“administrador” e outros eram apenas um “pró-forma” legal. Era isso que se
pretendia inicialmente com os cargos da direcção da Cooperativa. A própria
numeração dos dez sócios fundadores foi sorteada;
- “Comunicação”, porque este foi então considerado um dos pilares da
associação, a edição de um órgão de comunicação social como o “Área” e de
outras edições;
- “Cultura” porque a realização de actividades culturais, inicialmente,
era um pilar fundamental para a divulgação e apoio à edição do jornal. Com o
tempo este “pilar” acabou por se tornar independente e, posteriormente,
prioritário nas actividades da colectividade.
Essa componente veio a marcar também algumas das primeiras divergências
no seio do grupo fundador.
O primeiro “caso” começou com a escolha do “director” do “Área”, que
inicialmente recaiu sobre o Victor Luís Grilo, mas que, por levar muito a peito
a função do cargo, sem se integrar no espírito “colegial”, acabou por ser
substituído pelo José Eduardo Miranda Santos (“Zico” para os amigos), que
acabou por se tornar o primeiro “director” do jornal.
O segundo “caso” foi-se acentuando ao longo do tempo, tendo atingido o
período crítico já em meados da década de 80, quando se formaram duas
tendências quase inconciliáveis entre os que pretendiam dar prioridade à edição
do “Área” e os que pretendiam sacrificar o jornal para poderem desenvolver um
projecto de actividade cultural mais consistente, sendo esta segunda tendência
que acabou por vingar.
Mas isto é já outra história, que não cabe já neste texto.
Antes de concluir, recordar apenas que o ano de 1979 foi marcado pela
consolidação do projecto, coordenado por uma comissão instaladora que teve como
tarefas a estruturação da Cooperativa, o lançamento do “Área” e a eleição da
primeira direcção legal da CCC.
No dia 28 de Novembro de 1979 realizou-se o “1º Passeio de Domingo”,
“Um Itinerário Histórico em Torres Vedras”, conduzido pela Cecília Travanca e
pela Manuela Ribeiro, que culminou com o lançamento do 1º número do Jornal “Àrea”.
Recorde-se aqui as funções dos responsáveis por essa primeira edição:
Director:- José Eduardo Miranda Santos;
Director Adjunto: - Armando Jorge Fernandes;
Direcção Gráfica: -Aurelindo Ceia
Chefe de redacção:- Carlos Ferreira;
Redactores: - Fernando Mouro, Guilhermina Pacheco, Joaquim Esteves,
Jorge Barata, Manuela Ribeiro, Mário Luís Matos e eu próprio.
Publicidade : Publitorres (Jordão
Pereira).
Tipografia: Sogratol.
Entre Novembro de 1979 e Junho de 1981 publicaram-se, mensalmente, com
uma ou outra falha, 13 números do “Área”.
Entretanto, em Janeiro de 1980 foi eleita a primeira direcção da
Cooperativa, assim constituída:
Assembleia Geral: Lucília Miranda Santos (presidente), Luís Filipe
Rodrigues, e Mário Luís Aspra de Matos;
Direcção: José Manuel Pinto Gouveia (o primeiro presidente eleito),
Fernando Mouro, Lucília Rocha, Antunes Corado, Conceição Carichas, Pereira da
Costa e Guilhermina Pacheco;
Concelho Fiscal: Adérito Moreira, Carlos Mota e Jordão Pereira.
Aqui fica, em breves traços, um pouco da história dos primórdios da
Cooperativa de Comunicação e Cultura, recordando também alguns dos fundadores e
pioneiros na construção desse projecto que tem hoje uma história longa e
consolidada no panorama cultural de Torres Vedras e da região.
1 comentário:
Caro Venerando
Fiquei emocionado com esta memória evocativa. Já lá vão 40 anos!
Felizmente já eras Historiador e cuidaste em guardar testemunhos escritos que hoje são preciosos.
O meu nome lá aparece, numa espécie de segunda vaga, pois nesses anos longínquos eu estava muito focado na actividade política como autarca e dirigente sindical local no Sindicato dos Professores da Grande Lisboa.
Depois, sim, colaborei no ÁREA e estive na Direcção da CCC.
Sinto-me sempre muito grato pelo teu meritório e decisivo trabalho de construção da nossa História Local.
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