sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

“Em Sentido Contrário – Venerando Ferreira de Matos (1926-1975) – um oposicionista na província”



Já está à venda em Torres Vedras, na Papelaria União, a biografia de Venerando Ferreira de Matos, figura activa no meio cultural, associativo e jornalístico desta cidade, durante os anos do pós-guerra até ao seu falecimento em 1975.

A biografia inclui uma vasta documentação, acompanhando os seu percurso de vida que atravessou todo o Estado Novo, iniciado em Coimbra e que incluiu o cumprimento de dois anos de prisão em Peniche no início da década de 1950.

O livro insere-se numa colecção editada pela Associação Ephemera, uma Associação que visa dinamizar, organizar e divulgar o vasto espólio do arquivo privado de José Pacheco Pereira.

Dessa coleção já foram publicados dois outros títulos, “em redor de uma palavra grega”, da autoria de Maria Mafalda Viana, sobre a origem da palavra “Ephemera”, e “A Esquerda Festiva do Técnico nos anos 60 – um testemunho” por Henrique Garcia Pereira, sobre o agitado momento político vivido pelos estudantes do Instituto Superior Técnico nos anos de 1960.



“EM Sentido Contrário” é  terceiro título dessa colecção, que vai ser oficialmente lançado no próximo dia 22 de Janeiro no Museu do Forte de Peniche, em hora ainda a designar, apresentado pelo Dr. Fernando Pereira Marques e pelo Dr. José Pacheco pereira, e em Torres Vedras, em 15 de Fevereiro, na Biblioteca Municipal Leonel Trindade, pelas 18 horas.

Estão previstas ainda duas sessões de apresentação no Museu do Aljube, em Lisboa, em data a designar, e em Coimbra, em lugar e data a designar.

Como apresentação da biografia de Venerando Ferreira de Matos, aqui deixamos o prefácio desse livro, da autoria do Dr. José Pacheco Pereira:

“Em Sentido Contrário, é o primeiro dos Cadernos do Ephemera dedicado ao que chamamos “os oposicionistas na província”, aqueles que são mais facilmente esquecidos porque não viveram nos centros do poder, mas que deram dimensão nacional à resistência ao Estado Novo.

“Venerando Aspra de Matos, autor deste Caderno, nosso incansável amigo e associado fundador, escreve sobre Venerando Ferreira de Matos, seu Pai um desses muitos homens que, quase desconhecidos, por todo o país, dedicaram as suas vidas a fazer oposição ao regime salazarista. Sempre com um só objectivo, derrubar o regime, desenvolviam intensa actividade, nos jornais locais ou nacionais, nos seus empregos, nos cafés, nas associações, nos grupos de teatro, nas bibliotecas locais, a maioria das vezes com um informador da PIDE à distância de um olhar e com o risco permanente de prisão. Venerando Ferreira Matos pagou esse preço, ainda muito jovem, estando vários anos preso em Peniche.

“Da cadeia, escrevia à sua noiva cartas que nos descrevem a vida na prisão, as suas relações com os demais presos e com o Partido Comunista, a sua atenção aos sons do exterior, o cuidado com a sua permanente formação e informação, para que o tempo da prisão não fosse perdido. Algumas dessas cartas são aqui transcritas, transportando-nos de imediato para dentro do Forte prisão e para o espírito dos que lá se encontravam, sendo uma fonte até agora inédita do quotidiano numa das prisões mais importantes do regime salazarista.

“Libertado, continuou a sua luta cívica em Torres Vedras e naquela que foi uma constante da sua vida, a escrita em jornais. Podiam ser artigos sobre arte, ciência, desporto, ou com preocupações ambientais, numa luta muitas vezes subterrânea, contribuindo para a formação de um magma que algum dia havia de ver a luz do dia.  Venerando Ferreira de Matos ainda pode ver o dia “lustral” do 25 de Abril de 1974.

“Com estas biografias, pretendemos divulgar espólios do Arquivo Ephemera que podem servir ao trabalho dos investigadores e deixar memória útil a todos.

José Pacheco Pereira.”


quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

A segunda Fundação da Escola Secundária Municipal (1919) – Breves apontamentos




(versão integral do texto que já tinha sido apresentado neste espaço, mas de forma resumida)

Depois de termos evocado, em crónica anterior, a primeira Escola Secundária a funcionar em Torres Vedras, entre 1890 e 1903, aqui recordamos agora a segunda fundação da escola de ensino secundário torriense, inaugurada em 3 de Novembro de 1919.

Não pretendemos fazer a história desta escola que esteve na origem da actual Escola Madeira Torres, mas apenas coligir alguns breves apontamentos que possam servir de ponto de partida para quem pretenda fazer a História desse estabelecimento de ensino.

Em 1918 Victor Cesário da Fonseca, que tinha frequentado a escola encerrada em 1903, republicano activo, e que sempre responsabilizou os monárquicos locais pela decisão daquele encerramento (1), iniciou uma campanha, nas páginas do jornal “Ecos de Torres” em defesa de se retomar o funcionamento de uma Escola Secundária, a partir de um artigo não assinado na edição de 28 de Janeiro desse semanário.

Em sessão camarária  de Abril de 1919 o vereador José Anjos da Fonseca  propôs o lançamento de um imposto de 5% sobre as contribuições pagas pelas freguesias do concelho, para apoiar a abertura da Escola Secundária, proposta aprovada apenas pela diferença de um voto (2) , constituindo-se uma comissão instaladora que levou o projecto a bom termo.

Dessa comissão fizeram parte Afonso Pedreira Vilela, João Fernandes Caldeira, Victor Cesário da Fonseca, Joaquim Rodrigues Cardoso e António Germano Marques de Carvalho.

A nova Escola Secundária foi inaugurada em 3 de Novembro de 1919, uma segunda-feira, provisoriamente num edifico da Travessa da Olaria, mudando-se em definitivo para o edifício localizado na Avenida 5 de Outubro, onde funcionam actualmente os serviços camarários, em 1921, edifício que então tinha apenas um andar.

Foi nomeado como seu primeiro director o professor Augusto do Nascimento Gonçalves, até então director do Instituto Politécnico de Torres Vedras (3), escola que tinha sido inaugurada em de Outubro de 1911, e onde se ministravam a “instrucção primária, secundária e commercial” e que admitia “alumnos de ambos os sexos como internos, semi-internos e externos”, leccionando também “piano e lavores”, funcionando na Rua Barreto Bastos, nº 3, 1º Direito (4) .

O jornal “A Vinha de Torres Vedras”  referia-se nos seguintes termos àquela inauguração:
“Como amigos da instrução e partidários da fundação deste útil estabelecimento de ensino, não podemos deixar de nos congratular com este acontecimento, por todos os títulos importante e cuja falta há muito se fazia sentir nesta villa.

“Ao acto da inauguração da nova escola presidiu o sr. António Cabral, presidente da Camara e assistiram a vereação e muitas pessoas” (5).

Até 1923 os alunos não pagavam propinas.

No primeiro ano lectivo, o de 1919/1920, inscreveram-se 56 alunos, 26 no 1º ano, 12 no 2º ano, 6 no terceiro, 4 no 4º ano e 8 no 5º ano, entre eles algumas alunas, 15 no 1º ano, 2 no 3º ano e uma no 5º ano.

Entre os inscritos encontramos nomes que vieram a ser figuras proeminentes na vida cultural, social, económica e política de Torres Vedras : Alberto Vieira Jerónimo e  Galileu Silva, inscritos no 1º ano; Amílcar Guerreiro, Hélder dos Santos Torres, Inácio do Nascimento Clemente, José Hipólito e Manuel Duarte Capote, no 2º ano e Leonel Trindade no 5º ano (6).
(Alunos e professores da Escola Secundária, nos anos de 1940 - Arquivo de Maria Helena Aspra de Matos)


No primeiro livro de matriculas onde se regista a profissão dos encarregados de educação, o referente ao ano lectivo de 1942/1943, não deixa de ser significativo registar o domínio de filhos de funcionários públicos e comerciantes.

Entre um total de 164 alunos inscritos em todos os níveis de ensino nesse ano, 52 eram filhos de gente ligada ao comércio (45 comerciantes, 6 empregados de comércio, e um ajudante de farmácia) , 40 estavam ligados ao funcionalismo público (10 funcionários públicos, 8 conservadores, 5 professores, 4 empregados da CP, 3 funcionários municipais,  2 funcionários dos CTT, 2 ajudantes de notário, 2 oficiais do exército, 1 funcionário colonial, 1 funcionário público aposentado, 1 notário e 1 solicitador) seguindo-se os filhos de “proprietários” (21).

Refira-se ainda o número de pais com formação média e superior:   9 médico, 4 advogados, 3 enfermeiros, 2 engenheiros e 2 empregados bancários (sem contar com os 5 professores e outros profissionais acima incluídos no funcionalismo público). Refiram-se ainda os filhos de “industrias” (em número de 8).

Em contrapartida, apenas encontramos 3 filhos de operários e 1 de agricultor.

Não espanta que a maioria dos alunos residisse na vila, 133 dos inscritos. Runa é a freguesia fora da vila que sobressai, com 7 alunos inscritos, situação que não será estranha à proximidade permitida pelo caminho-de-ferro.

Nas décadas de 1960/70 a Escola atraia alunos de muitos concelhos vizinhos, nomeadamente do sobral de Monte Agraço, sendo uma escola “com forte poder de atracção” devido à sua “posição bastante central em relação à sua área de influência”, e bem servida de transportes, começando a colocar-se um problema de crescimento (7).

No ano lectivo de 1968/1969 começou a funcionar o chamado ciclo preparatório, provocando uma ligeira redução no número de alunos inscritos na Escola Secundária. Dos 334 inscritos em 1967/68 passou para 318 no ano seguinte.

A barreira das 3 centenas de alunos inscritos na Escola Secundária tinha sido ultrapassada, pela primeira vez, no ano lectivo de 1964/1965, com 310 inscritos (8).

Por despacho de dezembro de 1969, e após intensa campanha iniciada nesse ano nas páginas do “Badaladas”, por ocasião do cinquentenário, a Escola Secundária, tornou-se secção do Liceu Nacional D. Pedro V, deixando de ser o município a suportar financeiramente essa escola, o que permitiu uma redução das propinas pagas pelos alunos (9).

Oficialmente o Reitor da escola torriense era o reitor do Liceu D.Pedro V, o Dr. Estevão Ferreira Moreira, passando o director da antiga secundária, o Dr. João Carlos da Cunha, a ser designado por “vice-reitor” (10).

Contava nessa data com 19 professores e cerca de 400 alunos.

Em 12 de Outubro de 1971 o Conselho de Ministros aprovou um decreto ( Decreto 447 de 25 de Outubro) que criou 21 liceus nacionais, entre os quais o de Torres Vedras, passando a escola secundária, então com 540 alunos incritos, a denominar-se, a partir do ano lectivo de 1972/73, Liceu Nacional de Torres Vedras, abrindo uma secção na Lourinhã, sendo nomeado como reitor o Dr. Joaquim Semedo Toco e tendo sessão inaugural em 2 de Outubro de 1972 (11).

Sobre este tema, registamos aqui uma recolha oral que fizemos junto do sr. Adão de Carvalho, em Abril de 1990, onde ele nos contou que, em meados de 1971, o sr. Fernando Leal se deslocou ao Ministério do Interior para que o ministro exigisse, junto do Ministro da Educação, José Hermano Saraiva,  a passagem da Escola Secundária a Liceu.

Uma das condições que Fernando Leal tinha posto para aderir à União Nacional tinha sido a de que a escola secundária fosse elevada a Liceu.

Como, nesse encontro, o Ministro referiu que Torres Vedras já tinha sido beneficiada em demasia, Fernando Leal ameaçou demitir-se a ele, a toda a direcção regional da União Nacional.

Quando vinha a sair desanimado do encontro, encontrou Marcelo Caetano, que regressou com ele ao ministério e pressionou a passagem da escola a Liceu Nacional.

Foi assim, no início da década de 70 do século passado, que  o “liceu” deixou de ser a escola elitista que tinha sido, para se “democratizar” e abrir à população que até aí tinha como única saída para os seus filhos o ensino técnico ou comercial, muito também devido à chamada reforma Veiga Simão, situação que levou a um grande aumento do número de alunos a frequentá-la.

No ano lectivo de 1971/1972 era frequentada por cerca de 540 alunos. No ano lectivo de 1973/1974 já a frequentavam mais de 800 alunos, ultrapassando o número de mil alunos nos anos seguintes.

Já em 1971 o jornal “Badaladas” referia que se impunha “com a maior urgência, a construção dum novo edifício para o Liceu”, propondo que ficasse para “a Escola Preparatória todo o imóvel municipal da Avenida 5 de Outubro”.

É em 1975 que o assunto voltou a merecer atenção, num artigo publicado por António Leal d’Ascensão intitulado “Liceu de Torres Vedras –Torres Vedras precisa e merece um Liceu Novo” (12).

Em sessão de 9 de Fevereiro de 1977 iniciou-se o debate sobre a criação das novas instalações para o Liceu, então designado por Escola Secundária nº 2, e para a Escola Preparatória, processo que vai ser liderado pela vereadora Ana Maria Bastos, coadjuvda pelo vereador António Leal d’Ascensão, durante o primeiro mandato de Alberto Avelino como presidente da Câmara (13).

O processo vai-se arrastar pelos anos seguintes e, em Março de 1978, a Direcção Geral das Construções Escolares informa a Câmara da previsão do concurso para esse ano e o início das obras para o final do ano ou início de 1979 (14).

Embora se defendesse uma maior participação dos pais no destino da escola, logo na sessão solene da criação do Liceu de Torres Vedras, só depois do 25 de Abril é que foi eleita a primeira comissão de pais, em 11 de Dezembro de 1974, tendo como primeiro presidente da direcção a Drª Maria Aldina Rebelo (15), altura em que surgiu igualmente a primeira associação de estudantes.

Em 2 de Abril de 1987,o Liceu passou a designar-se Escola Secundária Madeira Torres, três anos depois de ter mudado para novas instalações, no ano lectivo de 1983/1984, aquelas onde ainda hoje funciona (16).

Aqui ficam algumas notas de uma História por fazer, de uma escola centenária que ainda tem muito por contar.

  1. (1)    – leia-se  FONSECA, Victor Cesário da ,  Retalhos Para a História de Torres Vedras, ed. Associação da Defesa do Património de Torres Vedras, 1979;
  2. (2)    –PEREIRA, Dr. Paulino, “Porque se espera para planear a comemoração do cinquentenário da Escola Secundária ?”, in Badaladas, de 26 de Abril de 1969;
  3. (3)    – in “Folha de Torres Vedras”, edições de 13 de Agosto , 10 de Setembro e 15 de Outubro de 1911;
  4. (4)    Sob a designação de “Fragmentos”, “Cinquentenário da Escola Secundária Municipal! e “Recordar é viver” publicaram-se no jornal “Badaladas”, ao longo do ano de 1969, vários documentos relativos aos primeiros anos do funcionamento da escola secundária, artigos não assinados mas que foram escritos pelo Dr. João Carlos Cunha, autoria que ele me revelou. Chama-se a atenção para os dados publicados nas edições de 14 de Junho, 5 de Julho, 2 de Agosto e 1 de Novembro de 1969 do jornal “Badaladas”; Leia-se igualmente “A História da E.S.M. E A Homenagem Aos Municípios e Fundadores”, da autoria do então Conta-almirante Lino Paulino Pereira, comunicação lida por ocasião da sessão solene comemorativa do cinquentenário da escola municipal, realizadas em Junho de 1970 e transcrita integralmente na reportagem, da autoria de Francisco Vieira Jerónimo, publicada na edição de 20 de Junho de 1970 do jornal “Badaladas”;  
  5. (5)    – in “A Vinha de Torres Vedras” de 8 de Novembro de 1919;
  6. (6)    – Livros de Matriculas da Escola Secundária existentes no Arquivo Municipal de Torres Vedras.
  7. (7)    – in SALGUEIRO, Teresa Barata, “Documentos para o Ensino – A Área de Influência da Escola Secundária de Torres Vedras”, separata de Finisterra, Vol.VI - 12, Lx, 1971, pp. 302 a 307;
  8. (8)    – in Arquivo Municipal de Torres Vedras, Elementos de Estudo do Presidente da Câmara, Frequência da Escola Secundária Municipal de Torres Vedras, 7 de Maio de 1969;
  9. (9)    – in “Badaladas”  de 10 de Janeiro de 1970;
  10. (10)                       – in “Badaladas” de 28 de Março de 1970;
  11. (11)                       - in “Badaladas” de 16 de Outubro de 1971, 30 de Setembro e  7 de Outubro de 1972;
  12. (12)                       – in “Badaladas” de 22 de Março de 1975;
  13. (13)                       – in “Badaladas” de 24 de Fevereiro de 1977;
  14. (14)                       – in “Badaladas” de 16 de Março de 1978;
  15. (15)                       – in “Badaladas” de 28 de Dezembro de 1974;
  16. (16)                       – sobre o patrono e o processo de escolha do nome, leia-se a publicação, de autoria colectiva, “O Patrono da Escola Secundária Madeira Torres, Manoel Agostinho Madeira Torres”, editada em Fevereiro de 2006 conjuntamente pela escola e pela Câmara Municipal.


quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Torres Vedras: Desequilíbrio entre rendimentos declarados e quantidade de Carros de Luxo

O jornal Expresso fez um levantamento, por concelho, da percentagem de carros de luxo em relação ao parque automóvel de cada concelho, e comparou a posição de cada concelho na posse desse bem em relação com o seu rendimento médio e o valor de IRS declarado e chegou à conclusão que existem concelhos onde ...alguma coisa não bate certo.

Um deles, embora não seja o pior, é o concelho de Torres Vedras. Aqui alguma coisa não bate certo na relação entre a declaração de rendimentos e esse sinal exterior de riqueza.

Esta é a situação deste concelho, referida por essa investigação (sem mais comentários):


"Tem 5,7 carros por cada 10 habitantes. 20,2% são luxo e premium (média nacional: 18%).

Declara um rendimento por habitante de €8 233 por ano. E há 1,4 carros luxo e premium por cada €100 mil de rendimento (média nacional: 1,2).

É o 45º concelho com poder de compra.

É o 46º com mais carros L&P e está em 58ª posição em termos de rendimento declarado no IRS (em 280 concelhos)".