terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Uma fotografia das vindimas na Quinta de Charniche, do principio do século XX

A fotografia que acima se reproduz foi retirada da página britânica da Amazon e retrata uma cena das vindimas no principio do século XX, passada na Quinta de Charniche.

Através de uma investigação mais aprofundada na internet, partindo do nome do autor que se encontrava noutra fotografia que acompanhava aquela e do facto de o canto das duas fotografias referir aquilo que podia ser um número de página, conseguimos encontrar a origem daquela fotografia.

Fomos encontrá-la na obra, editada por J.A. Hammerton, no principio do século XX, People of all Nations (...),  publicada em vários volumes. O capítulo dedicado a Portugal é dirigido por um tal Prof. George Young e intitula-se "Portugal: A History", sendo incluido no 6º volume da obra (ou no 11º numa outra edição). A Fotografia aqui reproduzida encontra-se na página 4163.

As fotografias são da autoria de um fotógrafo quase desconhecido, A.W. Cutler, talvez australiano, e que colaborou como fotojornalista no National Geographic nas duas primeiras décadas do século XX. Sabe-se que Cutler esteve em Portugal por volta de 1922. Podem consultar mais informações sobre este fotógrafo AQUI.

Já que falamos da Quinta de Charniche (ou Charnixe como se pode ler no carro de bois da fotografia), situada na freguesia de S. Mamede da Ventosa, no concelho de Torres Vedras, aqui deixamos algumas notas sobre essa quinta que recolhemos para um projecto nosso, entretanto abandonado:

Quinta de Charniche

Também chamada de  “Sarniche”, pertencia em 1862  ao bacharel Fillipe de Souza Belfort
Era então importante a produção de vinho nas propriedades desta quinta(anotadores, p.te econ., caderno 3º ff.8/9, nota à alínea c) p. 248., AHMTV).

Junto dela foram encontrados importantes vestígios pré-históricos, um monumento funerário encontrado junto e “acima” da Quinta de Charniche, (Serra das Mutelas) “monumento funerário do tipo tholos, que ocupou arqueólogos de renome como Virgílio Correia e Leite de Vasconcelos: circular, pré-histórico, produziu abundante espólio, em que se encontram caveiras humanas e outros ossos, facas de sílex, pontas de seta de cobre, vasos de barro negro, machados de calcário, ídolo cilíndrico, etc. ..” (Enciclopédia Luso-brasileira, Ventosa, p.579)

Pelo menos entre  1888 e 1904 pertenceu a Joaquim Gomes de Sousa Belford (Anuário Comercial e Agrícola  -ACA, A Semana 1 – 5 - 1888).

Este foi, talvez, o mais famoso proprietário da Quinta, chegando a ocupar a presidência da Câmara de T. Vedras. Este “descreveu a sua propriedade, em 1900, dizendo que a Quinta com130 hectares, tinha bosque, pinhal, cereais e, sobretudo vinha” (autoras de “O Património Local e a Escola”).

No final do século XIX torna-se conhecida pelas suas águas minerais .

Em 1899 vendiam-se em garrafas como “água de mesa Minero-Medicinal”. Era considerada “uma agua de mesa diurética e reguladora de todas as funções digestivas”, sendo indicada “nos casos de atonia intestinal, gastrite e enterite Chronica, congestão e catharro do fígado, dos rins, da bexiga, próstata e do útero, casos de arthrismo, gotta, albuminuria, diabetes, rheumatismo, etc.”. O seu uso regular curava e evitava “a prisão de ventre, dispepsia, gastralgia, cólicas, vertigens, nevralgias e doenças da pelle, como urticária, herpes, eczema, etc.(...) . Brilhante e inalterável, de sabor agradável”, podia-se “tomar em jejum ou às refeições; misturada com o vinho” tornava este “mais agradável, sem lhe alterar, como as aguas alcalinas, o seu gosto e qualidades”.

Era vendida em garrafas de 1 litro, custando a água 100 réis e a garrafa 50 réis, e em garrafões de 5 litros, custando a agua 350 réis e o garrafão 300, recebendo-se o vasilhame, desde que tivesse o rótulo da empresa.(Folha de Torres Vedras – FTV- , 31 de Dezembro de 1899.).

Por alvará de 26 de Março de 1909, era então sua concessionária Dª  Sara Belford Street. (COSTA, Américo, Dicionário Corográfico de Portugal Continental e Insular, Liv. Civilização, Porto 1948, vol. XI, p. 785).

Recebeu novo alvará de licença para exploração das águas minero-medicinais  datado de 31 de Dezembro de 1928. Eram classificadas como meso-salinas, cloretadas sódicas, sulfatadas magnesianas e cálcicas, bicarbonatadas cálcicas e magnesianalinitadas. (Anuário Estatístico de Portugal, ed. 1928).

Esta família Belford era de origem irlandesa, “refugiados em Portugal por ser católica, mas que” no século XIX “foi aqui perseguida pelo seu apoio  a D. Miguel” (autoras de “O Património Local e a Escola”).

Em 1895 por decreto publicado no Diário do Governo de 17 de Junho, o vinicultor Joaquim Gomes de Sousa Belford, residente  na Quinta de Charniche, foi nomeado inspector dos Serviços de Fiscalização de Vinhos e Azeites. Era membro do Conselho Superior da Agricultura e da Real Associação Central de Agricultura Portuguesa. (A Semana, 23/6/1895).

No século XX foi frequentada pelo escritor Joaquim Paço D’Arcos, neto de Joaquim de Sousa Belford.


Possui capela.

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