quarta-feira, 18 de junho de 2025

As primeiras “povoações” no Concelho de Torres Vedras

(Museu Leonel Trindade)

A passagem do nomadismo, característico do paleolítico, para o sedentarismo, originando o aparecimento dos primeiros povoados humanos, que acompanhou a passagem de uma economia recolectora para uma economia produtiva, através da domesticação de animais (pecuária) e plantas (agricultura), característico do neolítico, foi um longo processo de transformação.

Geralmente, o chamado Neolítico é datado de entre 10 mil anos e 3 mil anos antes da nossa Era.

Na Europa,  o Neolítico terá tido início por volta de 6 mil antes da nossa era e, na Península Ibérica, ainda mais recentemente, por volta dos 5 mil anos antes da nossa era.

Na região torriense, muitos dos vestígios característicos do neolítico encontram-se junto de povoados do período do calcolítico (de, aproximdamente, entre 3 mil a mil e oitocentos a.C), parecendo configurar, não só uma tardia “instalação” do neolítico no território, como uma eventual continuidade e evolução da ocupação humana desses “povoados” do neolítico para o calcolítico, onde se confundem as duas influências.

Alguns dos autores abaixo citados apontam a existência de povoados neolíticos na vertente NO do Cabeço do Castelo, margem direita do Alcabrichel, Maceira e nos “castros” de S. Mateus, em Monte Redondo, da Portucheia, do Barrigudo, do Pico Agudo, a Sul do Cabeço do Castelo, Maceira, do Casal da Cidadoura, do Monte do Crasto, no Vespeiro, a sul do Zambujal e no Varatojo.

Presumivelmente do mesmo período foram encontrados vários  objectos dispersos em pedra polida na zona urbana de Torres Vedras, em S. Mamede da Ventosa, no Figueiredo, no Turcifal, na  Assenta, em  Cambelas, no Vale da Mata, perto do Maxial. Aliás, na “área do Maxial há alguns pontos que deveriam ser objecto de uma prospecção. A SE do lugar, há uma sequência de elevações que seriam susceptíveis de fornecer bons abrigos: de Oeste para Leste, temos A-Do-Verde (140 metros de altitude), Outeiro do Vento (236), Cabeço do Jardo (150 metros de altitude) e Fogarosa (ponto em que está instalado um marco trignométrico)” (FREITAS, 1959, vol.1, p.240).

As dúvidas sobre a origem neolítica desses vestígios tem um “possível explicação (…) no facto de se terem registado profundas alterações no meio ambiente”, desde a última glaciação, ocorrida há uns 10 mil anos, fazendo aumentar os níveis dos oceanos, sendo “as terras baixas, vales e planícies, propícias a uma agricultura neolítica (…) invadidas pelas àguas do mar”, soterrando “possíveis futuras aldeias e campos de cultivo” (RODRIGUES, 1996, pág.39).

Assim só existem algumas certezas da sedentarização e da  formação de povoados na região já durante o período Calcolítico.

Entre os povoados datados do Calcolítico refiram-se:

 o Castro da Achada, Monte da Achada,  Monte Redondo, descoberto  por Leonel Trindade em 1951, com ocupação no início da Idade do cobre, podendo ter tido uma segunda ocupação durante a Idade do bronze;

– o Castro da Fórnea, Matacã, contemporâneo do Castro do Zambujal, de cuja proximidade se pode especular sobre o tipo de relações existentes entre esses dois sítios. João Ludgero Gonçalves avançou a hipótese de a Fórnea poder ser “uma atalaia de defesa de uma boa via de comunicação (como é o vale do rio Sizandro) ou do limite fronteiriço de um teritório (...) ou o posto avançado para exploração de fontes de matéria-prima, de um território económico liderado por um lugar central” que podia ser o Zambujal. (GONÇALVES, 1995, p.139);

– a Póvoa do Penedo, Runa, descoberto por Ricardo Belo em 1933, tendo recolhido mais de 800 peças datadas do eneolítico. “A construção pode ser considerada uma última variante das fortificações das colónias da Idade do Cobre, em território português, e apresenta uma superfície interior relativamente pequena” (RODRIGUES, 1999, p.70);

– o Pitagudo, perto de A-Dos-Cunhados.

 a Serra de Sarreira, Freiria.

– o Castro do Zambujal, o mais conhecido e estudado e que já foi referido noutra crónica nossa,descoberto por Leonel Trindade em 1938. Terá sido ocupado entre 2500 aC. e 1700 aC;

– o Castro do Cabêço do Jardo, junto ao Maxial;

– o Castro do Monte de S. Mateus, junto à Lobagueira, Maxial;

– o Castro do Outeiro da Cabeça;

 o Castro do Casal da Passadeiras, Maxial;

– no Varatojo, próximo do Convento, um “Castro” não fortificado, datado de 2500 aC;

-  na Quinta das Galhardas, a oeste da Ribaldeira;

– no Monte da Doutora, Sarreira, Freiria;

– o Castro da Boiaca.


Várias são igualmente as  necrópoles calcolíticas identificadas na região:

– Borracheira, S. Pedro;

– Lapas Grandes, Monte Redondo.Duas grutas artificiais construídas entre 2700 e 2500 aC., talvez ainda no Neolítico final. Uma das  grutas  foi novamente ocupada no Calcolítico Final (entre 2000 e 1500 aC.).Ambas voltaram a Ter uma ocupação humana entre 1000 e 800 aC.(Bronze final );

– Lapa da Rainha II, Maceira;

 – Gruta do Sapateiro, vertente SO do “Cabeço do Castelo”, Maceira;

– Portucheira I, Matacães;

– Cova da Moura, S. Pedro. Gruta natural, na margm esquerda do Sizandro, entre Torres Vedras e as termas dos Cucos, junto à linha de caminho de ferro, na Boiaca. Nela foram encontrados 90 esqueletos. Próximo dela existem várias grutas naturais, mas só numa delas, a chamada “Cucos II”, foi encontrado material arqueológico, um machado em pedra polida;

– Monte da Pena, “Tholos” do Barro, S. Pedro. Descoberto em 1909 pelo Padre Paul Bovier-Lapierre. A maior parte do espólio aí encontrado está no Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia. O espólio encontrado nas imediações daquele monumento por Leonel Trindade encontra-se no Museu de Torres Vedras  e é datado, quer do calcolítico, quer o Bronze final;

– no Casal Charrino, perto do castro do Varatojo, S. Pedro, um “Tholoi”, hoje completamente destruído.

– Bolores, S. Maria;

– Cabeço da Arruda, Freiria.Conjunto de três  sepulturas do calcolítico, duas colectivas e uma de tipo “tholos;

– Serra das Mutelas, perto da Quinta de Charniche, S. Mamede da Ventosa.“Tholoi” hoje completamente destruída;

– Serra da Vila, Stª Maria.Sepultura megalítica, tipo “tholos”.Foi completamente destruída;

  Junto a Vila Seca, Maxial. Monumento megalítico;

- Quinta de Entre Campos, Ermegeira, Maxial. Gruta artificial. Entre os objectos aqui encontrados, destaca-se um par de brincos em ouro e quatro pequenos tubos de folha enrolada do mesmo metal;

– Abrigo da Carrasca, perto da Macheia, Matacães. Abrigo sob rocha de grandes dimensões, datado de entre 2500 e 2200 aC;

– Lapa do Paio Correia ou Lapa do Preto, junto à Vala do Pisão, Vila Facaia, Ramalhal.Gruta artificial. Datação desconhecida, provavelmente de entre o IIIº e IIº milénio aC.;

– Moinho da Lapa, Stª Maria.

Também do período calcolítico estão registados vário achados isolados, alguns de superfície nos seguinte locais: Vespeiro, S.Pedro; Barrigudo, Runa;  Cucos II, S. Pedro; Casal da Serra, S. Mamede da Ventosa; Fonte Grada, Stª Maria; Sequeira, Silveira; Forte do Canudo, Stª Maria; Charnais, Serra da Vila; Casal da Amoreira, S. Pedro da Cadeira; Casal do Sobrigal, S. Domingos de Carmões.

 BIBLIOGRAFIA

-              BELO, Aurélio Ricardo, “Nótulas sobre arqueologia de Torres Vedras e seu termo”, conjunto de 55 estudos publicados entre 1952 e 1959, nas páginas do jornal Badaladas.

-              FERREIRA, Octávio da Veiga, La culture du vase campaniforme au Portugal,  tese de doutoramento apresentada  à Faculté des Sciences de l’Université de Paris, Lisboa  1966.

-              “Freguesias”, suplemento do jornal BADALADAS, de T. Vedras, 1998, 1999 e 2000.

-              FREITAS, Cândido Manuel Varela de , A Arqueologia do Concelho de Torres Vedras (Contribuição para o seu estudo até à época Lusitano-Romana), Dissertação de licenciatura no Curso de Ciências Históricas e Filosóficas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,  2 volumes, Lisboa 1959,

-              GONÇALVES, João Ludgero Marques, “O Castro da Fórnea (Matacães-Torres Vedras)”, in KUNST, Michael (coord.), Origens, Estruturas e Relações das Culturas Calcolíticas da Península Ibérica, Actas das I Jornadas Arqueológicas de Torres Vedras, 3-5 Abril 1987, Trabalhos de Arqueologia 7, IPPAA, Lisboa 1995, pp.123-140.

-              KUNST, Michael (coord.), Origens, Estruturas e Relações das Culturas Calcolíticas da Península Ibérica, Actas das I Jornadas Arqueológicas de Torres Vedras, 3-5 Abril 1987, Trabalhos de Arqueologia 7, IPPAA, Lisboa 1995.

-              LUNA, Isabel de, “Investigação arqueológica em Runa”, in “Freguesias” (Runa), suplemento nº 13 do jornal Badaladas, 15-10-1999.

-              LUNA, Isabel de , “Monte Redondo na pré-história”, in “Freguesias” (Monte Redondo), suplemento nº9 do jornal Badaladas, 12-2- 1999.

-              LUNA, Isabel de, “Uma terra de ferreiros”, in “Freguesias” (Ramalhal), suplemento nº12 do jornal Badaladas, 28-5-1999.

-              LUNA, Isabel de ,”Um tesouro pré-histórico”, in “Freguesias” (Outeiro da Cabeça), suplemento 10 do jornal Badaladas, 26-3-1999.

-              MADEIRA, João, GONÇALVES, João Ludgero, RAPOSO, Luís, PARREIRA, Rui, Achados da Idade do Bronze no Monte da Pena (Barro/Torres Vedras) – Notícia Prévia, Lisboa 1972.

-              ROCHE, J. e TRINDADE, L., La Station Prehistorique de Rossio do Cabo (Santa Cruz – Estremadura), Porto 1951, separata do Boletim da Sociedade de Geológica de Portugal, Vol. IX (pg. 219-228), 1951;

-              RODRIGUES, Cecília Travanca, “O Passado Longínquo: da Pré-História à Romanização”, in Torres Vedras – Passado e Presente, vol I, pp. 35 a 60, C.M.T.V., 1996.

-              RODRIGUES, Cecília Travanca, Reconhecer Leonel Trindade, Cooperativa de Comunicação e Cultura, T. Vedras, 1999.

-              TORRES, Manuel Agostinho Madeira, Descripção Historica e Economica da villa e termo de Torres-Vedras, 2ª edição anotada, Imprensa da Universidade, Coimbra, 1862 (ed. “fac-simile” , ed. Stª Casa da Misericórdia de Torres Vedras, 1988).

-              TORRES, Manuel Agostinho Madeira, Descripção Historica e Economica da villa e termo de Torres-Vedras, - parte económica, 2ª edição anotada,  (1865?) , manuscrito inédito no Arquivo Municipal de Torres Vedras.

-              VIANA, A. E ZBYSZEWSKI, G., Gruta da Maceira (Vimeiro), Porto 1949, Instituto para a Alta Cultura-Centro de Estudos de Etnologia Peninsular, Porto, separata do fascículo 1-2, vol XII de Trabalhos de Antropologia e Etnologia;

-              VIEIRA, Julio, Torres Vedras Antiga e Moderna, Sociedade Progresso Industrial, T. Vedras, 1926.

(não incluímos a vasta bibliografia sobre o Castro do Zambujal, já referida noutro artigo)

 

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