segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A Origem dos Gigantones

Transcrevo aqui um artigo que descobri, publicado em 2005 no Diário de Notícias, sobre a origem da utilização dos gigantones nas festas populares, e que são uma das imagens de marca do Carnaval de Torres.
Com este artigo, acompanhado por fotografias da minha autoria, dou início à publicação de alguns documentos com interesse para a história do nosso Carnaval.


TRADIÇÃO QUE VEIO PARA FICAR
por
Paulo Julião, Diário de Notícias 03 Julho 2005

"Com quatro metros de altura, um peso que varia entre os vinte e os trinta quilos e uma enorme cabeça de pasta de papel, os gigantones não passam de figuras humanas de grandes dimensões suportadas por uma estrutura com a forma de um corpo e onde o homem que o manuseia se introduz, carregando o boneco apoiado nos seus ombros. Os movimentos, claro está, são dificultados por causa do peso e equilíbrio, mas procuram andar (ou balancear) ao som do ritmo, sempre de forma solene.

À volta destes apresenta-se o conjunto oposto qual grupo de "bobos da corte", os cabeçudos são personificados por rapazes vestidos de forma desleixada que, num bailado quase tresloucado onde sobressai a enorme cabeça usada como máscara, fazem a animação popular. Representam uma pequena corte, ou mais simplesmente um rancho de filhos, que dançam, rodopiam e provocam, contagiando todos com o seu ritmo e alegria. Dado o seu carácter folião, os cabeçudos, segundo a tradição, assumem por vezes formas não humanas de diabos ou monstros de língua de fora.

A introdução dos gigantones e cabeçudos nas festas e romarias portuguesas, directa ou indirectamente, foi feita através da região espanhola da Galiza, com a importação do costume, em 1893, para a Romaria d'Agonia, em Viana do Castelo. Como explicou ao DN o historiador Alberto Abreu, o gigantone português deriva da tradição galega em que era promovida uma exibição de gigantones e cabeçudos junto ao túmulo de Santiago. "Um vianense achou muita graça àquilo e resolveu trazê-la para as festas de Viana do Castelo, no século XIX, quando se estava a criar o figurino da romaria. Na altura foi mais um número, mas depois acabou por ficar como número".

Popularizada em Viana do Castelo, onde se assumiu no decorrer do século passado como símbolo da "rainha das romarias de Portugal", a tradição vingou, já que se "encaixou na memória colectiva" do povo que ainda recordava mitos antigos, desaparecidos no tempo. Também conhecidos como "gigantes de cor-tejo", o povo acabaria por importar da cultura galega não só o número em si mas o nome de gigantone.

A tradição é, contudo, bem mais antiga, e para Alberto Abreu tem a sua origem nos contos de bons e maus gigantes inspirados na mitologia germânica, mais tarde popularizados em histórias infantis. De facto, o primeiro gigante de cortejo conhecido na Europa foi identificado em Antuérpia, Bélgica, em 1389, havendo ainda importantes registos históricos na Idade Média, em França, Alemanha e Itália.

Aparecendo sempre indissociáveis das figuras gigantes, os cabeçudos representam também uma deformidade, neste caso na cabeça, e são inspirados, essencialmente, nos gnomos da floresta, "normalmente génios bons".

Sendo a Romaria d'Agonia - que se realiza a 20 de Agosto - o expoente máximo da aparição em Portugal dos gigantones e cabeçudos, os primeiros bonecos gigantes, seis em 1893, retratavam nomeadamente "o parolo", "o doutor", "a vianeza" e "a senhora". Apesar da complexidade da estrutura, a sua confecção chegava a pormenores como ramos de flores ou carteiras na mão, no caso feminino, ou fartos bigodes, suíças e chapéu alto, nos bonecos masculinos. Já os cabeçudos eram, na altura, 25, com figuras inspiradas em diabos e macacos.

A completar qualquer desfile não pode faltar o grupo de zabumbas ou zés-pereiras, que fazem o acompanhamento musical, anunciando e marcando de forma estridente o ritmo da festa. Alguns compostos por dezenas de elementos, cada um com um bombo à sua dimensão, os zés-pereiras são também acompanhados de gaitas-de-foles. À frente do grupo segue o chamado "regente" com o tradicional pau comprido, conhecido por moquinha, enfeitado na extremidade com uma cabeça esculpida e fitas, que marca e incita os restantes tocadores.

Este conjunto está já bem enraizado na cultura popular portuguesa, podendo ser apreciado em grande parte das grandes romarias espalhadas pelo Norte do País, como forma de assinalar o início das festividades tradicionais".






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