segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Há 40 anos - Torres Vedras e as eleiçõe "marcelistas" de 26 de Outubro de 1969



(fonte: Badaladas, 25 de Outubro de 1969)


Pouco mais de um ano depois de tomar posse como primeiro-ministro, ou, como se dizia então, como “Presidente do Conselho”, na sequência do agravamento da saúde de Salazar, Marcelo Caetano convocava eleições para a “Assembleia Nacional”.


Estas decorreram no dia 26 d Outubro de 1969. Vivia-se então em pleno clima de esperança de mudança no regime, a chama “Primavera Marcelista”. Contudo, até então as mudanças pouco mais eram que uma mudança de retórica ou de fachada.

A importância dessas eleições residiu principalmente numa tentativa d legitimação do “marcelismo” face à desconfiança dos “ultras” do regime. Uma das novidades foi a inclusão de um grupo de candidatos independentes nas listas da União Nacional, como Sá Carneiro, Pinto Balsemão, Miller Guerra, Pinto Leite, Magalhães Mota e Mota Amaral, entre outros, aquilo que se veio a tornar a chamada “ala liberal”.

Par Vasco Rato, “este acto eleitoral foi, seguramente, o mais livre realizado ao longo da história do Estado Novo. Assistiu-se à extensão limitada do sufrágio, inclusive às mulheres alfabetizadas, mas não se estava perante eleições verdadeiramente competitivas, genuinamente expressivas da vontade dos cidadãos. Apenas 10% da população constava dos cadernos eleitorais”, e destes, quase 40% não compareceram ao acto eleitoral. Além disso, “vedando o acesso à televisão, dificultando a consulta dos cadernos eleitorais, e tomando outras medidas que efectivamente não eram propícias ao estabelecimento de condições de igualdade, o regime não proporcionou à oposição uma possibilidade real d conquistar o poder” (RATO, Vasco, “marcelismo” in Dicionário de História de Portugal, vol. 8, ed. Figueirinhas, 1999, pp.421 a 427). Além disso, o sistema eleitoral não era proporcional, o vencedor do círculo eleitoral ficava com toda a representação.

A própria oposição, ao surgir dividida, facilitou a tarefa ao regime. De facto, para além do partido do regime, a oposição apareceu dividida em três dos distritos mais importantes, Lisboa, Porto e Braga.

No círculo eleitoral de Lisboa, onde se incluía o concelho de Torres Vedras, concorreram, patra além da União Nacional (UN), a Comissão Eleitoral de Unidade Democrática (CEUD), conotada com a ala moderada da oposição (republicanos, socialistas e outros), a Comissão Democrática Eleitoral (CDE), conotada com a oposição comunista e parte da socialista e ainda a Comissão Eleitoral Monárquica (CEM), que representava a facção democrática dos monárquicos.

A nível nacional, a União Nacional obteve cerca de 86% dos votos (menos de 1 milhão de votos) e a oposição, no seu conjunto, não conseguiu obter mais de 12% dos votos (pouco mais de cem mil votos)(Fonte: “Badaladas”, 1 de Novembro de 1969).

Dos partidos da oposição, aquele que obteve mais votos foi o CDE, que concorreu em 19 distritos, obtendo quase todos os cem mil votos do conjunto da oposição. A CEUD, concorrendo apenas em três distritos, obteve cerca de vinte mil votos, e os monárquicos, que concorreram apenas no distrito de Lisboa, obtiveram pouco mais de mil votos.

A principal consequência destas eleições foi o reforço da legitimidade junto do regime de Marcelo Caetano, que a aproveitou para remodelar profundamente o governo em Janeiro do ano seguinte, apostando num conjunto de jovens tecnocratas , defensores da modernização da economia.

Contudo, em breve, muitas das esperanças depositadas no “marcelismo” acabariam por se revelar um logro.

Em Torres Vedras, reflexo da “abertura” marcelista foi a criação do Pelouro Cultural da Física, nesse anos de 1969, onde pontificavam figuras da oposição local, como Andrade Santos, António Augusto Sales, Ruy de Moura Guedes e Venerando Ferreira de Matos, entre outros, responsáveis pela edição, no jornal “Badaladas” do “Oeste-Cultural”, e pela organização de exposições e debates sobre vários temas.

Durante a campanha eleitoral realizaram-se comícios da CDE e da UN.

A sessão de “propaganda eleitoral” promovida pela CDE teve lugar no dia 18 de Outubro, um Sábado no Teatro-Cine Ferreira da Silva, que foi “demasiado pequeno para acolher as centenas de pessoas interessadas m assistir”.

O público, “enchia literalmente a sala, decorada com o cartaz da C.D.E. e dísticos”, e “aplaudiu frequentemente e com grande entusiasmo os candidatos oposicionistas que proferiram as suas alocuções num elevado ambiente de fervor patriótico e de civismo”.

A mesa, “que tinha por fundo a bandeira nacional”, era presidida pela Drª Maria Lucília Miranda Santos, ladeada pelos candidatos pelo círculo “Dr. Francisco Pereira de Moura e Engº Gomes da Silva”. Outros convidados , homens da oposição local e membros da comissão de apoio, ocupavam o palco: António Leal da Ascensão, Joaquim Augusto de Oliveira, João de Oliveira, Miguel Simões, Helder dos Santos Chá e Leonel Pereira Ferreira.

Foram oradores os dois candidatos, realizando-se apenas um pequeno intervalo, durante o qual “Fernando Teles leu a Declaração Universal dos Direitos do Homem”. A situação económico-social e a necessidade de uma reforma agrária foram os principais temas das intervenções. (in “Badaladas” de 25 de Outubro de 1969.

No dia 22 foi a vez da UN “promover uma sessão de propaganda eleitoral para apresentação dos seus candidatos ao círculo”.

Anunciava-se que usariam da palavra a Srª “D. Raquel Ribeiro” o”Dr. Ulisses Cortez”, o “Dr. Ricardo Horta” e “dois oradores locais”, assistindo ao mesmo comício o candidato Franco Nogueira. (in “Badaladas”, 18 de Outubro de 1969).

A comissão concelhia da UN tinha sido empossada em Maio desse ano, era presidida por Fernando Barros Leal, sendo vice-presidente o Engº Agrónomo Raul dos Santos, e tendo por vogais António Maria de Almeida Fernandes Vilela, António Maria de Sousa e António Gabriel Gomes. (in “Badaladas”, 31 de Maio de 1969).

Como se pode ver no quadro seguinte, com os resultados eleitorais registados neste concelho de Torres Vedras, publicado pelo jornal “Badaladas” de 1 de Novembro de 1969, é de salientar a abstenção que atingiu quase os 50%. Houve muitas freguesias onde essa abstenção ultrapassou bastante os 50%: em A-dos-Cunhados; em Campelos; na Carvoeira; no Ramalhal; em Stª Maria e S. Miguel; em S. Pedro e Santiago; no Turcifal.

Apesar de todos os condicionalismos, a oposição, principalmente a CDE, obteve bons resultados na principal freguesia urbana de Torres Vedras, S. Pedro e Santiago, chegando quas aos 30% dos votos expressos, obtendo ainda um resultado muito significativo em Monte Redondo e em Runa.



(Fonte: Badaladas, 1 de Novembro de 1969)

(clicar no quadro para ampliar)

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