Foi no ano distante de l885 que surgiu o primeiro jornal torriense.
Intitulando-se «Jornal de Torres Vedras», iniciava a sua publicação numa quinta-feira, 1 de Janeiro de 1885.
Subintitulando-se como «Agrícola, Commercial, Noticioso», o jornal, fundado por Agostinho Barbosa Sottomayor, Inácio França e Manuel de Paula Guimarães, e impresso na recém fundada, no ano anterior, tipografia de Celestino Aspra, tinha por objectivos «esforçar-se por tornar conhecidos os nossos vinhos(...). A nossa missão, todavia, estende-se mais além. A vila carece de urgentes melhoramentos que a coloquem a par das terras mais civilizadas. Havemos de, pouco a pouco, com insistência, com independência, com dignidade, sem offensa para ninguém, e com proveito para todos, lembrar esses melhoramentos, indicar a senda do progresso e do aperfeiçoamento, indispensável no último quartel do século XIX (…). Em breve tempo se fará ouvir o silvo da locomotiva, que há-de servir prodigiosa¬mente aos interesses commerciaes da villa, como temos fé. O nosso jornal advogará calorosamente todos os interesses hones¬tos, toda a iniciativa pro¬veitosa, industrial ou commercial (…).”
Esta primeira experiên¬cia jornalística durou 2 anos, 2 anos cruciais para o desenvolvimento de Torres Vedras, pois foi nesse período que se ulti¬maram as obras de cons¬trução da linha férrea, que ligaria Torres Vedras a Lisboa, modificando em definitivo e profunda¬mente o rosto da então vila.
Embora o grande des¬taque das páginas desse jornal recaísse em anún¬cios relacionados com a agricultura, principal¬mente a vitivinicultura, lutando então desespera¬damente contra a filoxe¬ra, nelas podemos seguir o episódio semanal da construção desse revolucionário transporte do séc. XIX, que foi o caminho-de-ferro.
Paradoxalmente, o «jornal de Torres Ve¬dras» terminou a sua publi¬cação no próprio dia em que era inaugurada a liga¬ção ferroviária entre Tor¬res e Lisboa, a 30 de De¬zembro de 1886, e por isso ficámos privados da reportagem histórica desse acontecimento.
Tinha-se contudo ini¬ciado a heróica história da Imprensa torriense. De periodicidade e duração variada, com tecnologia mais ou menos apropriada, terão sido publicados desde então em Torres Vedras mais de 60 títulos. O Dr. António da Silva Rosa, no seu trabalho pioneiro editado no n.° 1220, de 25-05-1979, do jornal «Badaladas», localizou 48 títulos editados até essa data, aos quais podemos acrescentar mais 15 títulos por nós registados, sem contar com um sem número de jornais escolares, copiografados, quase anualmente publicados nas salas das escolas secundárias locais.
Não durou muito a interrupção provocada pelo desaparecimento daquele primeiro título. Logo em Fevereiro de 1887 surgiam dois novos semanários, «A Voz de Torres Vedras», que se intitulava herdeiro daquela primeira publicação, e «A Semana», registando-se então o inicio de a uma tradição que se manteve quase ininterruptamente até 1926: a publicação simultânea de, pelo menos, dois títulos semanais em Torres Vedras.
Ainda do século XIX datam dois dos mais importantes títulos da Imprensa local: «A Vinha de Torres Vedras” e a “Folha de Torres Vedras”.
Alguns dos títulos de maior duração foram fundados no século XIX, só sendo ultrapassados pelo jornal “Badaladas” e pelo “Frente Oeste”.
Aqueles dois títulos documentam nas suas páginas a transição da monarquia para a República e do séc. XIX para o séc. XX, relatando, nas suas páginas, não só os reflexos, a nível local, da agitada vida política local, mas também as primeiras notícias da introdução do cinema ou da luz eléctrica em Torres Vedras.
Refira-se ainda a particularidade importante de o jornal «Folha de Torres Vedras» se declarar abertamente defensor de ideias republicanas, muito antes da implantação desse regime político. Este jornal viria a fundir-se em 1913 com o seu velho rival «A Vinha de Torres Vedras» e, até ao aparecimento do jornal «Badaladas» em 1948, mais nenhum jornal conseguiria publicar-se regularmente por mais de 6 anos consecutivos, como aconteceu com “A Vinha…”.
Com a República, e principalmente no pós primeira-guerra-mundial, surgem alguns títulos de vincada ideologia politica, ligados a várias tendências que marcaram a conturbada vida política de então. Talvez por isso, muitos desses jornais tiveram duração efémera.
Três desses títulos merecem, contudo, serem aqui recordados, pelo interesse demonstrado na defesa das questões regionais. São eles o «Eco de Torres», que se publicou de 1917 a 1921, «O Torreense», publicado entre 1919 e 1925, e “A Nossa Terra», entre 1924 e 1926.
A partir de 1926 a imprensa local sofre uma acentuada decadência. Durante quase um ano, entre Setembro de 1926 e Agosto de 1927, não se publica um único título em Torres Vedras. É então que surge uma das mais importantes apostas jornalísticas da época, o “Gazeta de Torres”, inicialmente dirigido pelo dr. Justino Freire de Moura Guedes, substituído no cargo, em finais de 1930, por António Batalha Reis e, pouco tempo depois, por Edmundo de Oliveira.
Nesse jornal destacaram-se como jornalistas, Luís Brandão de Melo e Victor Cesário da Fonseca, que dariam ao jornal um cunho progressista, em contra corrente com o regime ditatorial que se afirmava. Não só se tornou no jornal de maior duração entre os que até essa data tinham sido fundados no século XX, como se tornou o ponto de confluência de uma nova geração de jornalistas locais, dinâmica e inovadora. Contudo, as suas posições políticas, contra a ditadura e apoiando a Aliança Republicana-Socialista, que pretendia fazer o contraponto à recém criada União Nacional, provocaram o seu prematuro encerramento, publicando-se pela última vez em 13 de Agosto de 1933.
A partir dessa data quase toda a imprensa teve duração efémera, e na maior parte dos casos mais não era de que a câmara de eco dos ideais do Estado Novo, nalguns casos de tendência assumidamente fas¬cista.
A crise da imprensa torriense agravou-se a par¬tir de 1936 quando o jor¬nal que então se publica¬va, o segundo com o títu¬lo de «O Torreense», passou a editar apenas um nú¬mero anual, não se publi¬cando mesmo qualquer exemplar nos anos de 1943 e 1944, situação que se altera em 1946, quando esse jornal regressa à sua publicação semanal, que irá durar até 1954.
Contudo, só com o apa¬recimento do jornal “Badaladas” , fundado em Maio de 1948, pelo saudo¬so Padre Joaquim Maria de Sousa, se regista uma mudança significativa no panorama jornalístico de Torres Vedras. O Padre Joaquim Maria de Sousa teve o mérito de conseguir transformar um jornal paroquial no pri¬meiro título moderno deste concelho, revelando nas suas páginas uma visão aberta às novas realidades locais e culturais. Apesar das limitações impostas pela censura da ditadura à liberdade de imprensa, o “Badaladas” soube tornear essas dificuldades, com uma grande dose de independência e dignidade nesses tempos difíceis.
Até 1952 o “Badaladas” editava-se mensalmente. A partir desse ano passou a quinzenário e, finalmente, em 15 de Dezembro de 1960, tonou-se semanário, continuando a publicar-se nos nossos dias, sendo um dos títulos mais antigos da imprensa portuguesa.
Ao longo da sua história o «Badaladas» soube-se adaptar às mais variadas realidades politicas, sociais, culturais e tecnológicas, tornando-se num dos raros casos de longevidade da imprensa regional. Pelas suas páginas têm passado todas as gerações de jornalistas torrienses desde a segunda metade do Século XX. Mesmo algumas personalidades nacionais não têm desdenhado a sua colaboração nas páginas desse semanário
Com a recuperação da Liberdade e da democracia, após o 25 de Abril de 1974, tornou-se possível o aparecimento de mais projectos inovadores. Assim, aconteceu com o «Oeste Democrático», um dos títulos de maior regularidade depois de 1933, a seguir ao «Badaladas», e que se publicou entre 1975 e 1978. Revelou-se inovador não só nas temáticas abordadas, mas também na forma como as apresentava, numa paginação dinâmica, nomeadamente no tratamento dado aos títulos de primeira página. Encerrado devido a dificuldades económicas, parte dos seus colaboradores e redactores passou-se de armas e bagagens para o jornal «Badaladas», contribuindo para a renovação deste título, então já sob direcção do Padre José Manuel Silva.
Também, pelo espírito dinâmico que imprimiu aos seus conteúdos, merece referência o jornal “Área”, de curta vida, um mensário que se publicou regularmente entre 1979 e 1981, e, desde então, esporádica e anualmente, como órgão pertencente à Cooperativa de Comunicação e Cultura, que nasceu exactamente da existência daquele título e é hoje uma das mais dinâmicas e inovadoras propostas culturais de Torres Vedras.
O “Área” afirmou-se como o mais irreverente e inovador de todos os títulos desde sempre publicados em Torres Vedras. Na suas páginas criou-se uma nova geração de jornalistas e de agentes culturais que inovaram o panorama cultural torriense.
O carácter inovador do “Oeste Democrático” e do “Área”, bem como o entusiasmo imprimido, na área da comunicação social local, pelo movimento das rádios locais no final dos anos 80, princípio dos anos 90, influenciaram a novidade que representou, quanto à forma de tratar a informação, a revista mensal “Zona Oeste”, que se editou na década de 90, e o jornal “Frente Oeste”. Este último, encerrado recentemente, tornou-se um dos títulos de maior longevidade no panorama da imprensa torriense.
O conhecimento dos últimos cem anos da sociedade torriense, não pode escamotear o estudo e o conhecimento dos conteúdos de milhares de páginas amarelecidas pelo tempo que guardam milhões de palavras escritas por centenas de homens, muitos deles anónimos, que deram o melhor de si para informar e registar os pequenos e grandes acontecimentos ligados à vida dos habitantes de Torres Vedras.
A eles dedicamos esta breve evocação histórica do jornalismo torriense.
(este texto resulta da adaptação, com algumas correcções e actualizações, de um trabalho por mim publicado nas páginas do jornal “Frente Oeste” em 16 de Abril de 1992, intitulado “A Imprensa Torreense ao longo dos tempos”).
Sem comentários:
Enviar um comentário